CRÍTICA: Escolha no que acreditar em “Mr. Nobody”

Filme retrata as consequências das escolhas do último mortal da Terra

Leonardo Oberherr
Redação Beta
4 min readSep 17, 2021

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Nemo (E) revela ao repórter a moral de toda a história. (Foto: Reprodução/Mr. Nobody)

Não quero assustar, mas as chances de entender Mr. Nobody (Sr. Ninguém, em português) sozinho e na primeira tentativa são mínimas. Então aproveite que, sem spoilers, vou ajudar você a compreender o longa por meio da crítica. Assim poderá apreciar o filme mais desafiador de Jared Leto, que completou 12 anos de lançamento em 12 de setembro de 2021.

O Coringa de Esquadrão Suicida (2016) e Harry Goldfarb de Réquiem para um Sonho (2000) é a grande estrela da produção dirigida e escrita por Jaco Van Dormael. Leto interpreta Nemo Nobody em dois momentos: na fase adulta e ao final da vida, quando se encontra com 118 anos.

O filme de duas horas e vinte e um minutos é complexo, por isso, exige atenção e reflexão. Diferentemente de outras obras em que as principais informações são trabalhadas em diálogos, em Mr. Nobody há diversos detalhes nos cenários e inserções de metáforas. A história é apresentada sem qualquer linearidade.

Ame ou odeie, Sr. Ninguém vai te levar às mais diversas reflexões existenciais. Aliás, muitas são trazidas em frases incríveis, que serão usadas a partir de agora.

Jared Leto interpreta Nemo Nobody com 34 e com 118 anos. (Foto: Reprodução/Mr. Nobody)

“Não tenho medo de morrer. Tenho medo de não ter vivido o suficiente.”

Duro, não é mesmo? Mas o que faz essa frase em meio ao filme? Prometi não dar spoilers. A citação é parte da tarefa de explicar o longa. Porém, algumas informações posso compartilhar. Por exemplo: o nome do personagem principal é Nemo Nobody. Ok, não é uma grande revelação, mas o significado do nome, quando descoberto, oferece mais sentido ao protagonista, sobretudo, ao final do filme. Nemo, em latim, significa “ninguém”. Nobody, em inglês, tem a mesma definição.

A ancoragem da trama se passa no ano de 2092. Nemo acorda no dia em que faz aniversário sendo o último mortal da Terra, e tenta recontar sua trajetória em vida, uma vez que não há registros de sua existência até aquele momento. Neste mundo tudo é tecnológico, e todos são seres imortais, daí a curiosidade para descobrir como era a vida antes da “teleminzação”, processo que tornou tudo mais artificial.

Para entender como foi a vida deste icônico sobrevivente — que acreditava ter 34 anos, quando na verdade tem 118 — , um repórter invade o quarto e propõe que um bate-papo seja registrado. Paralelamente, Nemo é peça de um seriado de televisão chamado O Último Mortal, no qual o público decide se deixa ele morrer naturalmente ou interfere dando alguma sobrevida.

Diane Kruger interpreta Anna, uma das possíveis esposas de Nemo Nobody. (Foto: Reprodução/Mr. Nobody)

“Por isso é difícil fazer escolhas. É preciso fazer a escolha certa. Enquanto não se escolhe, tudo permanece possível.”

A trama do filme se desenrola em como Nemo narra sua história para o repórter. Conforme ele revela os acontecimentos sem linearidade, o jornalista fica inquieto e confuso. Nemo recorda como foram suas oito vidas, de modo controverso, sem deixar claro qual é a verdadeira. Ele fala de seus filhos, mas ao mesmo tempo não os tem. Fala de suas mortes, mas está vivo.

Uma dessas histórias será a verdadeira, claro. Porém, quem disse que as oito não foram? Todas são verídicas, dependendo das escolhas de Nemo. Ao final entendemos todo o processo de construção narrativa da história, porém, se mencionar, estrago a grande surpresa: Por que tudo aconteceu? Ou será que ocorreu realmente? Aquilo existiu?

Não há nada fora do lugar e, minuciosamente, foi colocado com alguma representação, pois faz parte da trama e da argumentação. Aliás, a fotografia do filme complementa perfeitamente toda a história. São cores vivas e chamativas. Indicam quando e onde as situações poderiam estar acontecendo fantasiosamente.

A sonoplastia de Pierre Van Dormael é fundamental, pois traz calma e lembra como a musicalidade é um reforço positivo para os filmes. A narração em off de Nemo para contextualizar algumas cenas e toda simbologia e semiótica por trás de diversas intervenções visuais tornam o filme primoroso.

Música tema das recordações de Nemo com Anna.
Muitos detalhes são inseridos na trama. Você reparou no relógio? (Foto: Reprodução/Mr. Nobody)

“Tudo poderia ter sido outra coisa, e seria um elemento igualmente importante. Tennessee Williams.”

Os caminhos são corretos. As vidas são adequadas. Quantas vezes deparamos com escolhas difíceis e somos obrigados a fazê-las, muitas vezes até sem pensar? Já imaginou como seria sua vida se tivesse optado por outra profissão? Se tivesse beijado outra pessoa? Onde poderia estar? E o quanto a vida do entorno impacta na sua existência?

No filme, o começo é nos possíveis finais e, quando compreender esse detalhe, verá que ficou desatento ao início, por isso, precisaria assistir novamente. Algo semelhante acontece em Donnie Darko (2001), do diretor Richard Kelly. A diferença entre os dois filmes é que em Mr. Nobody existem oito ciclos se fechando — no longa de Kelly é apenas um.

Mr Nobody impacta mais as pessoas que se identificam com a história de Nemo. Afinal, a trama transcorre de maneira profunda e apresenta momentos cotidianos de nossa vida, como o nascimento, o casamento, a criação dos filhos, os sonhos, a separação e a morte.

São muitas perguntas interpretáveis através de Mr. Nobody. Por menores que pareçam as escolhas, saiba que vão interferir na sua vida. A diferença é a incerteza que temos sobre os caminhos a que as escolhas nos levarão. Nemo sabia.

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Leonardo Oberherr
Redação Beta

Estudante de jornalismo, amante de esportes e música. Inspirado por Leonardo Meneghetti, Galvão Bueno e PVC. #IDIDDAT