Bibliotecas escolares são aliadas no processo de aprendizagem, garante especialista

Gislene Sapata Rodrigues, presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia da 10ª Região, relata os desafios e as mudanças comportamentais de alunos em relação ao hábito de leitura

Eduardo Vidal
Redação Beta
4 min readApr 12, 2023

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Nos últimos anos, principalmente em decorrência dos avanços tecnológicos, crianças e adolescentes ficaram mais expostos às telas de celulares e tablets, o que tem impactado o processo de aprendizagem. Nesse contexto, o estímulo à leitura e ao uso do acervo das bibliotecas escolares têm representado um desafio para educadores e bibliotecários.

A pesquisa Retratos da Leitura em Bibliotecas Escolares, realizada pelo Instituto Pró-Livro, em 2019, teve como um de seus objetivos demonstrar a importância desses espaços no processo educativo, quando garantidas as condições necessárias para que seja um ambiente de aprendizagem integrado ao currículo escolar. Os dados apontaram ainda que 61% das escolas públicas do Brasil, ou seja, mais de 88 mil delas, não possuíam bibliotecas ou salas destinadas para leitura.

A valorização e uso das bibliotecas escolares podem ser fatores importantíssimos no desenvolvimento e aprendizado dos alunos. (Imagem: Pixabay)

Para tratar deste cenário, a Beta Redação conversou com a presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia da 10ª Região e especialista em Teoria e Prática na Formação do Leitor, Gislene Sapata Rodrigues. A bibliotecária falou sobre as mudanças nos hábitos de leitura e como a existência desses espaços nas escolas agrega ao aprendizado de estudantes em fase escolar.

Gisele Sapata Rodrigues, presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia da 10ª Região, em Audiência Pública da Lei 12.244/2010. (Imagem: Bruno Spada/Câmara dos Deputados)

Confira a seguir a íntegra da entrevista:

Beta Redação: Nos últimos anos, quais fatores têm causado uma mudança comportamental no hábito de leitura dos alunos?

Gislene Rodrigues: Acredito que é multifatorial. Tempo maior de telas, pouco incentivo em casa e encarecimento do livro físico são alguns fatores que podemos considerar quando pensamos nas mudanças de comportamento do leitor. Mas, por outro lado, estamos tendo um acréscimo de compras de livros entre o público jovem e também redes sociais, como o TikTok, alavancando a venda de vários títulos de livros.

Qual o impacto desse movimento nos estudos e aprendizado?

Gislene Rodrigues: As gerações Alfa e Z estão em idade escolar e, com certeza, perceberam o impacto nas formas de aprender. O uso das tecnologias e metodologias ativas são imprescindíveis para engajar os jovens e as crianças na escola. Trabalhar as questões emocionais, como a ansiedade gerada pelo uso da tecnologia, é um desafio que se desenha para a formação de leitores.

Com o avanço tecnológico, o que escolas e bibliotecas têm feito para manter o hábito e o interesse de crianças e adolescentes por acervos e espaços físicos de leitura?

Gislene Rodrigues: Na minha percepção, a mediação de leitura é uma forma preponderante quando penso em fidelizar os estudantes no uso e acesso às bibliotecas. É importante investir em acervos de qualidade, buscar itens de interesse e pensar em espaços atraentes para os estudantes. É preciso investir nas bibliotecas escolares e perceber a potência desses espaços na formação de leitores e cidadãos letrados política e socialmente.

Como é a atuação do Conselho Regional de Biblioteconomia junto às escolas para o incentivo dos alunos à leitura?

Gislene Rodrigues: O Conselho Regional é uma autarquia federal com a atividade fim de fiscalizar o exercício ilegal da profissão de bibliotecário. O nosso papel é fortalecer a importância e a existência de profissionais bibliotecários nas escolas. Pensando em ampliar o nosso diálogo com a sociedade civil, em 2022 lançamos a Campanha #Soubibliotecaescolar, com o propósito de esclarecer a importância da Lei 12.244 , de 2010, que torna obrigatória a presença de bibliotecas nas escolas públicas e privadas em todo o território nacional.

Como ação concreta dos Conselhos Federal e Regional de Biblioteconomia (sistema CFB/CRB), foi elaborada a cartilha A Biblioteca Escolar, que está sendo entregue em nossas fiscalizações com o objetivo de conscientizar os gestores sobre a importância das bibliotecas escolares com a gestão de profissionais bibliotecários.

Como você vê os espaços de bibliotecas escolares no futuro? Acha que ainda existirão?

Gislene Rodrigues: Com certeza. E [existirão] com novas configurações e importância. As bibliotecas escolares, além da formação de leitores, são espaços para o desenvolvimento do pensamento crítico, científico e criativo. Além disso, os bibliotecários têm se empenhado em desenvolver programas de educação para a informação combatendo desinformação e notícias falsas. As bibliotecas já eram espaços makers — ambientes diferenciados que viabilizam aos alunos a realização de diversos tipos de tarefas muito antes do surgimento dessa cultura. Sempre abrigaram oficinas e eventos, sendo ambientes não apenas de entretenimento, mas também de cultura, educação e informação.

Uma biblioteca escolar com uma boa gestão repercutirá em inúmeras possibilidades de apoio e qualificação no desempenho escolar. A pesquisa Retratos da Leitura do Brasil: bibliotecas escolares, do Instituto Pró-Livro, apresentou dados consistentes demonstrando que bibliotecas geridas por profissionais qualificados aumentavam os indicadores dos estudantes em Língua Portuguesa e Matemática.

Como você enxerga a atuação de professores e educadores em relação ao tema?

Gislene Rodrigues: Ainda há um desconhecimento sobre o papel do profissional bibliotecário e sua função. Verificamos, reiteradamente, enquanto Conselho Profissional, instituições públicas e privadas contratando leigos para a gestão das bibliotecas. A aproximação destes agentes só qualificaria a formação dos estudantes, cada um dentro da sua atuação. Entretanto, é importante reconhecer que o bibliotecário é um agente educador e promotor de mudanças positivas dentro da escola, em parceria com os professores, visando à formação leitora e cidadã de toda a comunidade escolar. Isso se dá a partir de uma biblioteca estruturada, com investimentos em recursos humanos e financeiros que possibilitam sua dinamização frente aos alunos e tornam esse espaço convidativo e coadunado com o projeto político-pedagógico da escola.

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