Do like ao confirma

As regras e a efetividade da internet na campanha eleitoral de 2018

Vanessa Souza
Redação Beta
8 min readJun 29, 2018

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Foto: PxHere

O uso da internet para propaganda política e eleitoral é algo recente e ganha cada vez mais força. A lei que fixa as regras para as eleições no Brasil é a de número 9.504 de 1997, chamada de Lei das Eleições. Em 2015, porém, foram realizadas várias alterações nessa lei, tanto em seus artigos quanto em seus parágrafos e incisos que versam sobre pré-campanhas, campanhas eleitorais, arrecadação de recursos, regras de filiação em partidos políticos, dentre vários outros assuntos. A Lei que gerou as mudanças foi fruto da minirreforma política ocorrida no Brasil no mesmo ano, sancionada pela ex-presidenta Dilma Rousseff. A internet é um dos novos meios de comunicação incluídos na Lei após a Reforma Política de 2015, e que foi posta em práticas nas eleições municipais de 2016.

No entanto, em 2017 aconteceu outra reforma que alterou dispositivos da Lei das Eleições (Lei n° 9.504/97), da Lei dos Partidos Políticos (Lei n° 9.096/95) e do Código Eleitoral (Lei nº 4.737/65), que disciplinam todo o processo eleitoral deste ano. A reforma criou novas regras para a propaganda na internet. Agora, candidatos poderão patrocinar o próprio conteúdo nas redes sociais como Facebook e Instagram e em mecanismos de busca (como o Google). Também poderão criar sites próprios, mas não colocar anúncios em páginas de terceiros (portais de notícia, por exemplo).

As regras

Durante a pré-candidatura, desde as eleições municipais de 2016, o pré-candidato tem o direito legal de usar a internet para expor seus projetos, participar de encontros, discutir sobre questões políticas e, sobretudo, deixar claro seu posicionamento pessoal em redes sociais sobre determinados assuntos. É permitido, sem que se configure propaganda antecipada, a apresentação da pré-candidatura, com exposição de posições pessoais sobre questões políticas e exaltação da figura do candidato, desde que não haja pedido expresso de voto. Contanto que não se apresentem oficialmente como candidatos, os canais da web (site, blog, redes sociais) estão livres para serem explorados pelos pré-candidatos antes do período de campanha eleitoral.

Durante a campanha eleitoral na internet (que assim como no rádio e na TV, só será autorizada a partir do dia 16 de agosto), serão permitidas apenas propagandas, segundo a resolução Nº 23.551, das seguintes formas:

  • Em sites do candidato, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de serviço de internet estabelecido no país;
  • Em sites do partido político ou da coligação, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de serviço de internet estabelecido no país;
  • Por meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente pelo candidato, pelo partido político ou pela coligação;
  • Por meio de blogs, redes sociais, sites de mensagens instantâneas e aplicações de internet assemelhadas cujo conteúdo seja gerado ou editado por: a) candidatos, partidos políticos ou coligações; ou b) qualquer pessoa natural, desde que não contrate impulsionamento de conteúdos.
  • Inclui-se entre as formas de impulsionamento de conteúdo a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na internet.

É proibido:

  • A veiculação de conteúdos de cunho eleitoral mediante cadastro de usuário de aplicação de internet com a intenção de falsear identidade;
  • A utilização de impulsionamento de conteúdos e ferramentas digitais não disponibilizadas pelo provedor da aplicação de internet, ainda que gratuitas, para alterar o teor ou a repercussão de propaganda eleitoral, tanto próprios quanto de terceiros;
  • A veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos políticos, coligações e candidatos e seus representantes;
  • A veiculação, ainda que gratuitamente, de propaganda eleitoral na internet em sites de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos, de oficiais ou hospedados por órgãos ou por entidades da administração pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Quem descumprir algumas dessas regras pode ter que pagar uma multa no valor de R$ 5.000,00 a R$ 30.000,00, além de poder responder a processo criminal e civil, conforme for o caso.

Sobre as diferenças entre as campanhas tradicionais de mídia, realizadas há muitos anos no rádio e na TV, e o recente papel da internet dentro das eleições, Felipe Borba, doutor em Ciência Política, professor da UniRio e coordenador do GT Mídia e Política da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica), destaca que o principal ponto a ser levado em consideração é o tipo de público que cada meio atinge.

“Ao contrário do rádio e da TV, as campanhas na internet não são massivas. Nos veículos de massa, você dialoga com todo o tipo de eleitor, desde aquele que tem um nível de cognição mais baixo, o eleitor menos escolarizado, até o que tem um nível cognitivo mais alto. Essa é a principal diferença. Na internet você não atinge todo tipo de eleitor. Muitas vezes, você fica restrito a sua bolha, e você tem muito mais um efeito de reforço do que de propagação ou de conquista de novos eleitores”, explica.

Já o consultor político, estrategista eleitoral e diretor estadual da Associação Brasileira de Consultores Políticos (ABCOP), Paulo Di Vicenzi atenta para os excessos e para impressões erradas que as redes podem causar:

“Observamos que muitos pré-candidatos estão apostando fichas em excesso nas mídias sociais. Imaginam que vão conquistar muitos votos com suas postagens e estão investindo alto na busca de seguidores. Infelizmente vão sair frustrados dessa ilusão. Likes não elegem ninguém, o que elege são votos. E votos são conquistados através de mobilização territorial, especialmente para os candidatos proporcionais. Isso exige equipe, exige tempo e exige trabalho, muito trabalho, bem orientado e rigorosamente auditado”, destaca.

Na prática

Especialista em SEO, sites e audiência e criador da agência paulista de marketing digital e político Trampo, Osmar Ricardo Lazarini elenca e explica alguns pontos técnicos para entender melhor o marketing digital e como ele pode atuar dentro de uma campanha eleitoral

Foto: PxHere
  • Principais mudanças para a propaganda política/eleitoral com a internet.

A grande revolução é a possibilidade de segmentação e geo delimitação do público alvo. Antes, a grande arma era espalhar o máximo de publicidade possível. Agora, a arma é saber chegar ao público ideal com a comunicação mais precisa possível. Isso sem falar das mudanças indiretas propiciadas pela junção da internet + legislação adequada: menos lixo, menos poluição visual, menos gastos, menos poluição sonora. Outra revolução benéfica é o acesso à informação sobre os candidatos. Quem quiser saber em quem está votando, consegue se informar rapidamente. Por outro lado, a internet deu voz a todo tipo de ativismo e interpretações, o que leva naturalmente a uma multipolarização das ideias e pouco grau proposição de soluções.

  • O que pode ser eficiente na web.

As boas campanhas de internet são do tipo inbound — atraem, nutrem de informações, para depois realizar a conversão em voto. Adequam o discurso propositivo e filtram o público que receberá o conteúdo. Por exemplo: você pode falar sobre saúde pública e disparar regionalmente para pessoas de 45 a 65 anos. Você pode falar sobre aborto e endereçar a mulheres com interesses em feminismo, de 20 a 40 anos, e assim por diante.

  • A lei e as regras.

O grande problema é que a lei é vaga sobre o que é propaganda ou não, o que dá margem a interpretações diversas. A orientação é que se faça conteúdo de interesse público segmentando e impulsionado de maneira geo localizada.

A mudança na legislação atual, que permite que se impulsione (pague) publicações até mesmo durante as campanhas, é uma evolução para o marketing político, porém, acaba beneficiando novamente quem tem mais dinheiro pra investir na campanha.

Outra regra muito infringida e pouco punida é a que proíbe a compra de bases de e-mails e celulares de eleitores para disparos automáticos de propaganda política. Essa prática é bem comum.

  • Como usar a internet de forma efetiva.

Principalmente através de SEO, que é a otimização para motores de busca. Além disso, ter um site com bastante conteúdo, propostas (que são diferentes de promessas). Replicar o conteúdo nas principais redes sociais: Facebook, Instagram, Google Plus, opcionalmente Twitter. Produção de vídeos curtos, que alimentam um canal de Youtube e as redes sociais. Ferramentas de retenção de contatos de visitantes no sites e redes, para que se possa ativar um e-mail marketing legal e eficiente. Assim como WhatsApp e SMS.

  • Propaganda x Marketing de conteúdo

É necessário separar as duas coisas. A propaganda direta é provável que tenha um alto grau de rejeição na internet. Inclusive por parte das próprias redes — Facebook e Instagram já têm regras bem restritivas sobre o conteúdo de peças de publicidade e a diminuição drástica do alcance impulsionado. Há ainda as restrições do TSE sobre a propaganda explícita. Resumo: tentar espalhar santinhos e vídeos estilo horário eleitoral na internet é um verdadeiro tiro no pé. Já marketing com conteúdo relevante e informativo, bem feito e estratégico, terá seu espaço.

  • O controle dos conteúdos na internet.

Provavelmente haverá uma ou outra punição exemplar, quando a legislação for infringida durante a campanha, e isso vai espalhar a dúvida e coibir os excessos. Mas é muito difícil de se ter um controle.

  • O WhatsApp e o compartilhamento.

Pelo WhatsApp ainda sobrevive muito do conteúdo preconceituoso (e muitas vezes criminoso), que as pessoas têm evitado em rede aberta, além de muitas mentiras e/ou desinformação. O combate às fake news precisa ser intensificado. O discernimento sobre fontes duvidosas e tendenciosas deve ser denunciado e assimilado com mais rapidez.

Fake News

O fenômeno das Fake News, ou seja, a proliferação por meio do compartilhamento na internet de notícias falsas, passou a ter maior dimensão nas eleições presidenciais dos EUA de 2016, quando o mundo viu o poder que pode ter a disseminação de mentiras na rede. Ocupou, inclusive, parte do debate eleitoral daquele ano, em disputavam Donald Trump e Hillary Clinton.

Percebendo esse lado negativo que a internet pode representar para a democracia, desde o início deste ano, o projeto Comprova está formulado e, hoje (28), foi lançado em São Paulo. O projeto, integrado por 24 veículos de mídia brasileiros, visa identificar, verificar e combater as fake news, rumores e manipulação de informações que possam interferir nas eleições de 2018 do país.

O Comprova é uma iniciativa do First Draft, entidade ligada à Escola de Governo John F. Kennedy, na Universidade de Harvard. A entidade já organizou uma coalizão de empresas de mídia para combater desinformação na internet durante a campanha presidencial da França, no ano passado — o bem sucedido CrossCheck. No Brasil, quem faz a organização da coalizão é a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), com apoio do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor). Além disso, o Google News Initiative e o Facebook Journalism Project ajudam a financiar o projeto.

Como no Brasil o compartilhamento de conteúdos falsos se dá principalmente pelo WhatsApp, a Comprova terá uma conta no aplicativo e pedirá às pessoas para que relatem rumores sobre as eleições por ela: o número para enviar mensagens com informações a serem checadas é (27) 98135–8261. Os conteúdos verificados estarão no site do Comprova (www.projetocomprova.com.br) e nos veículos da coalizão a partir do dia 6 de agosto.

Fazem parte da coalizão:

- AFP

- Band

- Band News

- Canal Futura

- Correio do Povo

- Exame

- Folha de S. Paulo

- GaúchaZH

- Gazeta do Povo

- Gazeta Online

- Jornal do Commercio

- Metro

- Brasil

- Nexo Jornal

- Nova Escola

- NSC Comunicação

- O Estado de São Paulo

- O Povo

- Poder360

- Rádio BandNews FM

- Rádio Bandeirantes

- BT

- UOL

- Veja

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