Célio: “A melhoria dos serviços públicos só vem ouvindo a população”

Na série de entrevistas com concorrentes à prefeitura de São Leopoldo, a Beta Redação conversa com Professor Célio, do PSOL

Lucas Alves
Redação Beta
18 min readOct 27, 2020

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Professor Célio (E) e Fábio Dutra são os nomes do PSOL para concorrerem à prefeitura de São Leopoldo. (Foto: Arquivo pessoal/Prof. Célio)

Natural de Brasília (DF), Célio Juliano Barroso Trindade, 42 anos, vive em São Leopoldo há uma década e atua como professor de Filosofia na rede estadual. Pela segunda vez, é o representante do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) na disputa pela prefeitura.

Desde cedo, Célio foi ligado a causas políticas. Participou de movimentos estudantis, sociais e partidários. Porém, antes de 2016 nunca havia concorrido a nenhum cargo. Em sua primeira eleição, somou 557 votos, ficando em sexto lugar. Em 2020, Professor Célio tem como vice na chapa Fábio Dutra Almeida, também do PSOL.

A entrevista com Célio para a cobertura especial das Eleições 2020 foi produzida pela Beta Redação com suporte institucional da Unisinos. A pauta teve a colaboração da comunidade universitária, que, em consulta por meio virtual, apresentou 37 sugestões de perguntas, das quais cinco foram selecionadas e editadas para apresentação a todos os candidatos.

Confira a seguir a entrevista, concedida por videoconferência, no dia 12 de Outubro.

Na reformulação dos itinerários dos ônibus municipais, prevista em seu plano de governo, como ficará a população que vive nas ocupações, uma vez que as empresas insistem em não entrar nessas áreas? Como fazer isso?

No Brasil a gente tem um grande problema que é o déficit habitacional. Os estudos mostram assim que hoje tem mais imóveis vazios que gente precisando de moradia. Mesmo assim tu tens um alto déficit de moradia em todas grandes cidades do Brasil, principalmente em capitais, cidades médias da região metropolitana, como é o caso de São Leopoldo. Isso gera justamente essas ocupações irregulares, que geram dois problemas. Em um, o poder público não pode simplesmente mandar um trator ir lá e derrubar as casas e expulsar todo mundo, como a gente vê em alguns lugares. Por outro, a gente tem a questão da legalidade, que dificulta o crescimento e a infraestrutura.

A cidade não pode fazer isso em uma ocupação porque é uma ocupação. A gente pretende combater um pouco essa especulação imobiliária, fazendo com que o governo possa atender a demanda de moradia e não só atender a demanda das grandes especulações. Nesse caso das ocupações específicas, claro, as linhas de ônibus muitas vezes se negam por causa da segurança, acho que esse é o primeiro fator, a dificuldade que tem, por exemplo, não ter asfalto, não ter outras coisas de infraestrutura.

“A gente precisa fazer um trabalho de regularização dessas áreas”

A primeira coisa é a gente fazer um estudo dessas localidades de São Leopoldo e o estudo das famílias para a gente separar aquelas famílias que realmente precisam, que estão ali porque precisam de moradia, mas tem muita gente ali que não precisa e que se aproveita dessa situação para ganhar um terreno e depois fazer um negócio com esse terreno e até especular. Então a gente precisa separar bem e fazer um processo de regularização dessas áreas. Esse é o primeiro passo porque, regularizando essas áreas, dando a oportunidade para quem realmente precisa, aí a gente vai poder fazer melhorias de infraestrutura que possibilitam as linhas de ônibus passarem lá. As linhas de ônibus são concessão pública, então as empresas não podem se negar a ocupar esses espaços. Claro que elas podem colocar as questões delas, mas não podem se negar, e a gente pretende fazer esse trabalho de regularização dessas áreas.

Outra proposta de seu plano de governo é a implementação de bicicletas de uso compartilhado no município. Porém, as ciclovias e ciclofaixas ainda são poucas em São Leopoldo. Em alguns locais, pelo tamanho das ruas, seria complicada a instalação de vias para bicicletas. Quais áreas da cidade serão beneficiadas caso o projeto aconteça?

A questão das ciclovias é muito importante para nós, porque a gente fala sempre no Programa Ecossocialista. O que seria o ecossocialismo? É uma forma de a gente pensar a cidade como um lugar onde as pessoas vivem bem e não um lugar onde as pessoas vão ganhar dinheiro e explorar. Um lugar onde as pessoas vivam bem, uma cidade sustentável que integra tudo. A bicicleta é um meio de locomoção que não polui tanto como o carro, é uma questão de saúde, é uma questão de esporte e lazer, e também uma questão de mobilidade urbana. Pensar a bicicleta não só para o esporte e lazer, mas também para ir trabalhar, para visitar o amigo, enfim. No Brasil a gente tem a cultura do carro.

O carro é útil e as pessoas se apegaram muito ao carro. O carro é sinônimo até de status, de poder e essas coisas. Então, quando você cria um mecanismo que vai disputar as ruas com os carros, geralmente a população tende a ser crítica a isso. A primeira coisa é a gente conversar com a população, fazer um processo pedagógico da importância da ciclovia e da bicicleta. Como a gente faz isso? A gente pega exemplo de países que têm um alto índice de desenvolvimento humano, como a Dinamarca e a Holanda. São países em que as cidades investem muito em bicicletas. E para gente pegar esses exemplos e mostrar em uma cidade sustentável no futuro vai ter que dar atenção às bicicletas.

“Com o tempo a gente vai fazendo estudo para aumentar as ciclovias, para que façamos um processo pedagógico“

Como que a gente vai fazer isso? Primeira coisa é a gente criar espaços mais ligados para o esporte e lazer. O Parque Imperatriz é um ótimo lugar para a gente fazer ciclovia de esporte e lazer. A própria Avenida Imperatriz, que é uma avenida grande, dá para fazer ciclovia. E fazer um estudo nos bairros para gente ver espaço onde a gente possa fazer áreas de esporte e lazer de bicicletas, incentivar a prática da bicicleta. O segundo passo é a gente pensar em ciclovias nas grandes avenidas de ligação entre bairros, como a Avenida Integração, Avenida João Corrêa, Henrique Bier na Zona Norte, na Avenida Scharlau, são grandes avenidas que dá para começar a fazer ciclovias que melhoram o trânsito.

Com o tempo a gente vai pensando e fazendo estudo para aumentar aos poucos essas ciclovias para que não entre em conflito com a população, que façamos um processo pedagógico. Primeiro adentrando nas questões e áreas de esporte e lazer e depois nas grandes avenidas, para depois ampliar na medida em que a população for se acostumando mais com essa ideia. É uma ideia de que não podemos mais fugir, já estamos em 2020 e agora se fala muito nessa questão de cidades sustentáveis e meio ambiente

Na campanha, o senhor fala que é preciso criar uma “alternativa econômica local”. Como faria isso?

O Brasil, não só o Brasil, mas os países de terceiro mundo tiveram um problema, entraram nessa era da globalização de uma forma muito fragilizada. A globalização presenciou os grandes conglomerados econômicos. As grandes forças econômicas estão nos países do primeiro mundo. Os países de terceiro mundo, não só na América Latina, mas também na África e Ásia, sofrem com isso, pois o mercado local e a economia local sofrem a concorrência desleal das grandes economias. Os menores são os que mais pagam as contas e mais sofrem.

Micros e pequenas empresas são as que mais pagam impostos, as que mais empregam e as que mais geram renda para as cidades. Como que a gente fortalece a nossa economia local? Essa alternativa econômica é justamente dizer assim: “A gente não pode ficar tão à mercê das oscilações mundiais da economia”. Para isso a gente precisa fortalecer as pequenas e microempresas. As empresas do comércio local do centro, mas também pensando nos pequenos comércios dos bairros, que empregam duas, três pessoas, ou às vezes até a família que vive daquele comércio.

“Podemos fazer parcerias com universidades ou escolas técnicas para quem quiser empreender”

A gente precisa criar duas coisas básicas. Isso vai depender de a gente ter a gestão e criar alternativas para criar uma linha de microcréditos. Já temos exemplos que a gente pode pegar microcréditos para pequenas e microempresas para que elas possam fortalecer. Alinhado ao microcrédito é preciso a gente também investir muito em educação para esses pequenos empreendedores. Educação de gestão financeira. Muitas vezes as pessoas pensam que vão criar um pequeno negócio, abrem um pequeno comércio e logo vem a falência. Inclusive, às vezes as pessoas querem, têm vontade, mas não estão preparadas no sentido de estudo, de saber como funciona, de tudo, desde o marketing até fazer a gestão da empresa, fazer contabilidade. Podemos fazer parcerias com universidades ou escolas técnicas para quem quer empreender. Criar microcréditos e criar essas formações já vai ser uma ajuda. Além de desburocratizar aquilo que está na alçada da prefeitura, tentar desburocratizar a criação de micros e pequenas empresas. Aliado a isso, o aumento da renda para as pessoas de baixa renda.

Por último, a gente fala em economia solidária. É uma alternativa de economia que faz com que as pessoas, empreendedores individuais, o local, criem uma rede de comércio. Por exemplo, o cara que faz salgadinho entra em contato com o cara que vende em um pequeno comércio da cidade, como um bar ou padaria, e de repente essa pessoa está fazendo o salgadinho para ser vendido lá no bar. Então você integra esses dois. Alguém que venda no seu carro de lanches algo que outra pessoa faça. Para isso o poder público deve ajudar para que essas pessoas se encontrem, se unam e façam uma espécie de economia solidária, onde cada uma partilha o que faz. Então, acho que essas são medidas boa para a gente fortalecer um pouco o comércio local.

O senhor promete dar atenção à primeira oportunidade de emprego dos jovens. O que o município pode fazer para estimular a entrada deles no mercado de trabalho?

Quando você tem uma alta de desemprego, quem mais sofre são os jovens, porque não têm experiência ou formação, mulheres, mães donas de famílias, são os primeiros a serem demitidos. O jovem tem aquela pressão de estar se formando no ensino médio, a faculdade às vezes é difícil porque você não tem uma universidade pública aqui na região, só a UFRGS em Porto Alegre. Aí você tem que pagar ou concorrer a bolsas que também estão sendo cortadas. A política de primeiro emprego seria fazer parceria com médias empresas em São Leopoldo para que contratem esse jovem, talvez fazendo parcerias com o governo estadual, de imposto, ou pegando empresas que talvez estejam devendo imposto de renda, então você abate o imposto de renda a partir da contratação do jovem. Nós já tivemos programas assim, outras vezes, de primeiro emprego para a juventude.

“A política de primeiro emprego seria fazer parceria com médias empresas para que contratem esse jovem”

Claro que esses programas têm seus problemas, mas também ajudaram muita gente a conseguir o primeiro emprego. Formação para estágios. Nós temos as universidades aqui da região. Podemos fazer relação entre empresa-escola para conseguir estágio para a juventude. Através de cursos profissionalizantes, fazer relação com as escolas para que jovens tenham uma formação profissional e, principalmente, ajudar também na questão do ensino superior. A gente precisa de uma política forte que ajude o jovem a entrar no ensino superior. Geralmente essas políticas são feitas pelo governo federal nos últimos anos, de aumento de ofertas no ensino superior. Mas acho que o município, Estado, a região pode criar bolsas, às vezes criar bolsa de estudo superior nas áreas que a região mais absorve.

Na área de tecnologia, criar no ensino básico políticas educacionais que fortalecem a pesquisa, para que os jovens já vão se interessando por tecnologia, pois isso é importante para o desenvolvimento local, que você tenha cabeças pensantes que consigam desenvolver tecnologias e estruturas. Então, é uma série de programas que a gente pode estar utilizando para ajudar o jovem nessa questão do primeiro emprego.

O senhor concorreu pela primeira vez a prefeito em 2016, e fez somente 557 votos. A falta de experiência em cargos públicos poderia dificultar seu mandato, caso eleito?

Acredito que não. Participo da vida política desde os meus 13 anos, através de movimentos sociais, populares, partido, movimentos estudantis, também através da universidade, nos estudos. Fiz mestrado na Unisinos em Filosofia Social e Política. Mas, claro, a experiência prática é muito importante, pois é outra coisa. A vida prática tem suas mudanças. Eu nunca estive na vida partidária com intenções de eleição a cargos públicos. Isso veio em 2016, pois estava em um espaço e o partido precisou que a gente tivesse que ocupar esse espaço. Então aceitei o convite pela primeira vez, me candidatando.

Os votos tiveram mais a ver com a estrutura da campanha. Em 2016 a gente fez campanha só nos debates. Fomos convidados para todos os debates. E nas redes sociais. A gente não tinha material de campanha, não tínhamos dinheiro e nem gente para fazer campanha, porque nós éramos poucos militantes. Então a gente acabou desconhecido pela maior parte da população em nossa candidatura. Foi importante porque a gente ocupou e conseguiu mostrar nossas ideias, conseguiu mostrar uma alternativa política. A gente faz uma disputa não só das eleições, mas uma ideia de projeto.

“A gente nunca vai fazer uma mudança se ficar votando só naquele que já ocupou cargos”

A gente vai enfrentar as grandes estruturas de partidos. As grandes campanhas dificultam bastante. Agora, a questão da experiência prática, lógico que conta, mas a gente nunca vai fazer uma mudança, uma novidade na política, se ficar votando só naquele que já ocupou cargos. A vida prática também está cheia de pessoas que não tinham nenhuma experiência em cargos administrativos, cargos políticos, e que fizeram bons mandatos. Principalmente quando você já tem montado um bom projeto, uma ideia, um princípio.

O PSOL tem 15 anos de existência e tem muita gente em todas as áreas. Na área de gestão de saúde, de educação, de empreendimento, mobilidade, e daí vêm ideias. Vamos pegar essas ideias, somar a realidade concreta de São Leopoldo e criar projetos. Acredito que com trabalho e dedicação a gente vence a nossa inexperiência. Seria um desafio, não vou dizer que não traz problema nenhum, mas quando a gente está confiante no trabalho, a gente resolve esses desafios.

QUESTÕES DA COMUNIDADE UNIVERSITÁRIA

Tendo em vista o cenário da pandemia do novo coronavírus, qual seu planejamento para o retorno às aulas nas escolas municipais e infantis em 2021?

A gente precisa ouvir muito os trabalhadores da educação. A gente tem ouvido que os professores e trabalhadores da educação tiveram sérios problemas. Não só a tragédia que é a morte, mas também muitas vezes o comprometimento da saúde que vai durar. A pandemia nunca vai diminuir nem morrer se a gente continuar sendo esse veículo de transmissão. Então, ouvindo os professores, tanto os municipais, quanto os estaduais que atuam em São Leopoldo, há uma preocupação e o medo de retorno às aulas sem a vacina. Acredito que até que a gente tenha uma vacina e uma imunização das pessoas e dos profissionais, como os funcionários da saúde, trabalhadores da educação, não podemos falar de volta às aulas.

Sabemos que a maioria das nossas crianças moram na casa com a avó, com um tio, com o pai e a mãe que também podem correr riscos. Claro, é uma preocupação da sociedade para que voltem às aulas e que a gente não corra o risco. A gente tem um outro problema relacionado a isso que são as aulas remotas. As aulas remotas surgiram como alternativa para não perder as aulas nesse tempo. Há muitas dificuldades. Uma é o acesso dos jovens e crianças aos aparelhos necessários para ter aula remota. Internet, celular, computador, a maioria das nossas famílias não tem. Além disso, o professor ficou um pouco abandonado.

“Até que a gente tenha uma vacina, não podemos falar de volta às aulas”

O professor não tem muito conhecimento nem equipamento para fazer as aulas remotas. Estão fazendo na raça, por amor. A gente tem visto exemplos de professores dando aulas. Mas são duas dificuldades que a prefeitura poderia auxiliar para que as aulas remotas realmente funcionem nesse período. Para volta às aulas presenciais, acho que temos que ter a vacina, tem que ter um programa de imunização da população e fazer um estudo de ir voltando aos poucos, a partir do momento que não corra mais o risco para os trabalhadores da educação nem para as famílias.

Quais são os seus planos para o Hospital Centenário?

A gente tem dito que o hospital Centenário é o que a chamamos na gestão pública de alta complexidade. É aquele lugar onde as pessoas vão quando já têm uma doença definida e precisam de um tratamento que geralmente demora mais, de remédios, de um exame mais complexo às vezes e, principalmente, cirurgias, além do atendimento de médicos especialistas. Isso é o mais caro na gestão de saúde, as cirurgias e as unidades de tratamento intensivo, as UTIs. Sempre nas eleições há um debate sobre o Centenário. Embora a gente tenha os maiores problemas, 80% dos atendimentos são resolvidos na saúde básica, no atendimento primário básico que é o primeiro local, o posto de saúde. O que a gente chama de atendimento médio que seriam as Unidades de Pronto Atendimento, as UPAs.

“Uma coisa urgente é a construção de mais uma UPA, para diminuir a pressão no Hospital Centenário”

Nós temos no Brasil uma cultura que a gente quer mudar: de que a saúde pública tem que atacar a doença, tem que atender a doença. Ou seja, espera a pessoa ficar doente. Por que isso? Porque muitas vezes os gestores públicos estão associados com pessoas que ganham muito dinheiro com as doenças. Os grandes laboratórios, que ganham muito dinheiro com remédios mais difíceis, remédios que são mais caros. O pessoal que vende equipamentos médicos. A gente viu agora com o coronavírus a necessidade de respiradores, como que as empresas ganharam muito dinheiro aumentando exorbitantemente os respiradores e até de forma fraudulenta vendendo os equipamentos. Nossa ideia é fazer um atendimento de saúde voltado muito para a prevenção. A estratégia da saúde da família ajuda muito a fazer esse mapeamento. Aí você consegue diminuir um pouco, melhorar o atendimento na saúde básica e diminuir um pouco essa pressão que tem sobre a saúde complexa, a questão dos especialistas, da necessidade de cirurgias.

Uma outra coisa urgente para São Leopoldo é a construção de mais uma UPA, para diminuir a pressão no Hospital Centenário. Diminuindo essa pressão, com os recursos que a gente já tem, é possível economizar e reinvestir no próximo hospital, melhorando a estrutura, o atendimento, contratando especialistas, aumentando os leitos de UTI. Então essa é a nossa ideia para essa questão da saúde.

O senhor tem propostas específicas para a juventude leopoldense? Se sim, quais?

Para a juventude, a gente tem que integrar essa questão de espaço, esporte, lazer, cultura e primeiro emprego. A gente tem uma cidade que tem muitas praças em que a gente pode criar espaços de lazer nos finais de semana, para apresentações culturais da cidade. Mas quando a gente olha os bairros, isso diminui. É preciso ampliar espaços de lazer com segurança, com tudo que é necessário nos bairros da cidade. Principalmente na Zona Norte, que tem poucos espaços para a juventude.

Fortalecer, investir na questão da cultura, pois a cultura também tem a ver com a questão cultural humana, da expressão da arte, mas ela também, para muitos jovens, vai se tornar mais um meio de vida, um meio de emprego e trabalho. Muitos jovens querem viver da sua arte e é muito difícil, pois não há nenhum grande investimento, porque toda a crise econômica que tem, seja municipal, estadual ou federal, que se precisa cortar verbas, a cultura é um dos primeiros locais onde as pessoas vão cortar. Tem muito esse discurso em alguns candidatos, de que a cultura não é importante e deve ser algo privado. A nossa ideia é que não. A cultura é um bem público, que deve ser defendida e ampliada. Eu vejo essa relação do jovem com a cultura muito mais forte.

“A região tem que brigar por uma universidade pública”

Existe uma ideia que somente o jovem da periferia ou os jovens das classes baixas, os filhos dos trabalhadores devem estudar apenas para arrumar um emprego. O pessoal fala muito em cursos profissionalizantes para a pessoa sair logo do ensino médio e arrumar um emprego. Às vezes as pessoas até aprovam esse tipo de ideia pois pensam que o importante é trabalhar logo. Como se o filho do trabalhador não pudesse virar um pesquisador ou estudante que irá depois fazer uma pós-graduação, mestrado, doutorado. A cidade pode ajudar muito nessa questão de ampliar os jovens que estão na universidade. No Brasil ainda é muito pouco, se a gente pegar São Leopoldo, segue o padrão nacional de que cerca de 10% dos jovens com a idade de estar fazendo faculdade estão fazendo de fato. Como a gente resolve isso? Primeiro a região tem que brigar por uma universidade pública. É preciso rediscutir, acho que isso não entra em conflito com as universidades particulares na região porque há uma demanda muito forte do ensino superior no sentido de número de jovens que poderiam estar fazendo universidade.

Quais ações o senhor tomará para fomentar e apoiar os micros e pequenos empreendedores do município?

Falei da importância do micro e do pequeno empreendedor, pois junto com o trabalhador e com a trabalhadora é quem faz a cidade viver, são quem sustentam a cidade. Então, é uma prioridade. Não só no sentido da geração de empregos, mas no sentido estrategicamente de tornar a cidade mais independente da economia frente à conjuntura nacional e internacional. As cidades hoje não estão isoladas. O problema dessa ideia de município é que a gente acaba pensando a cidade isoladamente.

Então você pensa São Leopoldo enquanto o pessoal de Novo Hamburgo pensa Novo Hamburgo e o pessoal de Esteio pensa Esteio. Mas muitos trabalhadores de Novo Hamburgo trabalham em Porto Alegre, trabalham em Canoas, trabalham em Esteio, trabalham em Sapucaia, trabalham em outras cidades. O emprego local em São Leopoldo também absolve muita mão de obra dessas cidades. Às vezes as pessoas pensam que essa demanda é do gestor estadual, mas também pode ser do gestor municipal procurar e criar um diálogo com as prefeituras da região para que a gente pense estratégias juntas que fortaleça pequenas, micro e médios empreendedores na cidade. Ou até grandes empresas para a cidade.

“Precisamos que as cidades dialoguem, porque a economia de uma acaba influenciando na outra”

Porém, precisamos sim que essas cidades dialoguem, porque a economia de uma acaba influenciando na outra. Se São Leopoldo está em crise, os trabalhadores de São Leopoldo vão procurar empregos nessas regiões próximas. Já se São Leopoldo está bem, trabalhadores dessas regiões procuram empregos aqui. A estratégia da economia solidária, criando relação, fazendo estudos por bairros, por região... Quem são essas pessoas que estão produzindo e criando empregos, que estão “se virando”, como diz no ditado popular? Juntar esse pessoal para dialogar, para que eles construam.

Uma coisa prática é a gente criar conselhos que serão muito importantes na eventual gestão nossa. Porque eles vão ser o espaço em que a prefeitura pode sentar-se com quem está fazendo a coisa e eles darem ideias e dialogarem. Então, criar conselhos de desenvolvimento locais, por bairros, para que nesses conselhos a gestão possa dialogar diretamente com quem está empreendendo e fazendo a cidade crescer. Ali podem surgir ideias práticas para que a prefeitura possa estar ajudando.

Que ferramentas e medidas pretendem adotar para ampliar o acesso da população às decisões de governo?

A participação da população é uma coisa que a gente vem falando muito desde a campanha passada. Na política tradicional, no modelo tradicional a gente tem um problema que é a questão do Legislativo, a Câmara de Vereadores do município. Eles têm o papel de fiscalizar o Executivo, de colocar as demandas da população. Acaba que eles têm um canal da questão da população com o Executivo. O problema é que tanto no nível municipal, no estadual e federal, as câmaras acabam abrindo mão desse trabalho para fazer um trabalho que a gente vê muito na gestão, de compra e venda de apoios políticos.

Todos os grandes esquemas de corrupção nos últimos anos no Brasil e nos estados têm a ver com o Executivo criando um mecanismo para comprar o apoio de deputados. Porque o Executivo vai precisar do apoio de deputados para aprovar projetos, fugir de impeachment e uma série de coisas. Os vereadores acabam se vendendo para o Executivo ou para empresas para defender projetos que beneficiam o grupo que ele representa. Isso é muito ruim. Principalmente quando você fala hoje em bancadas. Tem bancada evangélica, bancada do ruralista. Como se a função do deputado fosse defender interesses privados. Isso gerou a grande crise que o Brasil vem vivendo desde 2013 com aquelas grandes organizações. Por quê? Porque as pessoas votam e não tem suas demandas atendidas.

“Hoje as pessoas estão votando por ódio. Ninguém mais está votando com aquela esperança de que as coisas podem ser melhores”

Você não vê, pela maioria dos políticos, porque o Executivo faz um acordo de gabinete com o Legislativo para atender uma demanda privada enquanto a grande parte da população fica sem o atendimento necessário. Esse modelo gerou a grande crise das corrupções que a gente viu, tanto estaduais como federal nos últimos anos. Isso gerou até hoje uma crise com a política, a maioria da população não se sente representada pelos partidos e políticos que estão aí e criaram uma aversão à política. Uma raiva. Hoje as pessoas estão votando por ódio. Ninguém mais está votando com aquela esperança de que as coisas podem ser melhores porque ninguém mais acredita.

Uma das formas da gente resolver essa descrença com a política e quebrar essa corrupção, esse poder de corrupção, é você abrir mais para o diálogo direto com a população. Respeitando o papel do Legislativo, do vereador, mas acho que tem espaço para você criar conselhos municipais em todas as áreas: meio ambiente, saúde, conselho de educação, conselho de desenvolvimento econômico nos bairros e nos municípios, onde aquele conselho pode se reunir representando as pessoas daquela área. Populares vão lá e ali eles podem discutir e apresentar projetos para o Legislativo e para o Executivo. Nesse mecanismo, eles vão auxiliar tanto o Legislativo quanto o Executivo a governar para o povo. Esse é o primeiro papel dos conselhos, auxiliar o trabalho do Legislativo e do Executivo nas suas funções.

Segundo, combater a corrupção. Quando você cria transparência e mecanismos para que a população possa estar olhando os gastos e os investimentos, isso vai ajudar muito no combate à corrupção, pois vai diminuir a margem para os acordos que se dá nos bastidores. Então, o combate à corrupção, a melhoria dos serviços públicos, só vem ouvindo a população, deixando a população falar diretamente.

Mesmo que a gente tenha a Câmara de Vereadores, é preciso a gente criar um canal direto com a população. Hoje, além dos conselhos, a gente tem muitas mídias e redes onde pode criar mecanismos de controle da população, que ela possa acessar as políticas públicas e fazer suas críticas, fazer suas sugestões. Isso é muito importante.

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