Entenda por que não devemos escolher qual vacina será aplicada

Apesar dos efeitos colaterais, especialistas afirmam que os imunizantes são eficazes e tiram dúvidas sobre os questionamentos mais frequentes na pandemia

Ivan Júnior
Redação Beta
6 min readJun 24, 2021

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Fila para vacinação no Centro de Saúde Modelo, em Porto Alegre. (Foto: Cristiane Rochol/PMPA)

Na maioria das cidades gaúchas, a vacinação contra a Covid-19 tem avançado rapidamente nas últimas semanas, atingindo contingentes populacionais cada vez maiores. No Rio Grande do Sul, até 29 de junho, 15,94% da população estava vacinada com a segunda dose.

São três tipos de imunizantes que estão vindo para o Estado e que são usados para proteger a população gaúcha: Coronavac, AstraZeneca e Pfizer. Em meio ao esforço para mobilizar a população a se vacinar, surge mais um empecilho: algumas pessoas querem escolher qual imunizante será aplicado. Uma das justificativas é o temor diante dos efeitos colaterais causados pela vacina, que são considerados normais por especialistas.

Bióloga imunologista e pesquisadora das interações do Sars-Cov-2 com a célula hospedeira na PUCRS, Andréa Wieck justifica que a discussão ocorre pelos efeitos colaterais, como dor de cabeça, fadiga e febre, que podem ser ocasionados pelos três imunizantes. Wieck observou maior receio com a vacina da AstraZeneca, mas reforça que os sintomas não oferecem qualquer risco às pessoas. “As três vacinas são seguras e têm eficácia. Nosso objetivo deve ser vacinar o máximo da população para retomar a normalidade”, reforça.

Andréa Wieck, bióloga imunologista com mestrado na UFRGS e doutorado na PUC-RS. Atualmente, pesquisa as interações do Sars-Cov-2. (Foto: Arquivo Pessoal/Andréa Wieck)

Conforme o Plano Estadual de Vacinação, todos os imunizantes passaram por avaliação e foram liberados pela Anvisa. O órgão fiscalizador é responsável pelo registro e pelo licenciamento das vacinas em território nacional. Foram autorizadas a vacinação da população com os imunizantes Coronavac, Astrazeneca, Pfizer e Jansen, até o momento.

Observando apenas os imunizantes que são usados no Rio Grande do Sul, o principal diferencial é a tecnologia para o desenvolvimento, como explica a Bolsista da Ação Emergencial/COVID-19 da Capes na PUCRS e doutoranda em Biologia Celular e Molecular Paula Neves.

Considerada a plataforma vacinal mais utilizada e conhecida, a CoronaVac, que demonstrou uma taxa de eficácia de 78% para casos leves e de 100% para infecções moderadas e graves, utiliza o vírus inativado para imunizar o indivíduo. Conforme expõe Neves, a carga do vírus morto é apresentada para o organismo da pessoa, conduzindo a produção de anticorpos e de outras células responsáveis pela imunidade.

Formada em Ciências Biológicas, a pesquisadora Paula Neves compartilha conteúdos relacionadas ao coronavírus no seu perfil do Instagram. (Foto: Arquivo Pessoal/Paula Neves)

A Astrazeneca utiliza a tecnologia intitulada de vetor viral. Comparando ao serviço Uber Flash — plataforma de coleta e entrega de objetos — , Neves explica que o vírus modificado geneticamente carrega parte do causador da Covid-19, levando a informação para as células das pessoas.

Wieck complementa que a vacina de Oxford usa o RNA mensageiro, que é a transcrição do código genético do Sars-Cov-2 — vírus causador da Covid-19 -, para produzir a proteína Spike, presente na fórmula do imunizante. "Uma vez na célula, a proteína Spike é produzida e apresentada ao sistema imune, preparando-o para reconhecer o sars-cov-2, quando entrar no organismo", contextualiza.

O imunizante AstraZeneca, em uma primeira fase, demonstrou eficácia de 70,4%. A última vacina daquelas utilizadas pelo Governo do Estado é a da Pfizer, que apresentou 90% de eficácia em estudos de fase 3. O imunizante utiliza a plataforma de desenvolvimento tecnológica mais avançada comparado com as demais. “A vacina usa RNA Mensageiro, que é como um carteiro responsável por levar código para nossa célula, que será lido e a partir disso será produzido os anticorpos”, detalha Neves.

Mais uma vez tem na composição do imunizante o RNA Mensageiro e a proteína Spike, conforme descreve Wieck:

“A Pfizer usa o RNA Mensageiro que codifica para a proteína Spike do vírus para usar para infectar a célula. O RNA Mensageiro sintetiza a proteína Spike, que está envolta numa nanopartícula lipídica. Uma vez que a gente coloca a formulação da vacina contendo as nanopartículas no nosso organismo, elas conseguem entrar diretamente nas células e são transcritas em proteína Spike, que então é mostrada para o nosso sistema imune.”

Confira 5 dúvidas sobre a vacinação e a Covid-19 respondidas pelas especialistas

Como os imunizantes ainda suscitam muitas discussões em torno de qual é melhor, se é normal ter efeitos colaterais ou se pode fazer a vacina mesmo com sintomas gripais, a Beta Redação traz as respostas para algumas dessas perguntas respondidas pelas especialistas Neves e Wieck.

A Pfizer apresentou 90% de eficácia em estudos de fase 3. AstraZeneca numa primeira fase demonstrou eficácia de 70,4%. A Coronavac demonstrou uma taxa de eficácia de 78% para casos leves e de 100% para infecções moderadas e graves. Qual vacina pode ser considerada mais forte?

Wieck: Olhando para os números diretamente, tomamos a da Pfizer como a mais eficaz porque tem eficiência de 90%, o que significaria dizer que a cada 100 pessoas vacinadas, 90 não vão se infectar. Mas, se observar os números da Coronavac, equivaleria dizer que 70 não pegariam a doença, mas 30 pegariam. E, como tem 100% de eficácia para a infecção severa, terão sintomas leves, ou seja, também é uma vacina ótima. Então, não tem qual é a melhor. O que precisamos pensar na atual conjuntura, além da eficiência da vacina, é na cobertura vacinal. Precisamos imunizar o maior número de pessoas, no menor intervalo de tempo, pois não adianta ter uma vacina com 100% de eficácia e só um indivíduo imunizado.

Alguns imunizantes precisam de duas doses. Se demorar mais do que o período recomendado para fazer a segunda vacina, pode perder o efeito? O que pode acontecer?

Wieck: Quanto à vacina da Covid, não sabemos o que pode acontecer, assim como não sabemos quanto tempo vai durar a imunização. De forma geral, não tem problema se atrasar. O fato de atrasar a segunda dose não pode fazer a pessoa deixar de tomar. É preciso fazer a segunda dose porque não vai ter quaisquer problemas. A vacina da Astrazeneca, por exemplo, se a segunda dose for dada num intervalo maior de tempo, a eficácia será melhor.

Depois de fazer a vacina contra a Covid-19, posso afirmar que não corro qualquer risco de me contaminar ou de transmitir a doença?

Neves: Nenhuma das vacinas é 100% eficaz. Existe, sim, a possibilidade de se contaminar ou de transmitir a doença para outra pessoa, principalmente entre as doses, ainda mais agora que estamos com a cobertura vacinal muito baixa. Quando a cobertura vacinal for maior, a possibilidade de transmissão e de contaminação irá diminuir, porque teoricamente as pessoas vacinadas vão criar uma barreira contra o vírus. Por enquanto, essa afirmação não pode ser feita.

Algumas pessoas se questionam pela reação da vacina, se o vírus é inserido no organismo das pessoas. Quais ingredientes formam os imunizantes? Como agem no sistema imunológico de cada indivíduo?

Wieck: As pessoas acham que têm reação pelo vírus que está sendo inserido no organismo. Na Coronavac é um vírus morto, sem capacidade de fazer nada. No caso da Pfizer, tem somente o RNA Mensageiro, que também não tem capacidade de fazer nada sozinho, pois precisa da célula do organismo. Por fim, na Astrazeneca temos um vírus carregando a proteína do Sars-Cov-2 que também não causa nada. Normalmente, os agentes ou ingredientes ativos dos patógenos não fazem nada por si só. É preciso de alguma outra forma para mostrar ao meu sistema imune que aquilo é um possível causador de doenças. Por isso, é criado um contexto de ativação imunológica. As formulações das vacinas usam adjuvantes (substância adicionada na formulação para que a vacina tenha uma ação amplificada), que diz para o sistema imune que aquilo pode ser um patógeno e causar doenças. O adjuvante serve para chacoalhar o sistema imune e a reação adversa é a resposta imune ao evento vacinal.

Estamos perto do inverno e as crises de alergia respiratórias são bem comuns. Se a pessoa está com sintomas gripais, pode fazer a vacina contra a Covid-19? Terá algum efeito colateral?

Neves: Se a pessoa tem os sintomas gripais, o ideal é aguardar eles passarem para se vacinar. Isso não só em relação à vacina da Covid-19. Com qualquer outra é assim também, porque o objetivo da vacina é estimular nosso sistema a criar anticorpos e células imunes contra um determinado patógeno, neste caso, um vírus. Se tem algum sintoma gripal, o teu sistema imune já está trabalhando contra aquele sistema específico. Se receber a vacina, acontece a exacerbação imune, ou seja, a resposta imune exagerada pode causar efeitos colaterais mais pesados na pessoa. O ideal é que espere. Se teve Covid-19 próximo da imunização, espere pelo menos de 15 a 20 dias depois do final da quarentena. E se for sintoma gripal, também espere passar.

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Ivan Júnior
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Jornalista em formação. Me interesso pelo acontecimento cotidiano. Ademais, tenho uma paixão por ler e discutir futebol e política.