Derly: “Queremos a população opinando sobre todos os temas, ajudando a definir rumos”

Na série de entrevistas com concorrentes à prefeitura de Porto Alegre, a Beta Redação conversa com João Derly, do Republicanos

Lelo Valduga
Redação Beta
7 min readNov 4, 2020

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João Derly disputa a prefeitura pelo partido Republicanos. (Foto: Arquivo pessoal/Divulgação)

Nascido em Porto Alegre no dia 2 de junho de 1981, o ex-judoca e multicampeão João Derly é um dos candidatos à prefeitura de Porto Alegre. Em 2012, foi eleito vereador pelo PCdoB, com cerca de 14 mil votos, candidatando-se nas eleições seguintes a deputado federal e novamente se elegendo, então com mais de 100 mil votos.

Em 2015, se desfiliou do PCdoB alegando pouca afinidade com posições do partido, vinculando-se à REDE. Em 2018, tentou a reeleição mas não obteve êxito, trocando novamente de partido, agora pelo PRB — atual Republicanos. Em 2019, no governo de Eduardo Leite, assumiu a Secretaria do Esporte e Lazer, tendo deixado a pasta para se candidatar a prefeito.

A entrevista com Derly para a cobertura especial das Eleições 2020 foi produzida pela Beta Redação com suporte institucional da Unisinos. A pauta teve a colaboração da comunidade universitária, que, em consulta por meio virtual, apresentou 22 sugestões de perguntas, das quais cinco foram selecionadas e editadas para apresentação a todos os candidatos.

Confira a seguir a entrevista, concedida por e-mail e telefone, no dia 22/10.

Questionado por um jornal sobre como seria Porto Alegre daqui a 5 anos, caso seja eleito, em uma frase o senhor respondeu: capital nacional do empreendedorismo e da participação. Com quais ações pretende facilitar e desburocratizar a máquina pública da capital para solucionar a crise econômica que vivemos?

Criaremos o Observatório Municipal de Ocupação, Emprego e Renda para facilitar o empreendedorismo na cidade. Ainda, levando em conta a crise, formaremos um comitê com a missão de entender a vocação de cada região de Porto Alegre, planejando e propondo ações com agentes locais visando o desenvolvimento de iniciativas para a geração de emprego e renda.

Criaremos a Escola do Empreendedorismo tendo como inspiração o projeto Favela Holding, do Rio de Janeiro. A desburocratização se dará com o auxílio da tecnologia e da inteligência artificial, usadas a favor da gestão pública, com alvarás por meio digital, por exemplo, e licenciamentos mais ágeis e responsáveis.

O senhor foi vereador em Porto Alegre quando era filiado ao Partido Comunista do Brasil. Hoje, concorre à prefeitura pelo Republicanos, no campo oposto do espectro ideológico. Que motivos o fizeram mudar de um extremo ao outro?

Me permita discordar do termo “extremo”. O Republicanos não é um partido de extremos. Ingressei no PCdoB por afinidade nas pautas esportivas, lembrando que, à época, o partido comandava o Ministério do Esporte. Como vereador, os trabalhos caminharam bem. Quando me elegi deputado federal, a realidade mudou e conheci de perto o que eles chamam de centralismo democrático que, na prática, é a tomada de decisão sobre o voto dos parlamentares pelo Comitê Central, sem discussão e sem argumentação, de maneira vertical.

Em mais de 90 anos de existência do partido, somente eu e o deputado Aliel [Machado, então no PCdoB do Paraná, hoje no PSB] ousamos votar de forma diferente do que determinou o Comitê Central. E votamos a favor do trabalhador, ou seja, de acordo com o que acreditávamos. Desde esse momento, a minha situação ficou insustentável, e as divergências se acentuaram. Entendi que era momento de trocar e de buscar um partido que fosse realmente democrático, plural e que acolhesse com respeito as posições de seus filiados.

Em suas propostas de governo, o senhor diz que não se governa sem diálogo. De que forma, se eleito, pretende dialogar com a população da capital e com que ferramentas?

Porto Alegre já foi exemplo para o mundo por implementar uma das mais conhecidas formas de participação popular na administração pública: o Orçamento Participativo. Ao longo dos anos, porém, o OP veio sendo aparelhado e enfraquecido, até que o atual governo acabou com ele.

Nós queremos radicalizar — no bom sentido — a participação popular. Não queremos a opinião das pessoas apenas para decidir no que investir recursos (hoje infinitamente menor que nos tempos da criação do OP). Queremos a população opinando permanentemente sobre todos os temas, ajudando a definir prioridades e rumos. E faremos isso através do projeto Cidadão Participativo. Aos locais que não têm internet de qualidade, levaremos totens para que todos possam participar das decisões do governo.

“O Orçamento Participativo veio sendo aparelhado e enfraquecido, até que o atual governo acabou com ele”

Vale lembrar que, quanto fui deputado federal [na legislatura 2015–2018], inovei e, pela primeira vez na história da Congresso Nacional, levei ao cidadão gaúcho a oportunidade de definir o destino das emendas parlamentares que o meu mandato dispunha. O fiz através do aplicativo Tu Decide. Quando vereador, fui o primeiro parlamentar do Brasil a usar o Whatsapp para o diálogo direto de um mandato com a sociedade. Por isso, posso dizer com firmeza que será assim a prefeitura de Porto Alegre: com diálogo e participação real.

Sobre a segurança da cidade, consta em seu programa ações preventivas em praças, parques, postos de saúde e escolas municipais. Como o senhor pensa essa questão? Quais medidas já veríamos em um começo de mandato?

Com o Observatório da Violência, teremos um comitê dedicado à coleta de informações, diagnóstico e planejamento das ações da Prefeitura para a promoção da segurança pública. É a inteligência usada a favor da sociedade.

Teremos a criação do Sistema Descentralizado de Ações Táticas para reordenar o emprego e funcionamento de todas as viaturas e grupamentos policiais, de acordo com as necessidades de cada região, definidas pelos Conselhos Comunitários de Segurança. Vamos estimular o fortalecimento e o empoderamento do Gabinete de Gestão Integrada. Destinaremos um orçamento próprio para a Guarda Municipal e trabalharemos para diminuir o déficit de agentes em sua equipe.

“Vamos tirar do papel a Polícia Comunitária”

Vamos integrar todos os sistemas de câmeras de vigilância e tirar do papel a Polícia Comunitária. Tecnologia não substitui o ser humano. Em nossa gestão, porém, ela será usada para facilitar e potencializar o trabalho desenvolvido pelos servidores.

Em Porto Alegre existem muitas famílias sem condições e sem assistência ocupando terrenos, construindo moradias sem saneamento básico, praticamente no meio do lixo e da poluição. Como o senhor pretende tratar essa questão?

Infelizmente, aumentou muito o número de pessoas em situação de rua. Nas esquinas, vemos centenas de pessoas vendendo balas, ou crianças vendendo guardanapos. Isso é fruto do abandono das políticas sociais por parte do atual governo. Outro ponto é a ausência de ação da prefeitura na regularização fundiária. Há locais, como na Lomba do Pinheiro, no Sarandi ou na Vila Respeito, que famílias esperam há 10, 20 e até 30 anos pela regularização, e nada é feito.

Em nosso governo, vamos agir com foco nas ações sociais, teremos o programa Casa Legal para a regularização fundiária e vamos atuar para devolver a dignidade às pessoas, com abrigos em condições humanas de acolhimento e suporte para que essas famílias possam ter uma renda fixa.

QUESTÕES DA COMUNIDADE UNIVERSITÁRIA

Caso fosse prefeito durante a eclosão da pandemia do novo coronavírus, o que teria feito igual ou diferente das decisões do atual governante?

Não faria o que o atual prefeito fez no enfrentamento à pandemia. Não vi critérios claros para a tomada de decisões. Vi decisões monocráticas e algumas imprudentes, como a não fiscalização do uso de máscaras nas ruas porque, segundo o secretário municipal da pasta da Saúde, não havia comprovação da eficácia do uso de máscaras caseiras. O prefeito jamais apresentou os dados que supostamente embasavam suas decisões. Então, nessa perspectiva, certamente faria diferente.

Qual sua proposta para enfrentar a crise que estamos vivendo no transporte público?

A crise é grave e mundial. Temos propostas claras e viáveis que podem impactar esse cenário. Exemplo: uma mudança contratual que não exija frota própria das empresas pode reduzir em 30 centavos o preço da tarifa. Não acredito em taxação ou em pedágio. Acredito em ações experimentais, como a cobrança de valores especiais para trajetos curtos, trajetos itinerantes e um sistema híbrido com micro-ônibus e vans para os itinerários que não tenham grande número de passageiros.

Porto Alegre tem um grande número de pessoas em situação de rua. Como pretende tratar dessa questão?

Vamos investir na ampliação e na melhoria dos abrigos para essa população, na implantação das Unidades de Acolhimento e dos Consultórios de Rua. Queremos criar, também, o Programa de Capacitação Profissional para a População em Situação de Rua. Precisamos dar dignidade para essas pessoas. E vamos, ainda, viabilizar parcerias com entidades, como igrejas, que fazem um trabalho exemplar nesse sentido.

Quais as suas prioridades para a rede municipal de ensino e como planeja, no cenário da pandemia, o retorno às aulas em 2021?

Primeiro passo é a criação de um Plano Municipal de Educação. Não pode ser como é hoje, tudo solto. Também não se pode fazer uma reforma como a realizada pelo prefeito Marchezan, que foi apresentada aos professores na véspera de o ano letivo iniciar, sem nenhum diálogo prévio. Quanto às aulas, caso os agentes da educação, pais e alunos entendam que deva seguir o modelo de ensino a distância, o faremos em condições que garantam o aprendizado.

Como está, é inaceitável. Isso inclui garantir internet de qualidade para todos os alunos e professores, e, claro, a adequação da metodologia de ensino presencial para EAD. Sempre com foco no aprendizado, pois temos um Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) baixíssimo, e se não garantirmos uma melhora estaremos condenando toda uma geração a um futuro de injustiças sociais.

Como pretende lidar com o problema da falta de vagas nas creches municipais?

Com o que chamamos de “vales” ou “vouchers”. As famílias precisam ter onde deixar seus filhos em segurança e perto de casa ou de seu trabalho. Hoje, além do déficit de vagas, as disponíveis são inviáveis: há mães que trabalham no centro da cidade e não conseguem chegar a tempo de pegar seus filhos, pois a creche fecha cedo e o deslocamento, de ônibus, até a Restinga, por exemplo, ultrapassa uma hora. Vamos usar estruturas privadas e trabalhar sempre com muito critério e fiscalização para esses “vales”.

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