CRÍTICA: Emmy e o manual para fazer uma premiação a distância
Premiação teve piadas, discursos e recorde em indicações de negros
O Emmy Awards, conhecido como “Oscar da televisão”, realizou no último domingo (20/9) sua 72ª edição. Muito pouco se sabia sobre como a cerimônia seria realizada e quais seriam as atrações diante da necessidade de algo remoto devido à pandemia da Covid-19. A pouca informação, porém, trouxe curiosidade e expectativa que poderiam ser quebradas caso o conteúdo não correspondesse a elas. Entretanto, foi surpreendente.
Ao contrário de prêmios anteriores que buscaram fazer uma cópia a distância da cerimônia que seria feita normalmente, o Emmy decidiu abraçar e usar toda criatividade diante dos recursos que dispunha. Logo na entrada do apresentador Jimmy Kimmel, ele falava diante de um teatro com imagens mescladas, dando a impressão que o local estava lotado com os artistas. Em seguida, ele revelou que, na verdade, o teatro estava vazio. Então tudo ficou silencioso e a câmera se abriu para mostrar algumas figuras em papelão na cadeira.
Essa foi a primeira parte das decisões acertadas da equipe organizadora. Quando o apresentador saiu do palco, fugindo de fundos verdes que tentam disfarçar a fala solitária do host, entrou numa sala repleta de televisores onde todos os indicados se encontravam conectados por videoconferência. Eram mais de 100 câmeras conectadas ao mesmo tempo e podia-se ver todos em suas casas ou quartos de hotel, no seu país e do seu jeito, assim como estamos vivendo.
O abraço feito pelos organizadores, mostrado pelas suas decisões, diminuiu o brilho de outros prêmios que se esforçaram para passar uma normalidade diante de uma situação que foge disso. O Emmy aceitou o “fora do normal” e tornou isso ao seu favor. Aliás, Jimmy Kimmel tratou sobre a crítica de se produzir um prêmio em meio a uma pandemia mundial e a real necessidade disso. Ele admitiu que pode ser algo fútil e menor diante de outras questões, mas nesses tempos difíceis, com as pessoas em casa, a televisão se mostrou não só uma distração, mas uma necessidade para se fugir da realidade.
Em diversos momentos todo o estranhamento causado pelo epidemia foi tratado de uma forma leve e engraçada, como Jimmy e a atriz Jenifer Aniston colocando fogo no envelope com o vencedor para “esterilizar”. Os prêmios recebidos em casa, entregues pessoalmente, foram feitos por um contrarregra vestindo uma roupa isolante personalizada em forma de smoking.
Outra prática adotada foi a valorização de profissionais que estão na frente de batalha durante a pandemia. Algumas categorias foram apresentadas e tiveram os vencedores anunciados por médicos, enfermeiros, fazendeiros, motoristas de caminhão, professores e outros profissionais essenciais que contaram seus relatos individuais de como tinha sido sua reação no início da quarentena e como estão vivendo isso no momento.
Neste ano, houve um recorde de negros indicados nas 16 categorias que tratavam sobre a atuação ou a direção das produções. Enquanto outras cerimônias recebem críticas pela falta de representatividade, a maioria dos apresentadores que auxiliaram o host foram atores e atrizes negros, assim como na música, com o DJ D-Nice, e o destaque para Chadwick Boseman no In Memorian. A cerimônia ainda contou com a presença de Morgan Freeman, Oprah Winfrey e Chris Rock. Os dois últimos foram escolhidos para falar sobre o produtor negro Tyler Perry, que ganhou o Governors Awards, um reconhecimento da academia por seu trabalho com o cinema e a integração de histórias negras no audiovisual norte-americano.
O criador e protagonista da série Black-Ish, Anthony Anderson, celebrou o aumento da representatividade e lamentou o fato de não poderem ter uma plateia e encher aquele teatro com todos aqueles indicados negros. A cerimônia foi bem mais politizada, com referências ao Black Lives Matter, ao caso de Breonna Taylor, jovem negra morta por policiais em sua casa em março deste ano, e também com falas de diversos artistas pedindo a conscientização do voto para os norte-americanos.
A série mais premiada da noite foi a produção da HBO Watchmen, baseada na HQ homônima, que levou 11 estatuetas. Estrelada por Regina King, que ganhou o prêmio por Melhor Atriz em Minissérie ou Filme para a TV, a série é sucesso entre público e crítica. Com nove prêmios, a série de comédia Schitt’s Creek levou todos os prêmios a que foi indicada, concluindo muito bem sua última temporada. A troca de elogios entre o ator Eugene Levy e seu filho, Daniel Levy, emocionou, já que os dois foram protagonistas da série como pai e filho. Zendaya foi a mais jovem ganhadora do prêmio de Melhor Atriz em Série Dramática, com apenas 24 anos. Ela é uma das protagonistas da série Euphoria, da HBO, e em seu discurso pediu que não se parasse de acreditar na juventude.
Afinal, o Emmy foi uma cerimônia que, como Jimmy Kimmel falou no início, tinha “tudo para dar errado”, mas se tornou uma experiência divertida de assistir, como a própria televisão deve ser. A comemoração das famílias dos ganhadores, o telefone tocando logo após a vitória ser anunciada e o “Mãe, ganhei!” aproximaram o telespectador. Fica aqui a dica para as próximas premiações sobre como fazer uma boa cerimônia em tempos de pandemia.