Alimentação agroflorestal: agricultor de Taquara produz queijos veganos com insumos orgânicos
No Vale do Paranhana, Rodrigo Felipe de Oliveira aplica técnicas de cultivo características do Cerrado para extrair as matérias-primas de sua produção
Em uma propriedade localizada no interior do município de Taquara, no Vale do Paranhana, vive o produtor rural Rodrigo Felipe de Oliveira. Há cerca de três anos, Rodrigo iniciou a produção de queijos veganos para comercialização utilizando produtos extraídos diretamente da plantação no sítio onde mora. Com um processo de fabricação parecido com os convencionais, os queijos passam por uma etapa de fermentação e, depois, por um longo período de cura em temperatura controlada.
Entretanto, não é apenas a produção dos queijos voltada para o público vegano que faz sucesso nas feiras das quais Rodrigo participa e comercializa os produtos. As matérias-primas que utiliza, na grande maioria, são cultivadas na sua propriedade a partir do Sistema Agroflorestal — um método totalmente orgânico do uso da terra que combina o cultivo de elementos perenes com plantas agrícolas e/ou criação de animais, sempre levando em conta a biodiversidade local.
A produção no sítio em Taquara segue uma linha de agricultura regenerativa. Rodrigo afirma que nunca utilizou esterco, calcário, pó de rocha, adubo ou qualquer outro elemento que possa danificar o solo. Ele faz uso apenas de lixo orgânico, cinzas de fogueiras, restos de madeiras e fermentações que ele mesmo produz.
“Alguns elementos que uso em minha produção vêm de parcerias que tenho com outros produtores orgânicos. Um exemplo é a castanha de caju, um dos principais ingredientes para a receita dos queijos. Como é uma especiaria cultivada em grande parte no nordeste do Brasil, eu disponho de fornecedores que também prezam pela produção orgânica. No mais, tudo o que utilizo nas receitas extraio daqui”, comenta o produtor.
Por acreditar no poder do renascimento das plantas e da recuperação do solo, Rodrigo ressalta a importância do uso racional da terra. Segundo ele, a economia avança no sentido da destruição da floresta e, para mudar essa lógica, há a demanda por um novo aprendizado de fluxo financeiro para o uso da terra e seus recursos. “Sem viabilidade, não haverá a possibilidade de reversão nos processos de colonização”, argumenta.
Perda e reinvenção
No período do verão, entre o final de 2019 e início de 2020, Rodrigo lembra de um momento crucial para o seu trabalho como produtor rural. À época, uma seca devastadora que atingiu a região fez com que ele perdesse mais de 2 mil mudas de mandioquinha que havia plantado no inverno anterior. Um trabalho no qual tinha apostado todas as fichas acabou sendo desperdiçado devido ao clima.
“Vendo a situação, comecei a estudar os sistemas agroflorestais utilizados no Cerrado brasileiro, onde as chuvas acontecem de forma frequente apenas em um período do ano. Esse estudo me fez entender algo muito precioso: eu precisava replicar essa estratégia aqui, em ambientes onde se planeja recuperar a terra, principalmente onde antes tinha gado e agora há degradação por compactação”, explica.
O produtor de queijos veganos entendeu que, para a mecânica agroflorestal funcionar, é necessário um adensamento das bananeiras e eucaliptos, ou seja, aumentar em duas vezes a concentração dessas espécies. Então, a lógica é a constância no volume de poda e a grossa cobertura de solo para a retenção da umidade.
A partir do inverno de 2020, as mudanças começaram a surtir efeito e ele passou a dar menos ênfase na plantação para focar na culinária. Juntou os conhecimentos e se reinventou aos poucos. Foi remodelando a agrofloresta e concentrando o foco na produção de queijos, além do cultivo de mandioca, plantas medicinais e temperos — que segue até hoje.
O poder da terra
Por ter uma vida rodeada de natureza, Rodrigo conhece os benefícios que os recursos gerados ali oferecem para contribuir com o meio ambiente. Ele explica que o solo que concentra o gado, por exemplo, sofre uma degradação bem específica com o tempo.
Nesses lugares, existe a perda constante de nutrientes e a compactação devido ao peso dos animais. O produtor observa que, em um potreiro, nada consegue crescer, pois a recuperação natural leva muito tempo e vai depender do nível de degradação do ambiente.
“Um problema crucial desse tipo de degradação é o estresse hídrico. Devido à compactação, a terra não consegue absorver corretamente a água. As plantas não conseguem fluir suas raízes e nem ramificar. Acaba faltando água”, explica.
Para esse tipo de degradação, segundo Rodrigo, muito se fala na importância das plantas que ajudam a quebrar a terra e descompactá-la. Um exemplo é a bananeira, que pode ser crucial como estratégia para amenizar o estresse hídrico e fazer o processo acontecer melhor e mais rápido nesse ambiente.
Produção de queijos gerou mudanças no plantio
O @colonovegano, como é conhecido nas redes sociais, comenta que até seis meses atrás a plantação estava concentrada em sua propriedade. Devido à demanda pela produção dos queijos, ele precisou buscar outro local para aumentar o cultivo agroflorestal.
Hoje, ele passa por um período de adaptação em outra localidade de Taquara e, a fim de cobrir o período de transição, expandiu as parcerias com fornecedores orgânicos. “Neste momento estou totalmente focado na produção dos queijos veganos devido às muitas encomendas que recebo e não tenho dado muita atenção ao plantio. Colho o que já havia plantado antes, como bananas e outras frutíferas”, revela.
Certificação para cultivo em Sistemas Agroflorestais
No Rio Grande do Sul, a Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura realiza um procedimento de certificação para legalizar a manutenção e o uso de espécies nativas em sistemas agroflorestais. De acordo com informações repassadas pela Assessoria de Comunicação da pasta, a lei requer que proprietários de áreas agrícolas ou urbanas tenham autorização do órgão para realizar atividades em solo onde há vegetação nativa. Mais de 30 categorias de licenças que podem ser emitidas de forma independente.
A Secretaria informa também que, para sistemas agroflorestais em específico, a regulamentação ambiental em áreas modificadas pelo homem ou com vegetação nativa secundária, pode reunir até 14 modalidades diferentes de licenciamentos florestais em um único processo administrativo.
O Rio Grande do Sul tem como meta, até 2030, estimular a adoção de sistemas, práticas, produtos e processos de produção sustentáveis. Uma delas é a ampliação em até 5 mil hectares de terras para sistemas agroflorestais. Atualmente, o estado conta com mais de 1 mil hectares certificados em sistema agroflotestal (SAF).