Arte, empoderamento e protagonismo negro

Exposição “Black Power” defende a resistência e luta contra o racismo

Tainah Gil
Redação Beta
4 min readOct 26, 2019

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Fotografias buscam retratar negros como protagonistas de suas histórias. (Crédito: Tainah Gil/Beta Redação)

Desde o dia 1° de outubro, a Estação Rodoviária da Trensurb, em Porto Alegre, recebe a exposição “Black Power”, produzida pelo fotógrafo gaúcho Claudio Benevenga. Exposta na Galeria Xico Stockinger — espaço cultural inaugurado em abril deste ano e localizado no túnel de acesso à plataforma de embarque do trem — , a mostra trata, por meio da expressão artística, do empoderamento e o protagonismo do povo negro.

As fotografias retratam atores, bailarinos e imigrantes negros convidados por Benevenga. Os olhares dos modelos, carregados com dramaticidade, e a mistura de composições de cores sóbrias e fortes lembram muito os editoriais de moda — o que não surpreende, já que o autor das imagens acumula 30 anos de experiência nesse campo.

Em entrevista concedida por telefone à Beta Redação, Claudio Benevenga fala sobre sua experiência com a arte e a motivação para produzir a exposição “Black Power”.

Beta Redação: Como nasceu o seu amor pelas artes cênicas?

Claudio Benevenga: Eu acho que já nasci artista. Minhas memórias de muito novinho sāo de brincadeiras com lápis, desenhos, tintas… Nasci em Uruguaiana, e nāo existia teatro por lá. O pouco contato que tive com o teatro e com as artes cênicas na infância e adolescência foi no colégio. Mas, felizmente, apesar de estar na fronteira oeste, a cidade é apaixonada por Carnaval e, hoje, temos lá um dos mais fortes do país.

Entāo, o começo foi por aí, trabalhando nos barracões com figurinos, carros alegóricos, samba… Quando mudei para Porto Alegre, em 1984, aos 16 anos, assisti a peça “Bailei na Curva”,no antigo teatro do IPE. Foi paixāo imediata.

Beta Redação: Como a ideia da exposição “Black Power” surgiu?

Claudio Benevenga: Eu sempre tive muitos amigos negros, sempre convivi muito com eles, escutando suas histórias sobre racismo e preconceito. Em 2017, eu li uma pesquisa sobre o aumento de ataques racistas pela internet. Naquele momento, eu estava planejando retomar o meu trabalho com a fotografia, mas precisava ter um tema, queria algo que tivesse um sentido para acontecer. Afinal, hoje a arte tem um papel político e social fundamental. Entāo, as coisas foram se unindo e surgiu o projeto Black Power.

Beta Redação: Qual foi a sua inspiração para criar o conceito das fotos? Onde elas foram realizadas?

Claudio Benevenga: Meu tempo longe da fotografia foi dedicado ao teatro, à moda, ao cinema e à publicidade. Queria levar toda esta experiência para criar imagens fortes, impactantes, dramáticas… Criei para cada um dos 11 ensaios um tema, como se estivéssemos encenando, com estes negros como protagonistas absolutos. Como nāo tínhamos patrocínio, o processo de captaçāo foi lento. Durou 11 meses e aconteceu em diversos locais de Porto Alegre.

Ideia da exposição é transformar a realidade social e combater a ignorância do racismo. (Créditos: Tainah Gil/Beta Redação)

Beta Redação: Há alguma técnica que você utiliza? Algum padrão para as suas fotografias?

Claudio Benevenga: Gosto do híbrido, no qual tudo se mistura, se mescla. Tentei trazer um pouco de atuaçāo para a captaçāo dessas imagens, para irem além do estético. Aproveitei que muitos modelos que posaram eram atores, cantores ou bailarinos. Tecnicamente, nāo tem muito segredo, sempre procuro usar uma boa iluminaçāo, que é um dos principais pilares da fotografia.

Beta Redação: Quais os seus objetivos com relação à arte (já que você possui experiência com moda, teatro, cinema e publicidade)?

Claudio Benevenga: Eu e muitos colegas estamos tentando nos reerguer do retrocesso que sofremos nos últimos anos, com o fim de incentivo, editais, projetos, investimentos em cultura… Às vezes é bem desanimador, dá vontade de parar. Mas acho bem difícil que aconteça, porque quem provou deste “bichinho da arte”, sabe que é muito complicado viver longe dele.

Beta Redação: Quais questões a exposição “Black Power” apresenta ao público usuário do metrô?

Claudio Benevenga: “Black Power” teve sua estreia na Casa de Cultura Mario Quintana, mas acho que no metrô ela tem muito mais função, sendo vista por milhões de pessoas. Imagens potentes e silenciosas inseridas no cotidiano levam as pessoas à reflexão. Durante anos a grande mídia mostrou os negros como escravos, empregados, em postos de subserviência. Isso vem sendo mudado nos últimos tempos, mas ainda precisam acontecer muitas ações como “Black Power” para transformar a nossa realidade social e combater a ignorância do racismo.

Serviço

O que: exposição fotográfica Black Power, de Claudio Benevenga.

Quando: de 1.º de outubro de 2019 a 3 de janeiro de 2020, todos os dias, das 5h às 23h20.

Onde: Galeria Xico Stockinger, no túnel de acesso à plataforma da Estação Rodoviária da Trensurb.

Quanto: Gratuito para usuários do metrô.

Foto: Claudio Benevenga

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