Grupo Matricária busca fortalecer as mulheres através da música
Coral é formado pelo público feminino e visa deixar um legado por onde passa
O grupo vocal Matricária foi criado em abril de 2022 como uma ação cultural da Associação Cantalomba, do bairro rural Lomba Grande, de Novo Hamburgo (RS). Inicialmente, foram abertos encontros para aulas de canto coral para a comunidade, no espaço Irmão São Francisco, na casa da regente e coordenadora Jacinta Scalcon. Porém, a frequência destes encontros semanais para formar um grupo vocal foi realizada somente por mulheres e, a partir disso, o grupo resolveu permanecer somente com a formação feminina.
Desta forma, um repertório foi desenvolvido e, de maneira gradativa, se tornou mais complexo e buscou respeitar o desenvolvimento de cada integrante e do coletivo. As mulheres do Matricária têm ensaios semanais, todas as terças à noite, e, ocasionalmente, apresentações, viagens e retiros. Além disso, tópicos sociopolíticos e culturais são discutidos nos encontros e acabam sendo levados ao palco, como, por exemplo, as falas ou declamações de poemas nas músicas. Tudo isso é possível graças ao respaldo e incentivo da Associação Cantalomba, que as auxilia em relação às questões financeiras, burocráticas e administrativas.
De acordo com a integrante Chandra Machado, o nome Matricária foi inspirado por ser um grupo de mulheres. “O nome traz aconchego, afeto e carinho que é sentido pelo feminino. Aconchegante e tranquilo como um chá de Matricária camomila, por isso pensei em utilizar este nome, para transmitir todo esse sentido de feminilidade e de carinho maternal”, explica. Por consequência, o autocuidado é um dos pontos centrais do grupo, fortalecendo o feminino, as lutas e ações das mulheres, na busca de valorizar e incentivar as minorias que são as mais vulneráveis no Brasil.
Quando as integrantes foram questionadas sobre o motivo de o grupo ser formado apenas por mulheres, a resposta foi que a chegada do público masculino limitaria a liberdade que foi se desenvolvendo nos encontros, que já eram tão leves e giravam em torno das vidas e necessidades das participantes, como mulheres, mães, artesãs, artistas, estudantes e coralistas. Principalmente sobre os tópicos psicológicos e íntimos relacionados ao feminino e às vidas das integrantes. Por isso, foi preferível manter somente com mulheres, e cantar um repertório que tenha significado para elas.
Para a jornalista e produtora cultural Cátia Cylene, adepta da agroecologia e economia solidária, cantar sempre foi e é um sonho da vida dela. “A formalidade e rigor dos coros tradicionais sempre me desanimou. No Matricária, me encontrei apoiada para aprender as técnicas do canto de forma acolhedora, entre afetos de mulheres que se encontram, trocam saberes e se fortalecem. Matricária é um sopro de vida ativa e bem-estar através da cultura”, revela.
A maioria das apresentações contém um repertório da música popular brasileira, acompanhada de violão, ukulele, flauta doce e teclado. Os convites para eventos são recebidos através das integrantes do grupo, que acabam sendo convidadas para apresentações mediante pessoas que as conhecem ou por meio das redes sociais do grupo de coral. Geralmente, o grupo discute se consegue comparecer nas datas e se tem possibilidade de locomoção até o local previsto.
Em 2022, participaram da Feira Internacional do Cooperativismo (Feicoop), com oficinas em algumas reuniões da economia solidária da região e com apresentações tanto na feira como na cidade de Santa Maria. Na maioria das vezes, são convidadas para congressos, saraus, atos e festividades nas escolas.
Entre as outras atividades realizadas pelas mulheres do Matricária, são feitos saraus para arrecadação de verba para a Associação Cantalomba, já que possui despesas mensais como uma entidade sem fins lucrativos de apoio à cultura local. E há, a cada trimestre, um retiro, em que o grupo passa um dia ou um final de semana junto, em algum local combinado, para ensaiar coletivamente e individualmente, além das discussões sobre diferentes pontos de vistas políticos e culturais e momentos de relaxamento e autocuidado, com a ioga e atividades distintas — como oficina de economia solidária, automaquiagem, arteterapia, musicoterapia, entre outras.
Chandra comenta que o grupo nunca sofreu preconceito pelo fato de ser composto só por mulheres, mas pelo posicionamento social e político, sim. “Dependendo do local que vamos nos apresentar, reajustamos o repertório, as falas, declamações e o figurino. O grupo tem sua identidade, mas também não queremos causar desconforto ou intrigas no público presente”, ressalta.
Jacinta Scalcon, mais conhecida popularmente como Tita, conta que a música para ela é pura teimosia. Nasceu em um berço cujo sistema dizia que música é coisa para quem não tem o que fazer. Buscou sua independência, mas a arte e música a puxavam. Nas primeiras peças, revela que parecia estar fazendo algo proibido. Percebeu com a caminhada que a cena se repetia na vida de muitas pessoas. E esse foi o seu maior desafio. Enquanto estava sendo testada, a vida lhe mostrava que não estava sozinha.
Por fim, Tita evidencia o quanto a música é importante coletivamente e ativa laços confiáveis de amizade. “No fazer musical, tu és convidado o tempo todo a se colocar, a se olhar, a se conectar com o outro e, juntos, avançar. É saber que cada um tem um papel importante. Vai perceber a grandeza das sete notas musicais responsáveis por infinitas melodias, com um universo de possibilidades que nos convida a entrar no compasso e a escutar para fazer. O resultado? É harmonia, pura harmonia. Algo que é necessário muito esforço aí fora para aprender”, completa.
No momento com sete integrantes, o grupo Matricária está aceitando novas participantes que estejam dispostas a se comprometer com o coral e alinhadas na forma de viver. Querem fechar em no máximo 13 integrantes, pois a locomoção para as apresentações é complicada com grupos maiores.