Daniel Ferreira de Souza, atual membro da comissão administradora do clube, em frente à fachada recém-pintada da nova sede. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Flamenguinho, em Esteio, une a comunidade em torno da nova sede

Com 39 anos de história, o clube da Vila Pedreira vem superando as dificuldades e levando esporte para as famílias que moram à margem da BR-116

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6 min readMar 26, 2018

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Sem sede até o ano passado, o clube conhecido como Flamenguinho da Vila Pedreira, em Esteio, vinha lutando pelo seu espaço dentro da comunidade. Realizando atividades esportivas sem fins lucrativos, o clube conquistou a tão sonhada sede, mais um motivo de orgulho da história que construiu ao longo de seus 39 anos de existência.

O clube hoje é administrado por três membros ativos: Daniel Ferreira de Souza, que também é técnico do time de futsal do clube, sua esposa, Andreia Forte, e Gilnei da Rosa. Segundo Daniel, a vila possuía clubes como o Internacionalzinho e o Juventude, mas foi em 1979 que seu tio, José Pedro, morador da vila, mais conhecido como Dé, resolveu, com cinco amigos, criar o Flamenguinho. A relação com o famoso Flamengo do Rio de Janeiro é um mistério. Daniel explica que Dé nunca contou a ele, mas especula que tenha sido uma inspiração para tirar o estigma da grenalização. Sem remeter a Grêmio ou Inter, o clube poderia atrair mais gente.

Dé (o segundo da esquerda para a direita, agachado), com amigos, em jogo do Flamenguinho. (Foto: Andreia Forte/Reprodução)

Após alguns anos de fundação, Dé morreu e o clube ficou parado. “Nesse meio-tempo, o clube parou na mão de uns políticos que só se aproveitaram e deixaram o Flamengo limpo, sem fardamento, sem nada. Eles fizeram o fardamento novo, deram os velhos e, quando acabaram os campeonatos, distribuíram os novos também. Não pensaram que no outro ano tinha campeonato de novo”, conta Daniel.

Fardamento oficial do clube na década de 70/80. (Foto: Andreia Forte/Reprodução)

Foi então que, em 2013, Daniel assumiu o clube. “A única coisa que tinha do Flamenguinho antigo eram uns pares de meias que eu havia guardado de recordação”, relembra. Daniel conta que começou tocando o projeto apenas com futsal. “No início de 2013, eu conheci minha esposa. Ela sempre teve o sonho de fazer trabalho social, então neste mesmo ano já realizamos uma festa de Páscoa e iniciamos a regularização do clube, porque nessa época não tinha estatuto, não tinha CNPJ, não tinha nada. Daí começamos a ter Invernadas Gaúchas, passeios com as crianças… Conseguíamos ônibus da Real Rodovias e levávamos elas para passear, sem sede, sem nada. Só na vontade.”

Após algum tempo utilizando os espaços cedidos pela escola Trindade, localizada dentro da comunidade da Vila Pedreira, Daniel viu a oportunidade de adquirir uma sede própria. Em 2017, um antigo bar, perto da escola, ficou vago. Foi então que, com as economias do clube, ele e os outros membros da administração do clube alugaram o espaço.

Ainda em manutenção, segundo Daniel, e com a ajuda da comunidade, aos poucos a sede vai tornando-se definitiva e um ponto de referência dentro da vila. Hoje o clube, que no começo tinha seu projeto voltado apenas ao futsal, proporciona para a comunidade, também, atividades como futebol de areia, futebol sete masculino e feminino, invernada mirim, balé, capoeira, aula de grafite e aula de rimas.

A sede é dividida em três cômodos, onde são realizadas as atividades de dança, capoeira e demais oficinas, e conta com uma biblioteca alimentada pela própria comunidade, além da quadra da escola Trindade utilizada pelo time de futsal. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Com pouca renda, clube depende da comunidade

Daniel explica que a renda do clube vem em sua maior parte de eventos de venda de galetos na comunidade, mas ressalta que, além disso, o clube é cadastrado em projetos do governo que reforçam as finanças, como a Nota Fiscal Gaúcha, o Fundo Estadual da Criança e do Adolescente e o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. Outra renda importante, segundo o presidente, é a doação de amigos — por isso, ele enxerga como importante a boa relação com a comunidade. “Isso aqui é uma vila. Na vila, você nunca vai agradar todo mundo. Mas acredito que com o trabalho que fazemos e a recepção do pessoal, temos uns 90% de aprovação”, estima. Daniel conta que os uniformes vieram de patrocínio: “Corri atrás de estabelecimentos e consegui que alguns nos ajudassem”.

A moradora da vila Jovana Braga considera que o clube tem agregado bastante para a comunidade. Uma filha dela, Kauane Camargo, de 11 anos, faz balé e invernada no Flamengo. “O clube proporciona a oportunidade das crianças não ficarem na rua. Ao invés disso, elas ficam ali brincando e praticando esporte”, destaca Jovana.

Apesar das dificuldades, clube não parou de colecionar troféus

Mesmo com atividades já sendo realizadas na sede — onde os troféus já têm seu lugar de destaque —, prédio ainda passa por reformas, com o auxílio de empresas patrocinadoras e da comunidade. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

A sala principal da nova sede do Flamenguinho é tomada por troféus. Daniel conta que o clube tem campanhas importantes, como o vice-campeonato da Copa dos Campeões, um dos principais torneios de futebol amador do Rio Grande do Sul. “Fomos bicampeões sub-11, bicampeões sub-09, vice-campeão sub-15. Além disso, também fomos vice-campeões da Copa Capão de Futebol de Areia e, no campo, fomos campeões sub-17, sub-20, máster 40 e máster 50 este ano”, relata um empolgado Daniel.

Ao falar da sua segunda função, como treinador, Daniel conta: “Eu tinha um pensamento: ‘tenho que ter jogador, tenho que ter jogador’. Hoje eu me dedico mais às crianças, mesmo assim a gente traz vitórias. Chegávamos nos campeonatos com 11 jogadores e os caras dos outros times reclamando, que o Flamenguinho tem só 11 jogadores, isso e aquilo. Mesmo assim, a gente ia lá e ganhava de clubes com 20 jogadores no banco”.

Trabalho do clube é motivado pela união da comunidade

Doutor em Antropologia pela UFRGS, Arlei Sander Damo, ao estudar a diversidade organizacional do futebol brasileiro, em 2003, destacou que é por meio da organização de pessoas que são geradas as associações clubísticas, e a partir dessa união que é criado o futebol comunitário.

Daniel reconhece essa união ao falar da participação da comunidade. “É muito bom quando chegamos aqui na vila. Tenho até que reduzir a velocidade do carro porque as crianças querem sempre parar pra dar oi. Tu vai varrer a sede e aparecem uns 10 para ajudar. É por essa união que faço o que eu faço”, finaliza, orgulhoso.

Serviço:

Endereço: Rua José Pedro Silveira, 247, Vila Pedreira, Esteio.
Escolinha de futebol: segunda, terça e quinta, das 17h30 às 18h30.
Oficinas: Invernada — segunda, das 18h30 às 19h30; Grafite — terça, das 18h30 às 19h30; Rimas, sexta, das 19h30 às 20h30.

* Em abril se iniciam as aulas de Balé e Capoeira, nas quartas e quintas, das 18h30 às 19h30.

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