Juliana: "É importante priorizar o orçamento para a área educacional"

Dentro da série de entrevistas com concorrentes à prefeitura de Porto Alegre, a Beta Redação conversa com Juliana Brizola, do PDT

Juliana Coin
Redação Beta
9 min readNov 4, 2020

--

Juliana Brizola, candidata pelo PDT. (Foto: Arquivo pessoal/Divulgação)

Formada em Direito pela Universidade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro, a concorrente ao executivo municipal pelo PDT também possui mestrado em Ciências Criminais pela PUC do Rio Grande do Sul. Na sua trajetória política, foi eleita vereadora em 2008, tendo a maior votação do PDT à época. Atualmente, é deputada estadual.

Desde a campanha de 2010, quando se elegeu para a Assembleia Legislativa pela primeira vez, Brizola tem a bandeira da educação como um de seus mais importantes pilares de campanha. De lá para cá, aprovou uma Emenda Constitucional Estadual transformando o projeto da Escola de Tempo Integral em um projeto de estado, o que obriga a sua implantação.

A entrevista com Juliana para a cobertura especial das Eleições 2020 foi produzida pela Beta Redação com suporte institucional da Unisinos. A pauta teve a colaboração da comunidade universitária, que, em consulta por meio virtual, apresentou 22 sugestões de perguntas, das quais cinco foram selecionadas e editadas para apresentação a todos os candidatos.

Confira a seguir a entrevista, concedida por telefone no dia 21/10.

De que forma a senhora vai lidar com a crise fiscal, uma vez que a prefeitura precisou ter gastos não previstos causados pela pandemia em 2020?

Nós temos um projeto bem audacioso de desenvolvimento municipal, em condições similares ao que propõe Ciro Gomes como modelo para o desenvolvimento nacional, com o incremento daquilo que a gente entende que a prefeitura de Porto Alegre precisa para investir mais em saúde, em educação e segurança. E a gente quer fazer um grande plano de obras públicas, um setor que emprega muito. Assim, vamos conseguir gerar emprego, renda e mais arrecadação para cobrir esse déficit.

“ Nós queremos não só valorizar o servidor público como pretendemos gerar emprego, renda e mais arrecadação para a prefeitura”

O projeto do atual prefeito ataca o serviço público, com a venda de patrimônio, não cuidando do crescimento da economia de Porto Alegre que está estagnada desde 2014. Em uma outra lógica, nós queremos não só valorizar o servidor público como, com este plano de obras públicas, pretendemos gerar emprego, renda e consequentemente mais arrecadação para a prefeitura

A senhora prevê um atendimento especial para empreendimentos do 4º Distrito na sua proposta de governo. Pensando nas pessoas que vão frequentar esses empreendimentos, de que forma pretende implementar ações de segurança na região?

Estamos propondo a realização de uma parceria com o Estado para treinamento e qualificação da Guarda Municipal pela Brigada Militar e pela Polícia Civil. A gente entende que eles têm toda a expertise para qualificar nossa Guarda Municipal. E um outro aspecto é que estudamos bastante também: eu fiz um mestrado em ciências criminais, me aproximando de pessoas que pensam na segurança pública.

“Queremos fazer uma parceria com as câmeras privadas que existem na frente de farmácias, bancos, condomínios para receber imagens em tempo real”

Sabemos que o efetivo municipal é muito importante, mas também entendemos a importância das pessoas que pensam a segurança todos os dias. E aí surgiu a ideia de uma integração. Hoje, existe um centro integrado de câmeras de Porto Alegre [o Centro Integrado de Comando da Cidade de Porto Alegre — CEIC], que conta com a Brigada Militar e com câmeras da Prefeitura. Queremos fazer uma parceria com as câmaras privadas que existem na frente de farmácias, bancos, condomínios, e, assim, receber imagens em tempo real para monitoramento. Essa parceria se basearia no seguinte: quem quisesse aderir poderia negociar um desconto no IPTU. Isso aumentaria a abrangência do monitoramento na cidade, e o Quarto Distrito está incluído nisso.

Claro, na outra ponta, desenvolver política pública nas comunidades carentes. A gente sabe que segurança pública também é isso, é geração de emprego, renda, e escola pública.

Porto Alegre enfrenta uma crise econômica que foi acentuada pela pandemia e que causou o fechamento de diversas empresas. Prevendo uma crescente retomada das atividades em 2021, quais serão os incentivos que a senhora irá propor aos micro e pequenos empreendedores para reabertura e manutenção de seus negócios?

Só conseguiremos melhorar a arrecadação do município se investirmos mais em educação, saúde e segurança, se melhorarmos a atividade econômica. Já disse antes: a economia está estagnada desde 2014 e o atual prefeito não pensou em melhorar a atividade econômica, aí vem uma pandemia e piora tudo muito mais.

Nós entendemos que é preciso promover justiça tributária. E justiça tributária significa que quem ganha mais paga mais, quem ganha menos paga menos. O primeiro projeto é o plano de obras públicas para melhorar a situação, gerar mais postos de trabalho, mais renda e, consequentemente, mais arrecadação.

“É preciso promover justiça tributária, que significa que quem ganha mais paga mais, quem ganha menos paga menos”

Além disso, também pretendemos investir na economia local, fomentando o comércio através do incentivo direto do poder público. A nossa gestão propõe comprar parte da merenda escolar da própria comunidade, como, por exemplo, o pêssego, da comunidade da Vila Nova. E também os próprios uniformes escolares, que devem ser adquiridos da produção local, das costureiras locais.

Há uma crise na saúde pública municipal. Em 2019, 1,8 mil funcionários do Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família (Imesf) foram demitidos. Nesse contexto, como seria aplicada a sua proposta de expandir gradativamente o horário de funcionamento de todas as UBS?

Nós pretendemos fazer concurso público para área da saúde. O Imesf foi considerado ilegal, ou seja, é uma questão jurídica, não é vontade minha. Mesmo que quisesse, não poderia recuperar o Imesf porque o Supremo Tribunal Federal já julgou que é ilegal.

“Temos que ter médicos do município, agentes da saúde do município, porque saúde é uma questão de estado”

Nós entendemos que a carreira de saúde deve ser uma carreira pública. Temos que ter médicos do município, agentes da saúde do município, porque saúde é uma questão de estado. Não pode ser delegada à iniciativa privada. Nós não somos favoráveis a terceirizações. Pretendemos fazer concursos públicos [para ampliar o número] de profissionais e, desta maneira, conseguir manter os postos que já estão abertos até as 22h, prevendo a ampliação para 100% das unidades.

Na sua proposta de governo, a senhora propõe incrementar a construção de unidades habitacionais e lotes urbanizados para pessoas negras, o que pode ser interpretado como segregação racial. Quais as razões para a criação desses lotes nesse modelo?

Há mais de 30 anos não há diagnóstico sobre o déficit de habitação na cidade de Porto Alegre. Temos muitos moradores irregulares e entendemos que a política habitacional é algo que trata da dignidade das pessoas. E o que a gente vê é que, para essa política habitacional, o maior déficit é com a população negra. Queremos fazer um grande diagnóstico sobre a questão habitacional para, em primeiro lugar, poder ver onde a gente vai começar, qual é a região mais carente. Mas a gente já percebeu que os negros são os mais atingidos.

Assim, eu não vejo como falar em segregação racial sem política pública para a população negra. A segregação racial vem justamente ao contrário, não é dizer que quem é branco não vai ter política pública para a questão habitacional, pois também vai ter. Mas como é uma política efetiva, ela vai acabar atingindo primeiro os negros porque eles são a maioria.

QUESTÕES DA COMUNIDADE UNIVERSITÁRIA

Caso fosse prefeita durante a eclosão da pandemia do novo coronavírus, o que teria feito igual ou diferente das decisões do atual governante?

Eu entendo que, provavelmente, Porto Alegre não teria ficado tanto tempo na bandeira vermelha se tivesse disponibilizado atendimento nos três hospitais que o atual prefeito resolveu manter fechados: o Álvaro Alvim, o Parque Belém e a parte do SUS do Beneficência Portuguesa. Isso é o que eu vejo de imediato, porque o próprio prefeito se deparou com algo novo também. E entendo que, em muitos momentos, ele teve uma posição firme em relação ao isolamento, afinal de contas, a vida está em primeiro lugar. Isso se deu no mundo inteiro.

Ainda assim, eu vejo que ele errou nisso, que poderia ter ampliado o número de leitos, já que era uma das formas para se fazer os cálculos [que compunham] a definição das bandeiras de restrição. [Com essas medidas] eu acredito que teríamos ficado menos tempo na bandeira vermelha, o que prejudicaria menos a economia de Porto Alegre.

Qual sua proposta para enfrentar a crise que estamos vivendo no transporte público?

Hoje, o que a gente sabe é que a passagem é cara, o serviço prestado é ruim, a população de Porto Alegre é mal atendida. Por outro lado, os empresários dizem que não têm como baixar [o preço] da passagem, que precisam de subsídios da prefeitura para manter o transporte público rodando. Então [é necessário] diálogo, porque a situação do transporte é ruim.

A primeira proposta é devolver a Câmara de Compensação Tarifária para a administração da prefeitura, o que hoje está apenas na mão das empresas de transporte público. Uma outra proposta que consideramos importante melhorar é a integração do transporte coletivo de Porto Alegre com o transporte da região metropolitana.

Porto Alegre tem um grande número de pessoas em situação de rua. Como pretende tratar dessa questão?

A gente sabe, desde o ano passado, que houve um aumento grande da população de rua, e que segue aumentando bastante. A pandemia mostrou a realidade do nosso país, da nossa cidade, para todo mundo ver. Nós temos que tratar com diferença os moradores de rua, porque tem aqueles que acabaram de passar a essa situação porque não têm emprego, porque não têm renda, [porque] ficaram desempregados. Tem também os que já estão vivendo há anos na rua. Nós queremos fazer uma grande conexão revitalizando as redes de assistência social que hoje estão muito precarizadas, como os próprios albergues.

"A pandemia mostrou a realidade do nosso país, da nossa cidade, para todo mundo ver"

Pensamos também em fazer um recadastramento dessas pessoas. [Colocar] equipes da prefeitura na rua, conversando para buscar saber há quanto tempo aquela pessoa vive nessa condição, se ela chegou agora por conta da pandemia, se toparia fazer parte de uma política habitacional ou se aceitaria ir para um abrigo. Eu acho que a melhor política de assistência social é gerar emprego e renda, porque a gente vai tirar da rua a maior parte das pessoas. É claro que eu sei que existem pessoas que estão nessa condição há bastante tempo e que talvez nem queiram mais sair, mas sei que essas são poucas.

A questão de emprego e renda é a melhor forma de fazer assistência social. Mas a prefeitura não pode abrir mão dessa rede de assistência que são os albergues, o acolhimento, de dar dignidade para essas pessoas.

Quais as suas prioridades para a rede municipal de ensino e como planeja, no cenário da pandemia, o retorno às aulas em 2021?

Em relação à educação, nós pretendemos ​resgatar aquilo que Porto Alegre já foi ​nos tempos de Brizola. [Vamos fazer isso] a partir de três eixos: investimento maciço na Escola de Tempo Integral, na ​implementação do Programa Nenhuma Criança Sem Creche​, e com a ampliação do horário das creches e da ​creche noturna, permitindo que as mães possam ter um trabalho formal.

"Propus a utilização do sinal aberto de rádio e televisão para veiculação de conteúdo educacional durante períodos de isolamento social"

Para uma retomada gradual das aulas, de forma híbrida, proponho que os alunos tenham acesso à grade escolar pela TVE e pela FM Cultura, já que a maioria não tem acesso à internet em Porto Alegre. Um dos projetos que eu propus na Assembleia é o PL 90/2020, que estabelece a utilização do sinal aberto de rádio e televisão para veiculação de conteúdo educacional durante períodos de isolamento social.

Como pretende lidar com o problema da falta de vagas nas creches municipais?

É uma prioridade para nós. Não é possível que Porto Alegre fique fora da lei quando não garante 100% de vagas em creche para todas as crianças, sobretudo aquelas que legalmente têm esse direito. Isso vai ser uma questão que nós vamos priorizar no orçamento. Não há mágica: para conseguir colocar as crianças na creche precisamos investir, precisamos aumentar o número de escolas, precisamos de projetos de construção para novas unidades. Também, se possível, aumentaremos o número de conveniados.

"Eu lembro que quando o meu avô foi governador do Rio de Janeiro ele investiu 43% do orçamento do Estado na educação"

Isso tudo vai ser feito através da priorização do orçamento para a área educacional. Eu lembro que quando o meu avô foi governador do Rio de Janeiro, ele investiu, ao longo do seu governo, 43% do orçamento do Estado na educação. É isso que nós pretendemos: priorizar o orçamento na questão educacional relacionada às creches. E, é claro, investir o próprio dinheiro do FUNDEB, que agora não vai mais poder ser usado para pagar aposentados. Tem lá 5% para educação infantil e nós vamos garantir que esse dinheiro vá exclusivamente para essa modalidade, assim como vamos priorizar no próprio orçamento da prefeitura um investimento em creches para que se garanta que não faltem vagas para nenhuma criança na cidade de Porto Alegre.

--

--

Juliana Coin
Redação Beta

Tentando inserir um pouco de realidade num universo de fake news.