Arte é uma Palavra Feminina: Poetisas de Porto Alegre

Sarau Nosotras e Lua em Mari demonstram como a poesia feminina se manifesta através da fala e das palavras expostas na rua

Tina Borba
Redação Beta

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Com Renata Simmi

Seja bem-vindx a segunda reportagem da série Arte é uma Palavra Feminina!

As mulheres não se calam. Elas podem ser descritas como objetos ou “fraquejadas”. Nos primeiros seis meses do ano a violência contra elas aumentou mais de 10% com relação ao mesmo período do ano passado. Mesmo assim, nada disso consegue parar mulheres que escolhem ignorar a estrutura social vigente e se unir, uma em favor da outra. Mulheres que se juntam para fazer arte, para ensinar arte, para expressar as suas visões perante o mundo, cantando, atuando, pintando, compondo. As mulheres sabem que são capazes, que são potentes e mais, que são imparáveis. Essa série vai ser espaço para que mulheres que protagonizam ações culturais em Porto Alegre tenham mais um local para falar e brilhar.

“Mulheres contando as suas histórias, no formato que for. Chega das pessoas contarem as nossas histórias e chega de uma de nós achar que pode contar a história de todas as outras”, é o pensamento da escritora e TEDx speaker Lau Pátron, após mais um Sarau Nosotras.

A Lau, a Tatiana Cruz — poeta e jornalista — e a Marlete Oliveira — terapeuta ocupacional — juntas abrem espaço para que as narrativas de muitas mulheres possam ser contadas, em voz alta, em forma de poesia. As duas primeiras se conheceram em um Sarau Elétrico — evento tradicional de Porto Alegre que ocorre há duas décadas no bar Ocidente — e ficaram amigas.

Elas são escritoras e por isso a ideia de um espaço seguro para que mulheres pudessem exercitar os seus versos surgiu tão rápido. “O Sarau Nosotras é sobre criar coragem de abrir voz e ler outras mulheres ou ler o que a gente mesma faz. O que a gente escreveu no quarto, sozinha, que não queríamos ler para ninguém, é um espaço para isso!”, explica Lau. A terceira integrante, Marlete, veio mais tarde. Ela participou como artista homenageada antes de ser convidada a fazer parte dessa construção.

Sala cheia na primeira edição de 2019 do Sarau Nosotras. (Fotos: Renata Simmi/Beta Redação)

O Nosotras é feito somente para mulheres. Os encontros acontecem na Nuwa, coworking e clube de conteúdo, em Porto Alegre. O espaço é exclusivamente para o público feminino, e exibe frases encorajadoras nas paredes, além de oferecer um local próprio para que mães trabalhem com seus filhos.

Na casa antiga do bairro Santana, que abriga o Nuwa, o sarau acontece em uma sala lotada de mulheres, diferentes umas das outras mas que têm em comum a poesia como abrigo e forma de desabafo. Recentemente, o Sarau recebeu o patrocínio da Editora Zouk.

Às 19 horas de uma quinta-feira da segunda semana de setembro, começava a edição “Vaca Profana: teu corpo, tuas regras?”. Além das três organizadoras, a roda principal era composta pela artista homenageada Mitti Mendonça, do projeto Mão Negra Resiste, e por outras três convidadas, Monique Machado, Julie Dorrico e Fernanda Vicari .

“Todo sarau tem um tema, a gente não parte do nada, não é só uma leitura de mulheres. É colocar nessa roda mulheres muito diferentes para debater o mesmo tema”, afirma Lau. Nessa edição, elas debateram sobre o que cada corpo feminino representa e enfrenta no dia a dia.

A Mitti e a Monique são mulheres negras, que em geral são discriminadas em inúmeros lugares. A Monique é ativista plusize, e também contou no sarau sobre os vários desafios que as mulheres gordas enfrentam. A Julie é descendente de índios e pesquisadora da cultura indígena e a Fernanda luta pelos direitos das mulheres com deficiência através do Coletivo Feminista Helen Keller.

Acima: ilustrações de Mitti Mendonça | Abaixo: Mulheres falando sobre preconceitos vividos e a aceitação de seus corpos. (Fotos: Renata Simmi/Beta Redação)

Todas as mulheres podem encontrar um lugar no Nosotras, não há intrusas. É uma roda aberta a acolher e educar aquelas que assim desejarem. “A gente queria ver as mulheres se sentindo acolhidas e convidadas, não importa quem elas fossem. No acolhimento dessa subjetividade, quem sabe ela sai transformada?”, pondera Tati.

“É sobre isso, é sobre sair com esse incomodo, porque não tem um ‘lugar comum’, ser mulher não é ser mulher. Existem muitas formas de ser mulher, existem muitas formas de estar vivo.” Lau Pátron

“Ninguém manda no que a rua diz”

Primeiro poema escrito por Mariana, em 2016. (Foto: Lua em Mari/Instagram)

A Mariana Adaime começou aos poucos, em 2016, a espalhar as suas frases instigantes pelas ruas e pelos bares da Cidade Baixa. O empurrãozinho inicial foi uma amiga artista quem deu, como ela mesma conta. “Ela me deu o canetão e disse ‘escreve vai, escreve aí’ ”. E foi assim, que com o tempo ela criou um Instagram, começou a fotografar as frases, a fazer lambe-lambe, a expor a sua arte. Devagarinho, Mariana se transformou na Lua em Mari.

Atualmente, Mariana mescla os poemas de rua com intervenções em fotografia. (Fotos: Lua em Mari/Instagram)

Quando começou, ela escrevia dentro dos banheiros, por ser mais seguro, e nem assinava. “O nome surgiu com uns amigos, questão de signo, alguém falou a Lua tá em Mari e ficou”, conta ela. Hoje em dia já é reconhecida e até chamada para escrever nos banheiros e paredes de alguns estabelecimentos.

Apesar de tocar o projeto de forma despretensiosa, devido ao emprego fixo na cozinha de um restaurante em Porto Alegre, ela não pretende parar e enxerga o que faz e o que tantas outras mulheres têm feito na cena cultural como essencial. “Acho que ainda tem muito espaço para ocuparmos, seja na arte de rua, na música, ou dentro de galeria. Mas acho que isso tá mudando, a mulherada tá se unindo e tá se movimentando para as coisas acontecerem. É bonito de ver!”, comemora ela.

Arte de Mariana pelas paredes de Porto Alegre. (Fotos: Lua em Mari/Instagram)

No início, a Mari tinha medo de não saber escrever direito e não confiava em si mesma. “Eu achava que tudo que eu fazia era ruim, não me sentia capaz”, relembra ela.

Quer saber quem é a Lua em Mari e o que ela acha da poesia de rua? Então confere o vídeo:

A poeta de rua Mariana Adaime fala sobre o surgimento da Lua em Mari e suas motivações na arte. (Captação e edição: Renata Simmi/Beta Redação)

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Tina Borba
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