Federais do RS prevêm dificuldades financeiras a partir de setembro

O corte anunciado pelo Ministro da Educação, Abraham Weintraub, afetará desde materiais de limpeza até serviços terceirizados

Stephany Foscarini
Redação Beta
8 min readMay 10, 2019

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De acordo com universidades federais do Rio Grande do Sul, a redução de 30% dos recursos para as instituições de ensino superior, divulgada pelo Ministro da Educação, Abraham Weintraub, atingirá o planejamento financeiro deste ano, uma vez que as verbas já haviam sido destinadas.

A Beta Redação entrou em contato com as setes universidades federais do RS. Entretanto, apenas a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) e a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) retornaram o nosso contato.

O que as universidades têm a dizer sobre o caso?

A UFSM diz que o corte afeta os gastos com luz, água, limpeza, manutenção, entre outros. (Crédito: Site oficial da universidade)

A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) disponibilizou a nota oficial veiculada no Facebook do Gabinete do Reitor:

A Universidade Federal de Santa Maria informa que foram bloqueados R$ 46 milhões dos recursos orçamentários deste ano. Com isso, os R$ 142,9 milhões previstos para o orçamento de 2019 foram reduzidos a cerca de R$ 96,9 milhões. Trata-se do menor orçamento desde 2010. Todas as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) do país foram atingidas com a medida, que impactou em um corte global de cerca de R$ 2,2 bilhões no orçamento da educação superior.

No Facebook foram 3,7 mil reações, 781 comentários e 2,9 mil compartilhamentos. Veja os primeiros comentários:

O reitor da UFSM, Paulo Afonso Burmann, diz que, assim como afirma o ministro, há um bloqueio de R$ 46 milhões do orçamento da UFSM para o ano de 2019. “O ministro, contudo, não sinaliza objetivamente a liberação destes recursos, senão mediante a aprovação do texto da Reforma Previdência, que tramita no Congresso Nacional”, esclarece. Desta forma, condiciona a sustentabilidade da universidade e a continuidade de suas atividades, à uma articulação de cunho político.

Para Burmann, o contingenciamento bloqueia recursos aprovados pela Lei Orçamentária Anual (LOA), ainda em 2018, e já inseridos no planejamento financeiro da universidade para 2019. “Assim, prejudica a execução do orçamento e, consequentemente, o cumprimento de seus contratos com empresas terceirizadas, impactando não somente a comunidade acadêmica, mas toda a sociedade”, opina.

O professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFRGS, Rodrigo Stumpf González, lembra que o arrocho ao financiamento da educação pública no Brasil não é uma novidade. Os cortes do orçamento começaram já em 2015, com medidas ainda no Governo Dilma, para redução do déficit da União. “Agências como CNPq perderam sua capacidade de financiamento de projetos nos últimos anos, o que foi agravado no novo governo”, comenta González.

Na visão do professor, outra medida que tem prejudicado o financiamento da educação foi a emenda do teto de gastos, que congelou o orçamento, no Governo Temer. Isto provoca uma diminuição constante dos recursos disponíveis. “Assim, o ataque ao financiamento da educação pública não é novo. Ele também fez parte da política do Governo FHC, que estimulou o crescimento do ensino privado e das Universidades-Empresa”, ressalta.

A Universidade Federal do Pampa possui cerca de 15 mil alunos. (Crédito: Site oficial da universidade)

A UNIPAMPA também postou nota oficial no Facebook. Segue trecho abaixo:

A Universidade Federal do Pampa (Unipampa) recebeu nesta quinta-feira (02), do Ministério da Educação (MEC) a informação de que o bloqueio no seu orçamento de cerca de 34% dos valores discricionários, entre recursos de Outras Despesas Correntes (custeio) e Investimentos (capital). Com exceção da Ação 4002 — Assistência Estudantil, todas as demais ações tiveram valores orçamentários bloqueados. O valor total bloqueado corresponde à R$ 18.802.778,00, considerando os valores suprimidos em 18/01/2019 e valores de emendas parlamentares destinadas a Unipampa.

Confira como a postagem repercutiu na rede social da Universidade. A publicação totalizou 5,8 mil reações, 1,4 mil comentários e 5,7 mil compartilhamentos.

Em nota a Universidade Federal de Pelotas caracteriza o corte como “censura orçamentária”. (Crédito: Site oficial da universidade)

Já a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) postou uma carta de esclarecimento sobre o ocorrido. Leia um trecho abaixo e a íntegra aqui.

Na UFPel, o violento corte orçamentário significou 30% (R$ 22 milhões) a menos nos recursos de custeio, já originalmente insuficientes à manutenção da universidade, e absurdos 75% (R$ 7 milhões) na verba de capital, destinada a investimentos em infraestrutura e obras. Não se trata de profetizar o caos, mas é necessária a consciência de que, a prevalecer o corte havido, o funcionamento da UFPel inviabiliza-se a partir do mês de setembro, pois que a partir de então não haverá dinheiro para o custeio de energia elétrica, água, telefone, serviços de manutenção, limpeza, portaria, vigilância, nem recursos para bolsas de iniciação científica, ensino ou extensão, tampouco para transporte de apoio entre os campi ou para o subsídio ao preço das refeições no restaurante universitário. É, aliás e por isso, simplista a difundida versão de que o corte não afeta a assistência estudantil.

Diante da atualidade do caso, o reitor da UFPel, Pedro Rodrigues Curi Hallal, confirma que a situação só piorou e está bem explícita a chantagem. “Os reitores, professores, estudantes e técnicos das universidades federais, ninguém vota na Reforma da Previdência, só os deputados e senadores”, comenta.

O reitor define o ato como ameaça e atitude infantil, pois ter o dinheiro de volta se o país aprovar a Reforma não faz sentido algum. “O Governo que faça seu trabalho e convença os políticos com argumentos que a Reforma é importante, e não a usando como moeda de troca, de que ao contrário, acabarão com educação no Brasil”, pontua.

Segundo o professor González, é mais uma medida de caráter midiático e resultado de uma política concreta. “O próprio ministro voltou atrás para dizer que não se tratava exatamente de corte, mas de contingenciamento, que pode ser revisto”, esclarece.

“O país precisa ampliar os investimentos e não diminuir. É lamentável o atual posicionamento para que a educação brasileira siga funcionando”, complementa Hallal. O reitor finaliza dizendo que o investimento em educação básica é essencial, mas sem restringir outras áreas.

A Universidade Federal da Fronteira Sul mantém 45 cursos de graduação, 17 pós, além de especializações e residências médicas. (Crédito: Câmara Municipal de Vereadores de Erechim)

A Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) compartilhou nota oficial nas redes sociais. Confira trecho abaixo e o texto completo aqui.

O bloqueio, que em algumas rubricas chegou a ser de 37,4%, atingiu as despesas discricionárias da UFFS, como fomento à pesquisa e extensão por meio de bolsas a estudantes, bolsas de monitoria, pagamentos de serviços terceirizados como limpeza e segurança, água, luz, aluguéis, despesas com manutenção, entre outros. Isso não quer dizer que vamos parar de funcionar ou que operaremos cortes de forma imediata, mas o bloqueio de recursos aponta para um cenário difícil. Precisaremos, como já fizemos outras vezes, fazer uma ginástica orçamentária para atender a outras demandas de custeio.

De acordo com informações da assessoria de imprensa da universidade, o orçamento de custeio é de R$ 55.274.335,00, já o bloqueio foi de 30,1%, deixando R$ 38.658.076,00 para a instituição. O valor contingenciado foi de R$ 16.616.259,00.

O orçamento para capital equivale à R$ 2.980.862,00 e teve um bloqueio de 59,7%. O valor bloqueado é R$ 1.778.259,00. Esse montante corresponde a quatro meses de funcionamento da instituição.

Com nota máxima pelo MEC, a Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre é a única instituição de ensino superior focada em saúde da capital gaúcha. (Crédito: Site oficial da universidade)

A Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) também postou nota oficial no Facebook e a repercussão foi grande. Teve 5,9 mil reações, 1,2 mil comentários e 4 mil compartilhamentos. Veja como foi:

Informamos à nossa comunidade interna que foi constatado, em nosso sistema, o bloqueio de recursos correspondente a 30% do orçamento de custeio e 65% do orçamento de capital da universidade. O orçamento de custeio está relacionado a serviços necessários para o funcionamento da UFCSPA, como luz, água, telefone, entre outras necessidades, e o orçamento de capital contempla itens como equipamentos de laboratórios e livros.

A reitora da UFCSPA, Lúcia Campos Pellanda, confirma que a universidade terá problemas para se sustentar a partir do mês de setembro, principalmente os laboratórios e aulas práticas. “Custos não são somente obras, há muitos livros também. Nossa instituição valoriza muito isso”, realça. Ela comenta que já estavam se preparando e diminuindo gastos. “Nossa preocupação é com o desemprego. Pensamos no depois de formados. Os investimentos devem ser em todos os níveis de ensino. O conhecimento é muito importante para todos”, destaca. De acordo com Lúcia, o orçamento em 2019 sem os cortes e contingenciamentos financeiros, é R$ 29.500.000,00 de custeio (previsão de cortes de 32,5%) e R$ 3.000.000,00 de capital (previsão de cortes de 65%). O orçamento de capital chegou a ser de 20 milhões em 2015.

O professor González comenta que para melhorar a educação de crianças e adolescente é preciso formar mais professores, no que as Universidades públicas são uma das principais responsáveis, pois mantém cursos que não são de interesse do ensino privado, já que são pouco lucrativos. “Se o país dependesse exclusivamente das universidades privadas, em poucos anos ficaríamos sem professores de geografia, por exemplo. Precisamos divulgar mais nosso trabalho e os benefícios que traz para todo o povo brasileiro. Somente quando os governantes constatarem que atacar a Universidade faz perder votos procurarão novos alvos”, declara.

González conclui que nenhum país no mundo que conseguiu desenvolver-se econômica e socialmente o fez sem investir pesadamente não só em ciência e tecnologia, mas na formação de professores. A ampliação de gastos em áreas tecnológicas pode ajudar no desenvolvimento econômico, mas é insuficiente.

O que o Ministro falou

Recentemente o Ministro da Educação Abraham Weintraub, disse que cortaria 30% dos recursos da Universidade Federal de Brasília (UnB), Universidade Federal Fluminense (UFF) e Universidade Pederal da Bahia (UFBA). Isto porque, de acordo com ele, as universidades realizaram atos políticos que classificou como “balbúrdia”. Na mesma semana ele mudou de ideia e afirmou que o apoio financeiro seria retirado de todas as universidades. Uma semana após a revelação, na terça-feira, 7, durante audiência na Comissão de Educação no Senado, o ministro tentou corrigir o que havia dito e falou que não haverá corte de verba, mas sim contingenciamento. A rede federal inclui mais de 60 universidades e quase 40 institutos em todos os estados do Brasil.

O ministro ainda disse que o recurso poderá ser reutilizado apenas se a reforma da Previdência for aprovada e se a economia brasileira melhorar no segundo semestre deste ano. Confira abaixo as palavras ditas por Abraham Weintraub:

“Não houve corte, não há corte. Vou repetir: não há corte, há contingenciamento. Se a economia tiver um crescimento — e nem é ‘recuperar’ porque estamos em um marasmo a perder de vista — mas se tivermos crescimento econômico com a aprovação da nova previdência, é só o que falta.”

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