De pé: Soligo, Suli, Mengálvio, Marinho, Toruca, Afonso. Agachados: o massagista Marmita, Telmo, Marino, Abílio, Fernando e Gilberto. (Foto: Clube Esportivo Aimoré/Divulgação)

O maior time da história do Aimoré

Na década de 1950, o Índio Capilé foi vice-campeão gaúcho com uma equipe de craques

Bruno Flores
Redação Beta
Published in
5 min readSep 10, 2019

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Ninho de Cobras. Assim ficou conhecido um dos elencos mais memoráveis do Aimoré. O time fez a melhor campanha da história do clube, chegando à segunda colocação do Campeonato Gaúcho, em 1959. A escalação vice-campeã é sempre lembrada pelos torcedores aimoresistas: Suli; Soligo, Toruca, Afonso, Carlos, Fernando, Mengálvio, Telmo, Marino, Abílio e Gilberto. Ao longo do Campeonato, o Índio Capilé disputou grandes jogos contra a dupla GreNal e diante dos times do interior.

A boa campanha foi consagrada no dia 11 de dezembro de 1959, quando o time de São Leopoldo chegou à final contra o Grêmio no histórico Estádio dos Eucaliptos. Pelo regulamento da época, o empate favorecia o clube porto-alegrense. Quem abriu o placar para o Aimoré foi o craque Mengálvio, em cobrança de falta. Na sequência ocorreu o lance mais duvidoso e reclamado pelo Aimoré em sua história. Nos acréscimos do segundo tempo, após cobrança de escanteio para o Grêmio, o lendário Airton “Pavilhão” fez o gol de cabeça. A contestação aimoresista seria de uma falta do zagueiro gremista sobre o goleiro Suli, ignorada pela arbitragem.

A perda do título, contudo, não apagou o brilho do maior escrete do Índio Capilé e esta reportagem busca mostrar porque o time do técnico Carlos Froner deu tão certo e foi tão longe. Aquela final no Estádio dos Eucaliptos ficou marcada na história do time e alguns dos personagens relatam aqui os momentos marcantes daquela partida.

Mengálvio em 1966. (Foto: Gazeta Press/Reprodução)

Na garupa da moto até São Leopoldo e, depois, dominando o mundo com Pelé

Em 1959, o craque Mengálvio Figueiró desfilou seu talento pelo Rio Grande do Sul com o Aimoré e chamou atenção do Santos, que logo o contratou para formar o que seria uma das melhores linhas ofensivas do mundo ao lado de Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe.

No Aimoré, o parceiro do craque era o zagueiro Toruca, que levava o meia para os treinos do Índio Capilé. “Até hoje, lembro muito bem dele porque eu morava em Porto Alegre e, quando tinha que ir treinar, eu ia para São Leopoldo. Eu pegava carona, parece mentira. Ele [Toruca] tinha uma moto e me dava carona no fim da [avenida] Farrapos. Eu esperava ele chegar com a moto dele e ia na garupa”, relembra Mengálvio.

A fala mansa e calma revisita o passado, quando o meio-campista encantou o Brasil com sua capacidade de organizar as jogadas do Santos com muita qualidade. “Graças a Deus, estou com a memória muito boa e lembro de tudo isso”, celebra.

A boa memória de Mengálvio permite, inclusive, que ele relate o jogo em que despertou interesse do alvinegro praiano: o polêmico 1 a 1 contra o Grêmio. “Eu fiz o gol de falta, estava 1 a 0. Faltando dois ou três minutos para acabar o jogo, o Grêmio fez um gol, com o Airton, que empurrou nosso goleiro Suli para dentro do gol e tudo”, recorda.

Por conta da atuação de gala, Mengálvio representou a Seleção Brasileira nos Jogos Pan-Americanos de 1960, na Costa Rica, e foi contratado pelo Santos. Porém, aquele 11 de dezembro de 1959 é uma das histórias que o craque gostaria que fosse diferente. “Era para sermos campeões”, diz.

O carrasco do Internacional

Abílio Chaves, hoje com 80 anos, era uma das promessas do Aimoré naquele Gauchão. E tudo se confirmou no ano de ouro aimoresista. “Era um time montado pelo Carlos Froner. A maioria [dos jogadores] era ali das redondezas. Eu tinha 17 anos quando estreei no Aimoré e fui embora para o Palmeiras com 18”, relembra.

O então atleta da categoria juvenil convenceu entre os craques. Abílio foi bem pelo Aimoré e, depois, jogou pelo Palmeiras e pelo Grêmio, atuando também no México. Depois, retornou ao Guarany, de Bagé, cidade onde reside até hoje. Nesse período, teve excelente retrospecto contra o Colorado. “Eu, jogando no Aimoré e no Guarany, acho que nunca perdi para o Internacional”, relata.

Para ele, o time vice-campeão gaúcho era diferenciado tecnicamente.“Jogar com Mengálvio, com jogadores de gabarito, é sempre bom”, afirma com bom humor.

Contudo, a principal virtude daquele elenco, para Abílio, era outra. “A melhor lembrança é a amizade que a gente tinha. Nós concentrávamos quarta-feira à noite, após o cinema, e ninguém reclamava. A amizade era muito grande e o companheirismo também”, relembra.

Hoje, Abílio vive em Bagé e comenta jogos de futebol para uma rádio local. Ele relembra, saudosista, aquele distante 1959. “Eu começaria tudo de novo. Pagaria milhões para começar tudo de novo”, revela o ex-jogador.

Lateral “vidente”

O flanco esquerdo do Aimoré em 1959 era responsabilidade de Carlos Amâncio. Hoje com 85 anos e aposentado do Banrisul, ele lembra que teve oportunidade de ir para o Palmeiras quando ainda atuava em São Leopoldo. Em 1962, entrou para o banco do Estado e deixou de atuar profissionalmente como jogador.

O ex-lateral revela que previu o gol mais polêmico sofrido pelo Índio Capilé: o famoso tento marcado por Airton “Pavilhão”, que deu o título gaúcho de 1959 para o Grêmio. “Eu ainda disse: ‘Afonso, toca essa bola lá para a lateral’. Ele dominou a bola e jogou para escanteio. Eu disse: ‘Agora vem o Airton lá e faz um gol de cabeça, cara’. Ah, dito e feito. O Airton veio de lá e , jogou Suli, Toruca e tudo para dentro do gol”, explica.

Ao longo do tempo

Das arquibancadas do Estádio dos Eucaliptos, Álvaro Cardoso, então com 11 anos de idade, viu Airton “Pavilhão” saltar de cabeça e marcar o gol que tirou o título gaúcho das mãos do Aimoré. Cardoso tem 70 anos e é um dos torcedores-símbolo do clube leopoldense. Também, já foi presidente do Índio Capilé.

Álvaro diz não torcer para a dupla GreNal: “eu não tive tempo de torcer para Inter ou Grêmio. Sempre fui Aimoré e só torço para o Aimoré”. O amor pelo clube é tão enraizado na vida de Cardoso que seu jogador referência no futebol é o ex-zagueiro aimoresista Toruca. “O Toruca é o meu grande ídolo, o capitão daquela campanha”, conta.

O ex-presidente afirmou que o esquadrão de 1959 foi o maior time da história do clube e também falou sobre o lance polêmico diante do Tricolor de Porto Alegre. “Eu estava lá [nos Eucaliptos]. Saímos ganhando por 1 a 0, gol de falta do Mengálvio. No gol do Grêmio, foi falta do Airton, com certeza absoluta. Por isso eu não gosto de Grêmio e Internacional, essas coisas sempre acontecem”, protesta.

Legado

O time de 1959 ficou eternizado como um dos maiores — e para muitos o maior — da história do Aimoré. Para Ronaldo Vieira, atual presidente do clube, aqueles jogadores protagonizaram um dos capítulos mais importantes da história aimoresista. Segundo o mandatário, o time foi muito importante também para a construção do Estádio Cristo Rei. Muitos dos valores investidos na realização da obra foram levantados através da venda dos jogadores que se destacaram naquele ano.

Até hoje, a campanha do vice-campeonato é a mais vitoriosa do currículo do Aimoré. O Ninho de Cobras ou Academia, como também era conhecido, exportou excelentes jogadores aos grandes clubes do país e marcou época no futebol gaúcho e brasileiro.

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