Aprendizado em harmonia com a natureza

Métodos pedagógicos alternativos buscam relacionar sala de aula e sustentabilidade

Mainara Torcheto
Redação Beta
7 min readOct 11, 2017

--

A educação ambiental tem um papel fundamental no crescimento e desenvolvimento de percepção das crianças. Introduzir o assunto em sala de aula requer muita participação e troca entre professores. É através desse caminho que o aluno adquire as coordenadas para se tornar um cidadão responsável e consciente sobre a importância da preservação ambiental, por exemplo. Um assunto pouco debatido, mas de muita importância, é a forma como essas ideologias são repassadas para os pequenos. É necessário buscar métodos pedagógicos alternativos ou o ensino tradicional já está dando conta do recado?

Segundo o MEC, desde 2004 há pesquisas e levantamentos a fim de entender melhor a presença da educação ambiental nas escolas de ensino fundamental. 32% das escolas declararam que a iniciativa de desenvolver determinados projetos partiu da própria comunidade. É possível perceber que o envolvimento da sociedade na construção dos planos educacionais traz um cunho alternativo, do âmbito da pedagogia. Dessa forma, além dos métodos tradicionais de ensinos pedagógicos, é possível citar duas metodologias alternativas que proporcionam interligação entre aluno e educação ambiental:

Waldorf: “educar na natureza e pela arte”.

Montessori: “educar crianças com alegria”.

Repletos de práticas próprias no âmbito educacional, os dois métodos pedagógicos consistem em desenvolver a capacidade das crianças de forma livre e adaptada ao seu nível de conhecimento. “Ou seja, não será o adulto a dirigir a atividade da criança, e sim a criança quem adapta o seu entorno ao seu nível de desenvolvimento e a seus interesses de aprendizagem”, explica o site A Mente é Maravilhosa, tratando sobre o método Montessori.

Uma escola para compartilhar

(Foto: Divulgação/Escola Ayni)

Um método pedagógico alternativo voltado à natureza encontra-se em Guaporé, no Rio Grande do Sul, e foi idealizado pelo Thiago Berto — na época, um jovem de 30 anos que acreditava já ter feito de tudo. Percebendo que a caminhada estava só começando, ele largou a própria empresa de segurança da informação quando chegou no ponto de sua vida pelo qual acredita que todo jovem um dia vai passar. A pergunta que se fez foi: “O que eu estou fazendo no mundo?”.

Ele acredita ter recebido um chamado. “Meu Deus, eu tenho mais 50 anos de vida e ela não pode mais se resumir a acordar cedo pra ganhar dinheiro”, refletiu. Então foi garimpar uma nova visão de mundo por vários países durante um mochilão que durou três anos. De Cusco, no Peru, ele trouxe a faísca para criar a escola Ayni (em Quíchua, significa compartilhar).

(Foto: Divulgação/Escola Ayni)

Um dos pilares mais fortes da criação da Cidade Escola Ayni foi a educação, com uma proposta totalmente diferente das que estamos habituados. Uma escola firmada a partir da bioconstrução, em um bosque, com uma estrutura nada tradicional. A diferença está desde as salas de aula, que não são construídas com tijolos, até a substituição de professores por tutores. A escola atende a todas as leis preestabelecidas pelo MEC, mas não realiza testes avaliativos nas crianças. O dever delas é preservar sua essência a partir da conexão com a natureza, refletir sobre o sentido do compartilhamento de ideias, espaços e aprendizados, e brincar. Brincar muito!

A terra como sala de aula

A Ayni foi e está sendo construída por voluntários e simpatizantes da causa. É um movimento de inspiração para a sociedade. É um projeto que tem um pouco de pressa positiva para poder mostrar que a sociedade vai bem na evolução da vida, do ser (de fato) humano. Que é preciso viver um pouco diferente agora para chegar, daqui a 200 anos, em uma educação diferente, que aprenda com a natureza e seus ensinamentos. Uma sociedade mais harmoniosa que tenha uma educação diferente sobre a economia, por exemplo.

A experiência é enxergar a criança como uma grande parceira de aprendizado na evolução da educação. Como mestres, e não como seres que necessitam que alguém os transborde de conhecimento — o que para Thiago é muito relativo. “As crianças que vão se tornar adultos já têm a essência da cooperação, do entendimento da natureza como um todo”, aponta. E o que a Ayni faz é não atrapalhar, não “desensinar” essa essência que as crianças trazem se mostrando líderes, éticas e amáveis.

(Foto: Divulgação/Escola Ayni)

A viagem de moto do Alasca ao Uruguai

“Nós, como seres humanos, nos desconectamos muito da nossa essência. A gente é um personagem moldado muito pelos padrões que nos vendem, de como e o que tem que ser.” Thiago bem explica que esse afastamento do nosso eu interior gera inúmeros defeitos. Inclusive, tendemos a passar pela vida sem saber o que é paz de verdade, o que é ser feliz. Há quem já se deu conta de que precisamos ser quem a gente realmente quer ser, e agir com essas motivações.

O ponto, segundo ele, é que a gente tem mania de achar que sabe o que é bom para a criança. “Exigência em cima de exigência: tem que trabalhar, tem que seguir determinadas profissões pra ganhar mais. Às vezes é um ato de amor, mas o que a gente propõe é que a transformação seja do adulto”. Thiago afirma que chegamos num momento em que é preciso parar de olhar pra fora, de reclamar e sempre colocar a culpa em alguém, e olhar pra dentro.

Mas a gente sabe o quão escuro é esse processo. Por isso, o que a escola Ayni propõe não é apenas um novo modelo de educação, mas o movimento de olhar para dentro de si e ver um novo ser. Esse novo ser honra uma criança e vê nela uma sementinha cheia de potencialidades. O método não conduz, não induz, mas deixa a criança ser seu mestre e seguir o caminho que lhe convém. Thiago viajou de moto do Alasca ao Uruguai e foi colhendo as sementes de diversas escolas alternativas que conheceu pelo caminho.

Thiago Berto, de azul, durante a sua viagem. (Foto: Arquivo pessoal/Thiago Berto)

Inspiração no ensino

Elis Julia Floss, diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Ana Beatriz Lemos, localizada em Montenegro (RS), levou os ensinamentos recebidos em sua passagem pela Escola Ayni para dentro das salas de aula dos alunos de quatro a 14 anos. Ela pensa que a pedagogia passa por um momento de reencontro com o belo e o simples. “A Ayni me ensinou a olhar mais para isso de maneira amorosa, a repensar a minha prática voltando meu olhar para a pluralidade e a singularidade de tudo e de todos”, explica. Além disso, acredita que as crianças esperam por uma mudança e percebeu, em sua vivência como aluna da Ayni, que poderia mudar sua conduta como professora.

A foto ao lado foi retratada no último dia de aula do período letivo de 2016. “Penso que esta foto nos representa. O menino de amarelo é cadeirante, ele tem uma síndrome rara, mas, apesar disto, ele não deixa de participar de nenhuma atividade da escola. Inclusive, ele desceu no barranco!”, relata a diretora. Elis conta que decidiu abrir as portas de sua própria escola há um ano, logo depois que conheceu a metodologia e impressões da escola em Guaporé. “Os alunos de 3º, 4º, 5º ano e turmas de aceleração têm aulas por áreas de conhecimento”, explica.

Para finalizar, Thiago complementa: “Quem está longe dos nossos valores bonitos e genuínos como seres humanos somos nós, por consequência do meio que nos faz gerir esses valores de competição e violência. A proposta é que nós, como adultos, façamos uma faxina, uma reflexão sobre quem nós realmente somos”. A partir disso, ele acredita que propor uma nova educação se torna muito simples.

Para conhecer mais sobre a Cidade Escola Ayni — Educação e Sustentabilidade, acesse: http://www.fundacaoayni.org/

SOS peixinhos

É imprescindível falar sobre a postura do educador ao citarmos métodos pedagógicos alternativos voltados à natureza. Esses profissionais têm como objetivo atrair a visão e a atenção das crianças para a Mãe Terra e fazer com que cresçam cada dia mais como seres humanos.

A pedagoga Maria Inês Pacheco percebeu que poderia levar ensinamentos únicos às crianças, de forma voluntária. Há 13 anos, ela estava caminhando perto de sua casa quando notou que ali existia um “valo”, como era chamado pelos vizinhos. Inquieta, notou que o desvalorizado “valo” era um arroio. A partir disso, nascia uma ideia. Uma ideia que está gerando resultados positivos dentro das salas de aula. Com a ajuda e participação de outros professores, Maria Inês criou um material pedagógico alternativo para conscientizar as crianças da importância do arroio, localizado em Canoas. A partir disso, ela ensina brincando.

(Imagem do livro didático, desenvolvido pelo grupo SOS Peixinhos, que circula nas escolas como base final para o teatro)

Seu livro didático compila lições das oficinas lúdicas ministra. O contexto do teatro compreende uma conversa entre três personagens que dialogam rimando. Segundo a pedagoga, isso auxilia na fixação do conteúdo para os pequenos. Ela leva brinquedos que remetem ao cenário do rio, conta a história da nascente e fala sobre a importância da destinação correta do lixo. Tudo isso em tom de poesia. A oficina é desenvolvida em escolas de educação infantil e fundamental para séries iniciais, em associações de bairros, cooperativas de reciclagem e até mesmo na Feira do Livro, envolvendo crianças de várias idades.

Segundo informações do projeto, uma variedade de formas de vida presentes na natureza são exemplificadas, e, com contação de história, é provocado debate auxiliando na leitura sobre os diversos meios: “os animais expostos através de brinquedos fazem com que fique curiosa e divertida a explanação, a ponto de, muitas vezes, as crianças mergulharem no cenário”, explica a pedagoga.

Professora Maria Inês durante uma apresentação do teatro SOS Peixinhos. (Foto: Divulgação/Parceiros Voluntários Canoas)

--

--