Mulheres lutam contra o preconceito no motociclismo

Maiara Basso é a primeira mulher a se tornar campeã brasileira em três modalidades: Enduro Fim, Motocross e Velocross

Ketlindesiqueira
Redação Beta
5 min readSep 13, 2021

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O amor pela moto veio ainda na infância, com o incentivo dos irmãos. (Foto: Arquivo pessoal/Maiara Basso)

A gaúcha Maiara Basso, 25 anos, é uma das principais pilotos de motocross do Brasil. Conhecida como Gringa, a piloto é do time Yamaha Monster Geração. A paixão por motos é herança de família, pois seus irmãos também praticam o motociclismo. “Tudo o que meus dois irmãos faziam, eu tinha que estar junto fazendo também. Nós sempre íamos assistir corridas na região então, em 2004, quando eu tinha 8 anos, meu irmão mais velho, Lucas, começou a fazer algumas trilhas. Foi então que comecei a brincar, mas andava somente em algumas provas e não levava a sério”, comenta.

Contudo, em 2009, Maiara decidiu competir no Gaúcho de Motocross e percebeu que tinha potencial para ser campeã. “Eu fiz uma corrida muito boa, liderei até o final, mas cai faltando duas curvas. Participar dos campeonatos se tornou um sonho. Foi então que, em 2010, comecei a me dedicar ao esporte, conquistando títulos e me divertindo muito”, destaca.

Maiara sonha em participar do Campeonato Mundial de Motocross. (Foto: Arquivo pessoal/Maiara Basso)

Atualmente, Maiara pilota uma YZ250 cilindradas no Brasileiro de Motocross e, quando corre com os homens, ela pilota uma YZ450 cilindradas. Seu sonho é participar do Campeonato Mundial de Motocross, mas ressalta que os gastos são grandes e que precisaria se doar totalmente ao esporte.

“Eu cursava agronomia, mas parei meus estudos em virtude de meus pais estarem, atualmente, morando no Maranhão. Era difícil conciliar as corridas e estar com eles. Além do motocross, trabalho com meus pais plantando soja. Gosto muito desse setor e, no ano passado, concluí o curso de piloto privado de avião, área na qual pretendo me aperfeiçoar nos próximos anos”, destaca Maiara.

Gringa destaca o motociclismo como um esporte que proporciona momentos inesquecíveis. “Os esportes são maravilhosos. Quem gosta ou quer começar, vá em frente, pois o mais importante de tudo é a gente se divertir, ter dedicação, determinação e garra de vencer”, conclui.

FGM cobra valor menor para o licenciamento de mulheres

A Federação Gaúcha de Motociclismo (FGM) conta com 620 homens filiados e apenas 17 mulheres. Segundo a entidade, há muitas mulheres competindo sem vínculo formal à FGM.

Par incentivar o motociclismo feminino, o presidente Jair Silveira Costa ressalta que a Federação cobra valores reduzidos para o licenciamento na classe Feminina.

O presidente destaca que, entre 2017 e 2019, houve um aumento significativo de mulheres associadas. “Vejo um aumento do motociclismo feminino e na presença delas nos campeonatos”, destaca.

Existe preconceito no motociclismo?

A piloto Maiara Basso, como as demais mulheres entrevistas na primeira reportagem sobre motociclismo, relata que já protagonizou momento de desconforto por ser uma mulher competidora.

Marca é piloto profissional desde 2011, mas atualmente compete em Portugal. (Foto: Arquivo pessoal/Márcia Reis)

A piloto profissional de Motovelocidade e Supermoto, Márcia Reis, 47 anos conta que nunca sofreu preconceito na motovelocidade, nem por ser mulher, nem pela idade, mas sim maldade por parte de alguns que não tem coragem de lutar pelos seus sonhos.

“No início, como não tinha experiência de pista, pois havia feito apenas um curso básico de pilotagem e nunca tinha andado com uma moto com preparação de pista e câmbio invertido, fui motivo de piada. Passava em frente aos boxes e ouvia risadas e comentários maldosos dizendo que eu ‘não andava nada’ e que não deveria estar ali. Nunca me importei, mantive a cabeça erguida e focada. Tive coragem e determinação, pois sabia que, com empenho, conseguiria aprender as técnicas”, comenta.

Quando Márcia anunciou que iria participar do Campeonato Nacional de Velocidade, em Portugal, ouviu vários comentários de que ela ‘nem conseguiria alinhar’ em um grid na Europa. No entanto, em seu primeiro ano na Copa Dunlop Motoval conquistou a terceira colocação. “Para mim, todos esses comentários sempre foram ‘combustível’”, destaca.

Angélica relata que ainda existe homens que não aceitam competir ao lado de mulheres. (Foto: Arquivo pessoal/Angélica Laimer)

Angélica Maria Laimer, 24 anos, corre na categoria feminina/230 cilindradas Light e VX3 Nacional ao lado dos competidores homens no Velorosss e também ressalta que, no começou de sua carreira, era alvo de piadas. Ela conta que prevalece a mentalidade de não aceitar mulheres na mesma categoria. “O medo deles eram em perder pra alguma garota. Patrocínio para mulher é mais difícil de conseguir. Tem sido uma luta pra nós, eu sou uma que defendo nossa classe e brigo bastante”, afirma.

Paola conta que nunca sofreu presencialmente uma discriminação, ma ficava chateada por não ter categoria feminina. ( Foto: Arquivo pessoal/ Paola Ceolin)

Outra piloto que destaca na luta contra o preconceito é Paola Notargiacomo Ceolin, 20 anos, da modalidade Velocrosss. Apesar de nunca ter sofrido alguma distinção escancarada, ela conta que existe uma violência silenciosa. “Quando ia nas competições e não tinha a categoria feminina, ficava desanimada e chateada”, conta.

Já a piloto Fernanda Manhabosco, 22 anos, da Motovelocidade categoria R3 teve experiência diferente das demais atletas. Ela destaca que sempre foi bem recebida e muito incentivada pelos outros competidores. “As pessoas sempre brincam comigo, ajudam, apoiam, e depois do meu acidente, sempre incentivaram pra que eu retornasse. Na escola que eu participo (Rad Racing School) sempre há incentivo pra mulherada que gostaria de iniciar, fazer cursos. Hoje já tem diversas mulheres participando, mas que, quando comparado a quantidade de homens, é menor”, diz.

Fernanda acredita que as maiores dificuldades estão do lado de fora da pista: família não apoiar, o deboche dos próprios amigos e conhecidos (…) É o que aconteceu comigo. Na questão de patrocínio, há muitas empresas que apoiam as mulheres. Eu já tive apoio da Motoryama (loja da Yamaha de Porto Alegre) diversas vezes”, conta.

Como Fernanda, Maiara não teve problemas com nenhum tipo de distinção, mas ela acredita que foi porque começou nova neste esporte. “Iniciei bem pequena no mundo offroad, a maioria dos pilotos me viram crescer. Porém, na minha cidade, Gentil(RS), que tem 2 mil habitantes, as pessoas acham loucura uma menina de 8 anos andar de moto. Mas nunca liguei para o que falavam e meus pais sempre me apoiaram muito. E assim deu certo”, destaca.

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