Manuela: "Porto Alegre foi governada por homens 44 vezes. Eu quero ser a primeira prefeita"

Dentro da série de entrevistas com concorrentes à prefeitura de Porto Alegre, a Beta Redação conversa com Manuela d'Ávila, do PCdoB

Carol Steques
Redação Beta
6 min readNov 4, 2020

--

Manuela D’Ávila disputa a prefeitura pelo PCdoB. (Foto: Danilo Christidis/Divulgação)

Manuela d’Ávila está concorrendo à prefeitura de Porto Alegre pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), ao lado de Miguel Rossetto, candidato a vice-prefeito, filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT). Manuela começou a sua trajetória no movimento estudantil em 1999, e foi a vereadora mais votada e mais jovem da capital gaúcha, em 2004, além de ter sido eleita duas vezes deputada federal (RS) e estadual ao longo de sua trajetória política. Nas eleições de 2018, concorreu ao lado de Fernando Haddad (PT) a vice-presidente da República. Atualmente, ela aparece em primeiro lugar em todas as pesquisas à prefeitura da cidade.

Mestra em Políticas Públicas, Manuela — mãe de Laura, de 5 anos — é autora dos livros Revolução Laura, Por que lutamos? Um livro sobre amor e liberdade” e “E Se Fosse Você? Sobrevivendo às redes de ódio e fake news”. Com 20 anos de militância e 14 anos de mandatos parlamentares, Manuela luta por uma cidade inclusiva e democrática, onde as mulheres possam andar na rua sem medo, contra o racismo e a discriminação, pela descentralização da cultura, em defesa da população e por um país desenvolvido.

A entrevista com Manuela para a cobertura especial das Eleições 2020 foi produzida pela Beta Redação com suporte institucional da Unisinos. A pauta teve a colaboração da comunidade universitária, que, em consulta por meio virtual, apresentou 22 sugestões de perguntas, das quais cinco foram selecionadas e editadas para apresentação a todos os candidatos.

Confira a seguir a entrevista, concedida por escrito, via WhatsApp, no dia 22/10.

O plano de governo da sua campanha pretende “fazer da cultura a marca de Porto Alegre — da economia criativa, da diversidade cultural, da cultura como cadeia produtiva e desenvolvimento econômico”. Como a senhora vai apoiar o setor cultural após a pandemia, considerando ter sido um dos setores mais atingidos pela crise sanitária?

Nós temos um programa relacionado ao orçamento para a cultura, que foi escanteado pela atual gestão. Acreditamos que podemos chegar à 2% do orçamento e isso tem um impacto real no setor. Cultura não é só a peça em cartaz, tem muita coisa envolvida. Precisamos reformatar os fundos. Porto Alegre tem três fundos da cultura que foram desabastecidos, nós queremos chegar nos 2% garantindo que esses fundos voltem a funcionar.

"Cultura não é só a peça em cartaz, tem muita coisa envolvida"

Porto Alegre é uma cidade de serviços, precisa ser atrativa para o turismo, precisa ter restaurantes com música, teatros em funcionamento e opções de lazer. Podemos recuperar nossos espaços com participação popular e gestão compartilhada e colaborativa.

Como a senhora pretende fazer com que a cultura e a educação cheguem de forma ampla na periferia? Quais os projetos para integrar as comunidades de baixa renda?

Nós vamos apoiar os espaços culturais, as bibliotecas públicas e comunitárias, oficinas e laboratórios de inovação social nas periferias. Queremos promover a cogestão com ampla participação dos espaços e equipamentos culturais de Porto Alegre com os agentes da cultura e fazer parcerias público-comunitárias, utilizando prédios e equipamentos públicos ociosos para atividades culturais e criativas, envolvendo também escolas e praças da comunidade, com foco na descentralização da cultura.

A senhora defende uma Porto Alegre mais colaborativa e solidária. Sendo prefeita, como irá inserir a população nos projetos políticos da cidade?

Queremos fazer uma cidade democrática, retomando o Orçamento Participativo (OP), restabelecendo a participação popular e recompondo os conselhos setoriais e temáticos. Teremos uma prefeitura presente nos locais, despachando dos bairros e tendo um contato direto com as pessoas e seus problemas.

"Teremos uma prefeitura presente nos locais, despachando dos bairros e tendo um contato direto com as pessoas"

Vamos retomar o diálogo com servidores e servidoras, valorizando o quadro funcional. A prefeitura comunitária vai aproximar a administração das regiões da cidade, descentralizando a gestão e otimizando a prestação de serviços públicos.

De acordo com dados da OXFAM, em média 75% do trabalho de cuidados não remunerados no mundo é feito por mulheres. No seu plano de governo, é citada a “Cidade das Mulheres”, com propostas que vão do incentivo no mercado de trabalho à política de saúde. Qual a importância para a capital ter uma mulher como prefeita da cidade?

Porto Alegre foi governada por homens 44 vezes. Eu quero ser a primeira prefeita da nossa Capital para retomar o encontro da cidade com as pessoas. Porto Alegre é construída por mulheres em todos os espaços de luta, eu quero ser prefeita porque acredito nesse encontro da cidade com o povo, com quem cuida daqui.

Quando falamos em uma cidade boa para mulheres, isso quer dizer uma cidade boa para todo mundo. Uma cidade que podemos andar na rua sem medo, que não soframos machismo, que o trabalho seja valorizado, com igualdade, creche para as mães deixarem suas crianças, espaços de cultura e entretenimento: uma cidade inclusiva.

Desde as eleições de 2018, a polarização esquerda-direita parece ter se ampliado no país. Como a esquerda pode se fortalecer e se desassociar dos estereótipos ressaltados pelas fake news como, por exemplo, as questões ideológicas ressaltadas pela ideia de comunismo expressa no próprio nome do seu partido?

É importante que a própria questão identifica de onde vêm as fake news. Fui e sou alvo de fake news desde 2018 e escrevi um livro, E Se Fosse Você, relatando o que é ser alvo desta turma. E ressalto: desde que assumi a liderança nas pesquisas, voltei a ser alvo do gabinete do ódio. Podemos nos organizar, sem perder o foco, sem deixar nos intimidar e com propostas, falando dos temas da cidade.

QUESTÕES DA COMUNIDADE UNIVERSITÁRIA

Caso fosse prefeita durante a eclosão da pandemia do novo coronavírus, o que teria feito igual ou diferente das decisões do atual governante?

Teria implementado uma política de testagem. Os países que tiveram mais êxito no combate à pandemia foram aqueles que testaram. Nossa cidade sequer testou os profissionais de saúde, eles só foram testados quando tinham sintomas, gerando risco e instabilidade.

As medidas de isolamento são necessárias, mas devem vir com testagem. Além disso, a prefeitura deveria ter planos voltados aos microempreendedores, como adiar o aumento do IPTU 2021 para o fim do ciclo, já que esse setor foi profundamente afetado pela pandemia.

Qual sua proposta para enfrentar a crise que estamos vivendo no transporte público?

Nossa cidade já teve o melhor transporte público do país, mas desde 2012 vem perdendo viagens — situação que se agravou na pandemia. Nós queremos fazer com que o transporte público seja rápido, seguro, com qualidade e mais barato. Vamos retomar a gestão pública no transporte e assumir a Câmara de Compensação Tarifária, por meio da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), como manda a lei.

“Nós queremos fazer com que o transporte público seja rápido, seguro, com qualidade e mais barato”

Também faremos uma revisão da planilha de cálculos da tarifa e constituiremos um fundo municipal de mobilidade, que reunirá recursos para redução do preço da passagem. A Carris terá um papel fundamental no nosso governo, com um novo modelo, garantindo equilíbrio fiscal e inovações.

Porto Alegre tem um grande número de pessoas em situação de rua. Como pretende tratar essa questão?

Vimos, nos últimos anos, o desmonte da Fundação de Assistência Social e Cidadania (FASC) e a população vulnerável ficar desassistida. Nós vamos instituir o Plano Emergencial de Assistência Social para apoiar a população em situação de risco, também ampliaremos o número de albergues e abrigos e a concessão de aluguel social. Vamos criar centros integrados de atendimento para as pessoas em situação de rua e consolidar a rede de acolhida. Também é fundamental promover novas oportunidades de trabalho aliando município, empresas e entidades.

Quais as suas prioridades para a rede municipal de ensino e como planeja, no cenário da pandemia, o retorno às aulas em 2021?

Vamos dialogar com a comunidade escolar para estruturar o retorno das aulas e a recuperação dos dias perdidos. Faremos gestão democrática. Vamos investir no contraturno e turno integral para o reforço escolar nas escolas municipais e na rede conveniada. Teremos oferta de regime para os professores completarem o quadro de 40 horas e a contratação emergencial de 30% do quadro de professores e monitores escolares. Um ponto igualmente importante para nós é a garantia de acolhimento emocional, alimentação e assistência para as famílias mais vulneráveis.

Como pretende lidar com o problema da falta de vagas nas creches municipais?

Nós sabemos das batalhas diárias das mães na busca por creches para seus filhos e filhas. Vamos preparar a extensão da rede própria, começando com uma política de conveniamento emergencial da educação infantil. Além disso, garantir vagas públicas com qualidade e controle social nas escolas conveniadas e cumprir a lei: 100% das crianças de 4 a 5 anos matriculadas.

--

--