Crise no Instituto de Previdência de Novo Hamburgo chega ao MP e TCE

Comissão da Câmara estudou rombo nas contas do Ipasem, que teve seu déficit aumentado mesmo com a reforma proposta e aprovada pela Prefeitura

Isaías Rheinheimer
Redação Beta
5 min readOct 21, 2021

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Vereador Ênio Brizola presidiu comissão especial que promoveu estudo nas contas do Ipasem. (Foto: Daniele Souza/CMNH)

A viabilidade do Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores Municipais (Ipasem) é o mais recente impasse político em Novo Hamburgo — e já é alvo de procedimento no Ministério Público. O Tribunal de Contas do Estado também foi notificado sobre a situação do órgão.

Com um rombo financeiro nas contas, cujo estudo atuarial indica déficit de R$ 1,5 bilhões, o Ipasem virou objeto de disputa política no município. A crise que, ano após ano, ganha notoriedade tomou novo impulso quando o Executivo encaminhou, no início do ano, projeto de lei solicitando autorização à Câmara de Vereadores para o parcelamento da cota patronal.

Contrariados com a situação, parlamentares da oposição, inflados por servidores públicos municipais preocupados com o futuro, decidiram criar uma comissão especial para examinar o problema. O resultado desse trabalho resultou, há quatro semanas, em um relatório de 421 páginas que explica detalhadamente o instituto desde sua fundação, aponta indícios que levaram o órgão à quase insolvência financeira e apresenta caminhos que tornam o Ipasem superavitário.

O vereador Ênio Brizola (PT), que presidiu a Comissão Especial de Enfrentamento à Crise do Ipasem e dos Impactos da Reforma da Previdência, considera que a viabilidade do instituto passa, exclusivamente, pelo pagamento em dia da cota patronal.

“O nosso estudo, que contou com análise de pessoas técnicas, mostra que o Ipasem só não é superavitário quando o Executivo deixa de recolher o que lhe é devido. E isso tem se repetido praticamente desde o início da atual gestão”, pondera. Brizola expõe que, no ano passado e durante os nove meses de 2021, a Prefeitura deixou de recolher a parte patronal.

O estudo promovido pela Câmara de Vereadores, contudo, é mais detalhado e indica que o Executivo tem uma dívida de quase R$ 500 milhões com o Ipasem. “Está clara a intenção, em especial da prefeita Fátima (Daudt), em tornar o órgão insustentável para que ele sucumba”, opinou a presidente do Sindicato dos Professores (SindProf), Luciana Martins. A entidade tem se destacado por provocar discussões constantes em defesa do Ipasem.

O que diz a prefeitura de Novo Hamburgo

O secretário da Fazenda de Novo Hamburgo, Betinho dos Reis, refuta essa afirmação. Segundo ele, a situação do Ipasem já vem sendo debatida pelo próprio Executivo há muito tempo. “A saúde financeira do instituto interessa muito à administração, pois pode afetar a capacidade de investimentos do município”, coloca. Ele explica, ainda, que a Prefeitura contratou uma auditoria para examinar as contas do Ipasem muito antes mesmo de a Câmara se interessar pelo assunto.

Betinho dos Reis, secretário da Fazenda, afirma que assunto também é do interesse do Executivo. (Foto: Divulgação/CMNH)

Por isso, diz o secretário, medidas já estão sendo tomadas para resolver o déficit atuarial do órgão, como o recente envio e aprovação pela Câmara de Vereadores de projetos de lei que alteram o regime de previdência para o funcionalismo público que ingressar no quadro efetivo da Prefeitura a partir de 12 de novembro.

“Com a definição, que não atinge os servidores já ativos, os servidores públicos terão suas aposentadorias e pensões pelo Ipasem limitadas ao teto do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que corresponde ao valor de R$ 6.433,57”, conclui.

Atualmente não há teto.

As 11 medidas que eram 12

Entre as 11 medidas apresentadas pela Câmara, uma das principais, na visão do relator do processo, o vereador Felipe Kuhn Braun (PP), é a realização de uma auditoria independente nas contas do Ipasem para confrontar uma análise apresentada pela entidade contratada pelo Executivo.

Essa empresa justifica o rombo nas contas do instituto com a utilização de recursos financeiros para outros fins, que não os previdenciários, e a aumentos salariais para os segurados do Plano Previdenciário acima da inflação e superando a premissa de crescimento salarial em anos anteriores.

Já Brizola classifica a auditoria paga pela Prefeitura como uma cortina de fumaça para esconder o real motivo do rombo previdenciário — que é a falta de compromisso do Executivo em recolher a parte patronal. Por conta disso, o parlamentar sustenta outra recomendação do relatório final. “Queremos explicações do Executivo sobre o que foi feito com o dinheiro que a Administração deixou de repassar ao Ipasem referente a cota patronal”, finaliza.

“O Ipasem está deficitário porque a Prefeitura não fez sua parte, pois já houve inclusive aumento da alíquota do que é descontado dos servidores. Então, de fato, esse dinheiro existiu e a Prefeitura utilizou parte deste dinheiro em outras áreas”, corrobora Felipe Kuhn Braun.

Vereador Felipe Kuhn Braun, relator da comissão especial, reconhece que recomendações seguem no papel. (Foto: Lucas Mallman/CMNH)

Antes do relatório ser concluído, os membros da comissão cogitaram apresentar uma 12ª medida, mas essa acabou ficando pelo caminho. Era a instalação, no âmbito do Poder Legislativo, de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). O que também segue no papel ainda são as 11 recomendações firmadas.

“Ainda não foi feita (a auditoria independente). Na verdade, não temos como realizar ela paga pela Câmara e ainda não chegamos a ver qual vai ser o meio (para realizá-la)”, salienta o relator da comissão especial.

O Executivo não quis tecer considerações em torno do resultado da comissão. “Ipasem e Prefeitura irão realizar uma análise técnica de seu conteúdo”, sintetiza Betinho, secretário da Fazenda.

Beta Redação procurou o comando do Ipasem para comentar a situação, mas a diretora-presidente, Maria Cristina Schmitt, não atendeu às ligações, nem retornou o contato feito. Já o coordenador Jurídico do órgão, o advogado Lucas do Nascimento, disse que não é autorizado a se posicionar em nome do Ipasem, especialmente por se tratar de um “debate com viés político”.

Vereadores querem que MP e Tribunal de Contas investiguem o caso

Os parlamentares que lideraram a comissão especial garantem que o Ministério Público (MP) e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) foram notificados da situação e receberam cópia do relatório final. A intenção dos vereadores é de que o documento subsidie investigações que tramitam nos órgãos fiscalizadores desde o segundo semestre do ano passado.

O caso envolvendo o Ipasem chegou ao conhecimento do MP e do TCE por intermédio de denúncias feitas pelo SindProf. “Estamos aguardando posicionamento dos órgãos, enquanto isso, vamos iniciar uma nova discussão e propor a implementação de uma previdência complementar”, adianta Luciana Martins, do SindProf.

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