Lei Aldir Blanc embala música durante a pandemia

Artistas encontram no incentivo uma fonte de esperança para manter o trabalho e levar cultura ao público

Beta Redação
Redação Beta
5 min readJul 3, 2021

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Por Elias Vargas, Tynan Barcelos, Luana Ely Quintana e Cesar Weiler

Aldir Blanc Mendes, letrista, compositor e cronista brasileiro, foi um dos primeiros artistas que faleceram por conta da pandemia da Covid-19, no Brasil. Ele quem dá nome a uma das leis de incentivo à Cultura que vem dando fôlego para os projetos sem apoio. A lei, aprovada em junho de 2020, é um alento aos artistas que batalham pelas chances de crescer em meio a pandemia. Mas, muito mais que isso, os artistas são agentes fundamentais na melhoria de aspectos sociais.

O atual governo do Brasil, de Jair Bolsonaro, extinguiu o Ministério da Cultura. Na verdade, inclusive, a Secretaria de Cultura, foi incluída na pasta do Ministério do Turismo. Isso reflete a diminuição do interesse de governos brasileiros no investimento no setor. Porém, com alguns projetos, como a Lei Aldir Blanc, os artistas que trabalham com a área da música estão conseguindo se manter na ativa.

A Beta Redação conversou com artistas de diversas regiões do Rio Grande do Sul que foram contemplados com a Lei Aldir Blanc e quais os seus anseios e perspectivas para o futuro. Algumas das histórias incluem projetos sociais e ativismo tendo foco na comunidade e na ampliação da cultura local.

Batucada com responsabilidade social

Um dos projetos beneficiados com a Lei Aldir Blanc, no valor total de R$ 15 mil, é o Batuco Educo, uma arte que resgata a cultura negra através da música. Ele nasceu das inquietações e implicações socioeconômicas de um jovem acadêmico de baixa renda do Morro da Polícia, em Porto Alegre. Há 15 anos, o projeto, na forma de oficina popular, ajuda a combater a criminalidade e a vulnerabilidade nas comunidades menos favorecidas, onde o percentual de jovens e crianças negras atingidas é maior. O Batuco Educo utiliza a música como ferramenta de ajuda de crianças e adolescentes em risco de vulnerabilidade social.

Juventude envolvida com o projeto Batuco Educo. (Foto: Arquivo pessoal/Facebook)

O criador do projeto é o professor Everton Barbosa, licenciado em Educação Física pela Unilasalle, com extensão em música pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), além de músico profissional. “Apesar do Batuco Educo ater-se à ferramenta música, o foco do projeto está na primeira pessoa, ou seja, no sujeito. O mais importante é fazer do educando, e de seu jeito de ser, o protagonista de uma nova história”, comenta.

A iniciativa, segundo ele, “tem por finalidade o resgate da autoestima, do contexto da arte e da cultura negra brasileira, reinventando-se através da música, bem como do som do cavaquinho, do tocar violão, do fazer batuque em latas e tonéis.” “É uma nova história no âmbito social e escolar, contada, cantada e tocada por quem faz sua própria trajetória promissora”, completa.

Para Everton, a busca por melhorias de qualidade de vida nas camadas menos favorecidas leva a uma reflexão sobre os recursos e leis de incentivo à cultura. “Conseguimos este ano, porém os projetos sofrem reajustes de custo na execução do projeto orçado. Dessa forma, os recursos são insuficientes diante da situação enfrentada nesse atual período de pandemia e instabilidade financeira do Brasil”, lamenta.

Lei de incentivo possibilita ‘live’ e ‘single’ na Serra

Na Serra, mais precisamente em Garibaldi, há outro exemplo de projeto viabilizado com a lei de incentivo. A compositora, violonista e cantora Lela Rosanelli, 28 anos, utilizou o recurso da Lei Aldir Blanc, no final de 2020, para produzir o videoclipe do seu single Nós. A música já havia sido gravada antes do repasse, de forma independente.

Além de produzir alguns covers em seu canal no Youtube, Lela tem músicas autorais, dentre elas, “Recordações”, gravada em parceria com o músico gaúcho Duca Leindecker. (Foto: Arquivo Pessoal/Lela Rosanelli)

Além disso, a artista participou diretamente de outros dois projetos que receberam repasses da Aldir Blanc. Um deles foi o recital em formato de live, produzido e organizado pela escola de educação musical Harmônica Ensino de Música, onde Lela é sócia. E o outro projeto foi o seu próprio single, I Never Know What To Say, em parceria com a produtora artística Kissa Braga, que foi a beneficiada do repasse.

A artista fez uso somente do repasse municipal da Lei Aldir Blanc, destinado ao fomento de projetos culturais locais. “Não fiz o uso das três parcelas de R$ 600 reais [do auxílio à classe artística], porque, além de ter carteira assinada e vínculo empregatício, entendo que existam outras pessoas que precisam mais do que eu”, explica.

Apoio ao Hip Hop no Vale do Sinos

Uma dupla que espalha a cultura do Hip Hop também foi beneficiada com a Lei Aldir Blanc. O grupo Além dos Muros, formado por Wesley Sales e Diego Ignácio, de Campo Bom, no Vale do Rio dos Sinos, está na ativa desde 2011. Eles levam o Hip Hop às escolas através de oficinas com B-boy’s, grafiteiros, DJ’s e MC’s. O grupo é dividido em três pilares, sendo eles: Artístico, com as músicas que produzem; Ativismo Social, com as oficinas, projetos sociais, participação dos conselhos através da Nação Hip Hop Brasil, organizando movimentos culturais em Campo Bom; e Solidariedade, com o Futebol Solidário, que arrecada roupas, alimentos e materiais escolares para ajudar a população carente do Vale do Sinos.

As letras das canções de rap são denúncias da exclusão social e cultural, da violência policial e da discriminação racial, constituindo-se de longas descrições do dia-a-dia de jovens que vivem nas periferias de centros urbanos. Ambos artistas possuíam carreira solo, mas decidiram se juntar, justamente para contar a história de discriminação vivida por um dos integrantes.

A dupla leva o Hip Hop para as escolas. (Foto: Vanderlei Gomes/Contra Mídia)

Antes da pandemia, o grupo estava apenas começando a trabalhar o seu lado artístico, pois sempre trabalharam mais com o ativismo social dentro da cultura Hip Hop, com trabalho voluntário. “Nós fizemos uma apresentação com a orquestra Eintracht, no Natal da Integração de Campo Bom, realizamos alguns shows pela região, e aí parou tudo. Nós ficamos desde o começo da pandemia até o mês de agosto de 2020 sem fazer nada”, diz o rapper Wesley Sales.

Wesley destaca a importância que a Lei Aldir Blanc tem dentro da cultura, pois ela consegue valorizar todos os tipos de artistas, desde a pessoa que trabalha na sinaleira com seus malabares, até o artista mais renomado. “Quando falamos em cultura, não falamos somente de quem está em cima do palco, ou cantores, atores, artesãos, artistas circenses etc.”, expressa. “A gente diz respeito a toda história de uma comunidade, de um povo. Porque a cultura nada mais é do que a história de uma comunidade sendo evidenciada.”

O Além dos Muros foi contemplado em dois editais, de R$ 10 mil e de 2,5 mil, da Lei Aldir Blanc. “No primeiro edital a gente fez um trio elétrico pela cidade, colocamos artistas para tocar pagode, Hip Hop, sertanejo e pop juntos, e passamos por sete ou oito bairros. No outro edital, fizemos uma live com sertanejo, samba, hip hop etc.”, explica Wesley.

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A Beta Redação integra diferentes atividades acadêmicas do curso de Jornalismo da Unisinos em laboratórios práticos, divididos em cinco editorias.