Novas alternativas para enfraquecer vírus da dengue animam especialistas

Ainda assim, atual surto de casos e registro de mortes preocupa gestores da saúde

Arthur Mombach Schneider
Redação Beta
5 min readMay 4, 2022

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Por Arthur Mombach Schneider e Isaías Rheinheimer

Enquanto antiviral é objeto de pesquisa, eliminar possíveis criadouros do mosquito ainda é o melhor remédio (Foto: Karine Viana/Palácio Piratini)

Especialistas em virologia e gestores municipais da saúde do Rio Grande do Sul enxergam com otimismo pesquisas atuais que buscam aniquilar o vírus da dengue. A doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti também é o transmissor de zica, febre amarela e chikungunya.

Embora ainda em andamento, os primeiros resultados dos testes já mostram eficácia. É o caso do estudo dirigido pelos cientistas da Universidade de Leuven, na Bélgica, que descobriram uma espécie de antídoto que pode enfraquecer o vírus da Dengue e reduzir o risco de infecção.

O virologista e pesquisador gaúcho, Fernando Rosado Spilki, reconhece que existem poucas alternativas antivirais para a dengue e que este estudo traz essa novidade: é um medicamento novo, que se propõe a agir justamente nos temas de cópia do genoma viral. “Essa droga diminuiria a carga viral que é importante para evitar o agravamento da dengue e confirma mais rápido os sintomas”, explica.

Spilki mostra-se animado com a possibilidade de existir, em breve, um antiviral que possa ser utilizado, apesar de estar sendo desenvolvido por uma companhia farmacêutica associada à Janssen e não pelo poder público. “Essas coisas tendem a demorar um tempo para chegar até o mercado, mas quando isso acontecer, que venha com um preço adequado, pois esses medicamentos são muito caros”, avalia. “Por enquanto, prevenir é o melhor remédio”, pontua.

A dengue há alguns anos é motivo de preocupação e objeto de campanhas permanentes de conscientização e alerta por parte do Ministério da Saúde e dos governos estaduais e municipais. Contudo, com a chegada da pandemia da Covid-19, as ações de combate ao Aedes aegypti perderam espaço na agenda dos gestores de saúde. “Não é que a dengue tenha deixado de existir nos dois últimos anos, mas a Covid acabou virando o centro das atenções pela forma acachapante que chegou”, justifica Ane Beatriz Nantal, chefe da 1ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS/RS), que dá todo tipo de suporte para secretarias de saúde de 66 municípios da região metropolitana, Vale do Sinos e Paranhana, entre outros.

Segundo Ane Nantal, apesar da pandemia ter desviado o foco que se tinha na dengue, também é verdade que os municípios gaúchos foram pegos de surpresa em meados de março deste ano, principalmente pela falta de estrutura. “Até mesmo antes da pandemia, os municípios não tinham o número mínimo de agentes de endemias recomendado pelo Ministério da Saúde para realizar ações cotidianas de combate à proliferação do mosquito”, expõe.

Falta de estrutura, mas estudos animadores

Com o surto de dengue atual, essa deficiência, especialmente de recursos humanos, acabou ficando em evidência. Assim como muitos municípios do estado, a prefeitura de Igrejinha — cidade com 38 mil habitantes do Vale do Paranhana — precisou reforçar sua equipe de endemias para ter mãos suficientes para as forças-tarefa de combate ao mosquito. Com o surgimento dos primeiros casos suspeitos, conforme o secretário de saúde de Igrejinha, Vinicio Wallauer, a administração promoveu a contratação emergencial de sete novos profissionais para atuarem na linha de frente do combate à dengue. “Iniciamos uma ampla campanha de conscientização e de combate, com ações em diversos bairros, a fim de eliminar focos do mosquito”, pontua.

Igrejinha foi considerada, junto ao município de Dois Irmãos, que fica a 45 km de distância, o epicentro do surto de dengue na área da 1ª CRS/RS. Entretanto, além de registar um maior número de casos positivos em relação a cidade do Vale do Sinos, Igrejinha foi o município da região metropolitana que computou a primeira morte pela doença em 2022. Atualmente, a região tem quatro óbitos confirmados. Ainda não há, conforme Ane Nantal, uma explicação para o boom de casos nestes dois municípios.

Depois de quase dois meses do início do surto, Igrejinha segue fazendo ações de combate e prevenção, e já consegue notar uma diminuição importante na média de casos. No entanto, segue no top 10 das cidades com maior incidência de infectados no RS. A queda no número de infecções, contudo, não é o único fator que anima o secretário Vinicio Wallauer. Como gestor de saúde, ele acompanha, mesmo que com alguma distância, as pesquisas que estão sendo desenvolvidas — e se mostra otimista. “Esses estudos ainda estão em fases muito iniciais, mas animam. O Brasil está testando uma vacina que contempla as quatro cepas do vírus com resultados bem positivos, apesar de ainda estar longe de chegar na fase de comercialização”, declara.

Projeto da Fiocruz Amazônia pretende fazer com que o Aedes aegypti elimine seus próprios criadouros (Foto: Ingrid Anne/ILMD/Fiocruz Amazônia)

Outro município da região metropolitana no ranking das 10 cidades com maior número de infectados do RS é Estância Velha. Enquanto investiga a morte de um morador por suspeita de dengue, a coordenadora da Vigilância em Saúde do município, Eliane Gomes Fleck, comenta a possibilidade de se ter um antídoto contra a doença em breve. Para ela, as notícias que surgem dos testes que estão sendo desenvolvidos trazem esperança aos gestores de saúde, que são aqueles que estão na ponta mais frágil do combate aos focos do mosquito.

Além do estudo feito por cientistas da Bélgica e a vacina tetravalente que é testada no Brasil, Eliane cita uma tecnologia que está sendo desenvolvida pelo Instituto Leônidas & Maria Deane, unidade técnico-científica da Fiocruz no Amazonas, chamada de “Estações Disseminadoras de Larvicida”. Elas simulam o criadouro do mosquito e ficam recobertas por um tecido sintético impregnado de larvicida. Ao pousarem na armadilha para colocar ovos, as fêmeas do Aedes aegypti se impregnam com o larvicida presente nas estações. Ao visitarem outros criadouros, elas acabam contaminando outros recipientes com o inseticida que impede o desenvolvimento das larvas e pupas — reduzindo a infestação e, consequentemente, o avanço da doença.

“Se isso realmente acontecer, vai ser muito válido, pois o mosquito vai sair por aí espalhando esse larvicida. Ou seja, o Aedes vai estar eliminando os próprios criadouros. Então, espero que aconteça, pois representa uma esperança para minimizar a dengue”, conclui.

Região do Vale dos Sinos sofre com o aumento dos casos de dengue

Dados do Centro Estadual de Vigilância em Saúde do RS, referem que até o dia 2 de maio foram registrados 16 mil casos confirmados e 13 mortes. Dentre as principais regiões, a metropolitana de Porto Alegre se destaca com 5.682 casos e quatro óbitos, seguida do Vale dos Sinos com 2.769 ocorrências e três óbitos. Das 10 cidades com mais casos confirmados, estão Porto Alegre, com 1.684, Igrejinha, com uma morte e 920 casos, São Leopoldo, com 634, e Estância Velha, com 568 ocorrências.

Dez cidades gaúchas apresentam maior número de casos positivos até maio de 2022. (Fonte: SINAN NET/CEVS — DGTI/SES/RS)

São Leopoldo, localizada no Vale dos Sinos, é uma que aposta na conscientização da população no combate à dengue. Segundo o coordenador de campo da Vigilância em Saúde, Matheus Severo, foram recomendados mutirões de limpeza para retirar os criadouros e eliminar o máximo de locais de proliferação do mosquito. Para ele, “essa ação ajuda a população a se conscientizar, principalmente nessas áreas que houve surto, mostrando que o foco está dentro das residências e não nas ruas”.

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