De olho nos crimes eleitorais

Beta Redação ouviu eleitores para saber se eles sabem identificar as infrações que prejudicam o processo democrático

Camila Tempas
Redação Beta
4 min readOct 29, 2018

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Código Eleitoral prevê penalidades a quem ferir o direito de livre escolha de cada eleitor. (Foto: Lisete Arelaro)

Algumas ações cometidas por eleitores e candidatos durante o período eleitoral são consideradas crimes, passíveis de penas aplicadas pelo Tribunal Superior Eleitoral. Mas quais ações são permitidas e quais são proibidas? Em duas cidades do interior do Estado — São Vendelino, com 2.136 eleitores, e Bom Princípio, com 9.895 votantes — , a Beta Redação conversou com cidadãos para saber se eles têm conhecimento sobre as infrações previstas na legislação eleitoral.

Para a pedagoga Cristina Maldaner, 30 anos, os crimes eleitorais são um assunto pouco disseminado entre a população. Ela sublinha que “o simples fato de ser coagido a votar um candidato já é um crime”. Adir Silva, 61, também destaca a compra de voto como um crime que acontece no período eleitoral. “Tu estás indo decidido em quem votar e chega a pessoa com o santinho te coagindo a optar por outro candidato”, explica.

Já a aposentada Maria Laci Stockmanns, 63, considera a boca de urna e a compra de votos os principais crimes eleitorais. Para ela, o fato de haver maior divulgação e disseminação de informação a respeito dos crimes eleitorais não mudaria a incidência de casos que envolvem esse tipo de infração. “Sempre teve e vai continuar tendo esse tipo de coisa, ainda que seja secretamente”, observa.

Além dos crimes eleitorais mais conhecidos entre a população, como boca de urna e compra de voto, o Código Eleitoral, dentro da Lei 4.737, prevê outros tipos de ações que se enquadram como infração. A legislação que instituiu o código data de 1965 e tem como principal objetivo proteger a cidadania de cada eleitor.

Tanto o candidato que ferir o direito de escolha quanto o eleitor que se deixar coagir estão sujeitos a sofrer penalidades. (Foto: TSE-RJ)

Para o cientista político Bruno Conceição, no começo do período de redemocratização, na década de 1990, o crime mais comum era a compra de voto. “Na história política brasileira, a compra de votos percorreu todo o século XX, passando do voto de cabresto (que consistia no eleitor ir para a urna intimidado a votar em candidatos designados pelos coronéis) até a deliberada aceitação de bens ou de dinheiro em troca de apoio, algo recorrente na democracia que vigorou de 1945 até 1964 e nas eleições feitas durante o regime militar. Com a redemocratização estabelecendo eleições periódicas, sem fraude e com o uso da urna eletrônica, esse legado de compra de votos ficou cada vez mais distante e raro no cenário político brasileiro”, explica.

Em 2016, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acrescentou alguns adendos ao Código Eleitoral. Entre eles, por exemplo, a proibição de panfletagem e propaganda junto às zonas eleitorais durante as eleições. Para Bruno, a prática de boca de urna era algo corriqueiro e folclórico do dia de votação. “Panfletos e coação de militantes partidários eram comuns e até mesmo ajudavam eleitores indecisos a escolherem seu candidato no caminho à seção eleitoral”, observa.

O cientista político sublinha ainda que essas medidas tiveram papel importante na educação cívica da população, que passou a entender esse tipo de atividade e ação como crime, porque violavam o direito de livre decisão de cada um. Bruno aponta também para o atual cenário que vivenciamos durante as eleições deste ano. “A atual eleição de 2018 segue o mesmo caminho das demais eleições. Está sendo um novo processo de educação cidadã ao refletir sobre os efeitos das fake news na reputação de candidatos e de partidos e nos possíveis efeitos geradores de ódio e violência na sociedade”, comenta.

Segundo o TSE, os crimes eleitorais devem ser comunicados ao juiz eleitoral responsável pela zona em que ocorreu o ato. O juiz é responsável por encaminhar a denúncia ao Ministério Público, que iniciará a investigação sobre o caso em até 10 dias. Para Conceição, nas grandes cidades os próprios eleitores ajudam na identificação de possíveis crimes eleitorais de boca de urna, e a polícia tende a estar presente nos arredores das zonas eleitorais para deixar os eleitores mais tranquilos. “Nas cidades do interior esses controles tendem a ser mais reduzidos ou ineficientes. Portanto, muitas cidades do interior, com eleitorado pequeno, passam despercebidas dos órgãos de fiscalização, dependendo de denúncias das candidaturas que são prejudicadas pelo crime de boca de urna para uma efetivação e julgamento desses crimes pela Justiça Eleitoral”, observa.

A cultura também acaba exercendo influência nesse contexto eleitoral, segundo Bruno. Para ele, a forma com que os eleitores das pequenas cidades se envolvem com a política pode, muitas vezes, naturalizar as práticas de boca de urna, por exemplo. “Nesses casos, a mudança na perspectiva sobre crimes eleitorais é mais demorada do que nos grandes centros urbanos, onde a informação do que é permitido ou não fazer durante a campanha trafega mais rápido”, explica. Além disso, Bruno acredita que uma mudança nesse sentido depende fortemente dos candidatos e partidos que devem se adequar às regras e participarem da conscientização da população.

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