Arte é uma Palavra Feminina: as imagens que elas criam

O coletivo Nítida Fotografia e Feminismo, o Benedictas Fotocoletivo Feminista e a vídeo-artista Kamyla Belli são exemplos de mulheres que usam a imagem como meio de expressão da sua subjetividade

Tina Borba
Redação Beta

--

Com Renata Simmi

Seja bem-vindx a terceira reportagem da série Arte é uma Palavra Feminina!

As mulheres não se calam. Elas podem ser descritas como objetos ou “fraquejadas”. Nos primeiros seis meses do ano a violência contra elas aumentou mais de 10% com relação ao mesmo período do ano passado. Mesmo assim, nada disso consegue parar mulheres que escolhem ignorar a estrutura social vigente e se unir, uma em favor da outra. Mulheres que se juntam para fazer arte, para ensinar arte, para expressar as suas visões perante o mundo, cantando, atuando, pintando, compondo. As mulheres sabem que são capazes, que são potentes e mais, que são imparáveis. Essa série vai ser espaço para que mulheres que protagonizam ações culturais em Porto Alegre tenham mais um local para falar e brilhar.

Em 2015, cinco mulheres se juntaram e criaram um coletivo para conversar sobre fotografia e falar de fotógrafas históricas que tiveram seus nomes invisibilizados. Assim começou o Nítida, um dos primeiros coletivos feministas de fotografia do nosso Estado, que atualmente possui nova formação, mas continua resistindo. “A gente viu que tinha público para isso, que tinham pessoas interessadas em debater. As mulheres realmente vieram atrás”, afirma Leli Baldisera, fotógrafa e pesquisadora, integrante do Nítida.

A primeira ação em conjunto das gurias foi uma crítica sobre o Festival San Jose, do México, um festival de fotografia com temática de gênero, somente com speakers homens. A crítica fez tanto sucesso que chegou até uma das organizadoras do evento e movimentou o “meio da foto”. Elas se juntaram porque sentiam falta de referências a nomes femininos nas faculdades que frequentavam, nos cursos que faziam e até mesmo nos festivais de fotografia que participavam.

As Nítidas. (Foto: Nítida Fotografia e Feminismo/Instagram)

No ano passado, as gurias da Nítida fizeram uma exposição na Casa Baka e atualizam um blog onde postam imagens de fotógrafas históricas e contemporâneas. Elas também fazem oficinas, cursos, falam em simpósios e, mais recentemente, em escolas públicas. Entretanto, perceberam mais tarde que não começaram tudo isso para serem reconhecidas ou ficarem populares, e sim porque mulheres unidas são potentes. “Eu me sinto muito mais forte quando trabalho com o coletivo. Sinto muito prazer em trabalhar com outras mulheres. Sinto que a gente pode ir muito mais longe quando tá trabalhando juntas”, argumenta Desirée Ferreira, fotógrafa e pesquisadora integrante do Nítida.

E tem muitos lugares ainda para elas chegarem. Principalmente na luta contra o machismo, que segue reservando para as mulheres lugares “menores” e pouco importantes. “É um meio (fotografia) que, como os outros, tá dominado por uma linguagem masculina. Então, o que a gente quer fazer é pegar o nosso lugar nesse espaço e fazer com que as mulheres enxerguem que elas também podem fazer, criar imagens e outros tipos de imagens. Tirar essa ideia da mulher tão sexualizada da fotografia”, diz Leli.

Desirée e Leli conversaram com a gente e contaram um pouco sobre o Nítida e o machismo na fotografia. Confere no vídeo:

O Nítida Fotografia e Feminismo começou em 2015 com o objetivo de ampliar os espaços de discussão sobre as mulheres na fotografia. (Captação e edição: Renata Simmi/Beta Redação)

Nós, mulheres, vivemos essa luta todos os dias. A luta por existir em uma sociedade que ainda acredita em certa medida que os nossos corpos são públicos. A Caroline Ferraz, fotógrafa e integrante do Benedictas Fotocoletivo está bem atenta a tudo isso. “A gente já percebia que a sociedade é machista, e isso se reflete num âmbito de mercado, nos espaços de fotografia, no nosso trabalho. Não só machismo, mas classicismo, racismo… Acho que o principal ponto pra mim, a grande contribuição do Benedictas, mais do que as nossas produções, é conseguir pensar sobre o nosso trabalho, sobre as coisas que a gente faz, sobre existir nesse tempo e espaço, esse processo reflexivo com outras mulheres e transformar em amizade”, aponta ela.

Da esquerda para direita: Foto de Giovana Fleck; Foto de Maia Rubim; Foto de Carol Ferraz; Foto de Francine Fischer (Fotos: Instagram Benedictas Fotocoletivo)

Segundo Carol, o Benedictas está vivendo um hiato. O coletivo não acabou, mas reunir as integrantes tem sido complicado. Ainda assim, elas permanecem amigas, mesmo distantes, e continuam produzindo a sua arte e fazendo por nós, mais do que somos capazes de agradecer. “Os caras, por muito tempo, tiveram o seu clubinho fechado. Hoje, a gente tá metendo o pé na porta e fazendo acontecer", conclama ela.

Na projeção, vídeo-arte Trípoda, de Kamyla Belli. A obra fez parte da Performance Fatos. (Kamyla Belli/Arquivo pessoal)

Arte e luta também é o que faz a vídeo-artista Kamyla Belli. “Sinto que tenho sempre que fazer mais esforço para provar meu talento ou meu trabalho. E, muitas vezes, perco oportunidades para homens que são amigos de outros homens dentro do campo profissional”, desabafa ela.

As fotos são eternas e reproduzem a realidade daquele momento específico. Por isso, são rígidas, duras. Kamyla busca quebrar esse paradigma em suas intervenções. Ela fala de uma imagem que ainda está em formação, sem um destino definido. “O que me motiva é a possibilidade de criar uma solução para o que eu sinto, transformar meu sentimento em uma situação palpável”, sustenta Kamyla.

Ela já expôs a sua arte de forma individual e coletiva. E está produzindo para a exposição que tem agendada este mês, em uma galeria de Coimbra, Portugal.

A temática das obras da vídeo-artista é essencialmente ligada ao existir dela nesse mundo. “Acho que eu falo sobre minha vivência como mulher lésbica/queer. Acho que é essa temática recorrente no que eu produzo. Mas também não sei se conta como um tema, porque não consigo fugir do que eu sou ao produzir arte, sabe?”, pontua ela.

Vídeo-instalação Exposição Obsoleta, de Kamyla Belli. (Fotos: Kamyla Belli/Arquivo pessoal)
Frames da vídeo-instalação Sangue de Mulher. (Kamyla Belli/Arquivo pessoal)

--

--

Tina Borba
Redação Beta

Brand&Content Creative na LEADedu | Apresentadora e Produtora de Vídeos na Zero Vídeo | Jornalista | Poetisa