Menos de 4% das cadeiras na Câmara de Campo Bom foram ocupadas por mulheres até hoje

Apesar da maioria feminina entre o eleitorado, poucas mulheres são eleitas para cargos políticos no município

Émerson Santos
Redação Beta
5 min readAug 27, 2020

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Maria do Carmo da Silva, Celene Íris Adam Thoen, Maria Marlene Bett e Sandra Carina Haag Orth. Você sabe o que essas quatro mulheres têm em comum? Foram as únicas mulheres eleitas pelo voto popular em toda a história das eleições de Campo Bom, município do Vale do Rio dos Sinos emancipado em 1959 — todas vereadoras.

De acordo com os registros do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RS), foi apenas em 1976 que mulheres passaram a figurar entre as candidaturas do pleito municipal. De quebra, foram duas — entre 48 que disputaram 11 vagas na Câmara. Maria do Carmo da Silva e Joyce Lane Adams, à época filiadas ao extinto partido político Arena, foram as pioneiras. Maria foi eleita após conquistar 287 votos, nona maior votação entre os candidatos daquela eleição.

Na história do município, 145 cadeiras foram disputadas na Câmara de Vereadores, mas somente cinco foram ocupadas por mulheres. Depois de Maria do Carmo, escolhida pelos campo-bonenses para duas legislaturas, 1977 a 1983 e 1983 a 1988, foi Celene Thoen, à época filiada ao PDS, que assumiu o dever de representar as mulheres na política campo-bonense. A ex-vereadora, falecida em 24 de outubro de 2018, ficou na Câmara entre 1989 e 1992. A terceira mulher a ocupar uma cadeira na Câmara de Campo Bom foi Maria Marlene Bett, eleita em 2004, pelo PSB. Depois dela, apenas Sandra Orth, eleita em 2016, pelo PSDB. “Ser a quarta mulher eleita na cidade de Campo Bom, além de muito orgulho, traz muita responsabilidade”, afirma a atual vereadora.

Um espaço que vai homenagear e lembrar essas mulheres está para ser inaugurado na Câmara Municipal. “A Galeria 8 de Março contemplará, com fotos e nomes, todas as mulheres que já exerceram mandato legislativo”, informa Cássios Diogo Schaab, coordenador de comunicação social da Câmara. Além das ex-vereadoras e da atual parlamentar, a Galeria estará preparada para receber as próximas mulheres eleitas ao Poder Legislativo campo-bonense. A inauguração deve ocorrer ainda este ano, após adiamentos ocasionados pela pandemia de Covid-19.

Maioria do eleitorado é feminino

Os números são baixos e impressionam ainda mais quando descobrimos que desde 2002 as mulheres são maioria entre os eleitores campo-bonenses, segundo registros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Hoje, 52,27% do eleitorado municipal é feminino — 27.183 dos 52.005 eleitores aptos a votar.

Mas o que é preciso fazer, então, para que as mulheres se tornem maioria também entre os representantes da política municipal? De acordo com a vereadora Sandra Orth, precisamos ter mais mulheres na disputa eleitoral. “Os líderes partidários deveriam acreditar na capacidade das mulheres e permitir que se preparassem para a eleição”, diz.

Entre os parlamentares da atual legislatura, apenas uma mulher, Sandra Orth. Foto: Divulgação/Câmara de Vereadores de Campo Bom

Jovens eleitores também entendem que há poucas mulheres na política da cidade, indo ao encontro do que comentou a vereadora Sandra. “Acho que há poucas mulheres na política porque desde pequenas não nos é apresentado como um lugar feminino. É muito mais fácil ver um menino com a aspiração de se tornar político. Não nos dão chances e somos desencorajadas por isso”, afirma a estudante campo-bonense Eduarda Da Cas Huebner, 21 anos, que em novembro votará pela primeira vez em eleições municipais. Sobre a importância de ver mais mulheres na política, Eduarda, que cursa Quiropraxia na Feevale, acredita que somente isso tornaria a sociedade capaz de respeitar e ouvir as mulheres.

Ainda um percentual

Em 2016, 33 mulheres foram registradas entre os 98 candidatos que disputavam as vagas no Poder Legislativo Municipal, ou seja, 33,7% das candidaturas eram de mulheres. É a Lei 12.034, de 29 de setembro de 2009, que exige isso, lembra a vereadora Sandra Orth. O parágrafo 3 do artigo 10 da lei em questão diz que: “Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”.

“Infelizmente ainda somos um percentual. Acredito que os partidos políticos procuram as mulheres apenas para completar seu quadro de candidatos”, lamenta a vereadora. Apesar disso, Sandra destaca a coragem das mulheres que aceitam esse espaço. “Vejo que a participação das mulheres, mesmo que pequena, vem repleta de garra e vontade de fazer a diferença. A cada ano estamos nos fortalecendo e garantindo nosso espaço, mostrando que temos qualificação e competência”, afirma.

Na prefeitura, somente homens

Nenhuma mulher foi prefeita da cidade até hoje e apenas duas disputaram o Poder Executivo Municipal. Nelcy Schroeder Orsi, mãe do atual prefeito Luciano Orsi (PDT), concorreu, em 1988, também pelo PDT. O pleito daquele ano foi vencido por Giovane Feltes (MDB) por vantagem de 908 votos, dos 22.569 totais. Em 2012, 24 anos depois, Suzana Ambros Pereira disputou a prefeitura pelo PT, mas perdeu para Faisal Karam, na época filiado ao MDB. Hoje ela é secretária da Saúde na gestão de Orsi e peça importante do combate à pandemia no município que, em março, registrou o primeiro caso de coronavírus no Estado.

Além disso, as eleições municipais de novembro devem colocar mais um nome nessa ainda pequena lista. Cleusa Nascimento, esposa do ex-prefeito Faisal, já confirmou pré-candidatura à prefeitura pelo Republicanos.

Um problema campo-bonense?

Apesar de ter uma das mais baixas representatividades na região — uma mulher entre 11 parlamentares — , o pequeno número de mulheres na política não é uma situação exclusiva de Campo Bom.

A Câmara de Vereadores de Novo Hamburgo tem apenas duas mulheres entre 14 vereadores. O município vizinho, entretanto, é administrado por uma mulher. Fátima Daudt (PSDB) é a atual prefeita hamburguense.

Sapiranga, por sua vez, tem só quatro mulheres em uma Câmara composta por 15 parlamentares. Ainda assim, os sapiranguenses também são liderados por uma mulher. Corinha Molling (PP) é prefeita reeleita no município.

Na Câmara de São Leopoldo, apenas três mulheres entre 13 vereadores. O município, que é o mais antigo da região, foi administrado por uma mulher uma única vez. Maria Emília de Paula, vereadora entre 1947 e 1955, assumiu a prefeitura da cidade em 1959 e se tornou a primeira prefeita do Rio Grande do Sul.

Em nível nacional o problema da representatividade feminina na política não diminui, mesmo que o eleitorado brasileiro seja também de maioria feminina, de acordo com os registros do TSE — 52,53%. Apenas uma governadora entre as 27 unidades federativas do país — Fátima Bezerra (PT), no Rio Grande do Norte. No Senado, 11 mulheres e 70 homens. Na Câmara dos Deputados, 76 mulheres e 437 homens.

A universitária Eduarda não aprova o fato de termos tão poucas mulheres na política, mesmo quando são elas as responsáveis pela maioria dos votos. “Não existe maneira melhor de uma mulher ser representada na política do que por outra mulher”, diz a estudante. Ela acredita que os direitos femininos só podem ser defendidos quando há alguém que sabe o que é ser mulher para defendê-los. “E, para isso, nada melhor do que uma mulher”, completa.

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