O cantor e compositor ZéVitor vê a arte como revolucionária e transformadora. (Foto: Gabriel Garcia/Divulgação)

“O papel da música é transformar a vida das pessoas”, diz o compositor ZéVitor

Produzido em meio à pandemia, o álbum “Existencial” mostrará uma nova fase do artista

Carol Steques
Redação Beta
Published in
9 min readJun 5, 2021

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ZéVitor é um cantor e compositor carioca com alma de poeta. Suas canções são uma mistura de melodia com poesia. Seus fãs se encantam com sua letras suaves que falam sobre amor e trazem críticas sociais e políticas nas entrelinhas. Ele conta que quer deixar a vida um pouco mais leve com suas canções, e que para ele, escrever é sentir. “Existencial” é o seu novo projeto, que ainda não tem data definida para lançamento, e irá trazer uma nova fase de ZéVitor, com outra sonoridade.

Filho do ator Jackson Antunes e da atriz Cristiana Britto, a arte sempre esteve presente na sua vida. Durante esse período de pandemia, ZéVitor lançou diversas músicas, álbuns e EPs. Suas canções abrangem diferentes estilos musicais, como pop e reggae, podendo ser encontradas em playlist como “para começar bem o dia”, ou para aliviar o coração durante uma desilusão amorosa.

A Beta Redação conversou por telefone com o cantor e compositor. ZéVitor falou sobre novos projetos, suas inspirações para desenvolver as canções e músicas que marcaram ao longo de sua carreira.

Por que o teu trabalho tem tanta inspiração nas artes visuais e na poesia? De onde vem essa referência?

Eu sou de um berço de arte, minha mãe é atriz e meu pai é ator. Eu cresci dentro de um teatro e dos teatros ao redor do Brasil. Minha mãe tem álbum de foto meu dormindo em coxia [também chamado de bastidores o teatro] de todas as formas possíveis. A arte sempre esteve muito presente na minha vida, no gosto que meus pais deixaram para mim e no meu gosto também. Eu sempre gostei de desenho, e acabei encontrando o Lucas Paixão que é um cara com um traço super especial, e a gente quis unir essas artes para tentar trazer algo diferente para o trabalho e para as pessoas também.

Você acredita então que crescer em uma família de artistas acabou o influenciando para ingressar nesse ramo?

Com certeza! Eu até tentei fugir, em algum período da minha vida, onde eu não tinha certeza de que eu amava isso, mas eu sempre fui isso. Sempre estive dentro deste meio, minha casa sempre foi um lugar de inda e vinda de artistas, de amigos, de um grande intercâmbio de arte, de todas as qualidades e modalidades. Então com certeza eu acho que essa vivência influenciou muito na minha vida, na minha visão com o meu trabalho, na minha visão com o mundo e na minha forma de expressão, que encontrei aos poucos e ainda encontro diariamente.

O seu álbum “Ressignificar”, lançado no fim do ano passado, traz diversas simbologias. Dentre tantas obras e autores, por que o movimento impressionista foi o escolhido para referência em algumas músicas?

O Lucas Paixão é um moleque muito talentoso, ele pinta qualquer obra que você pedir, e ele tem o gosto dele, que é um desenho mais Mangá. E o meu público também gosta muito, tem uma galera mais jovem que se alimenta muito disso, então foi legal poder unir as coisas. A música “Por Onde Começar” é uma releitura de uma obra, com os personagens e todas as referências. Eu acho que foi algo muito natural, as coisas foram se encaixando e a letra, por exemplo, é a representante disso, juntamente aos desenhos e arranjos, que também são cercados de elos, que levam a gente a pensar no movimento barroco e renascentista. É a atmosfera dessa história de um universo antigo, e que traz essas referências da literatura, dramaturgia e cultura. É uma mistura de artes e coisas para criar um mundo novo.

Seu último lançamento, “Vamos Nessa”, em parceria com Gabrieu, narra uma aventura. O que te motivou a escrever esta história trazendo um Fusca como plano de fundo?

Essa é uma música antiga que tinha ficado guardada. Neste momento de pandemia, a gente resgatou algumas músicas. Tanto “A Leveza do Nosso Amor”, como ela, foram músicas resgatadas, repaginadas e trazidas para mostrar para a galera. O Fusca é a história da espera: ele está esperando a menina — que inclusive faz referência a música “Menina” no clipe. Falamos do Fusca em si porque eu sou realmente apaixonado por Volkswagen antigo.

A gente até lançou um mini DOC falando sobre isso, é uma paixão que existe uma interseção dela com a história de cada um. Quem não tem a história do pai ou da mãe que aprendeu a dirigir em um Fusca, da avó que tinha um Fusca ou da gente pequeno vendo tudo isso? Alguém já viajou em algum momento, ou já entrou em um Fusca. E quando olhou, falou: “nossa, que coisa diferente!”. Isso ficou guardado em um lugar no coração. Então realmente foi algo muito pessoal meu que trouxemos, e que eu acredito que converse com a história de muita gente. O Fusca foi para ambientar e trazer esse ponto de interseção no coração das pessoas.

A música “Vamos Nessa” traz um Fusca como plano de fundo. (Foto: Gabriel Garcia/Divulgação)

Nas suas redes sociais podemos ver várias fotos falando sobre o “Existencial” e uma curiosidade gritante dos fãs para saber do que se trata esse novo projeto. Pode contar pra gente?

Que legal você falar disso! “Existencial” é um novo projeto que estamos fazendo nesse momento pandêmico — nesse momento estranho que colocou todo mundo fora da zona de conforto. Existencial nasce em uma crise muito sincera minha em relação a mim mesmo, ao meu trabalho, a como eu quero dizer as coisas e aonde eu quero dizer. Esse existencialismo que questiona o mundo, a si mesmo, o amor.

“Existencial” é uma sonoridade completamente nova, que ninguém ouviu até agora nos meus trabalhos. Eu inclusive agora estou aqui na Serra [do RJ] com Áureo Gandur e Gabriel Garcia, que são os produtores também — compus grande parte das músicas com Gabriel, grande parceiro, como um irmão — e a gente está trabalhando nesse álbum. Muita coisa boa para vir! Estamos na segunda semana de trabalho. Eu não sei como que vai ser isso, os fãs podem ficar surpresos.

“‘Existencial’ é uma sonoridade completamente nova, que ninguém ouviu até agora nos meus trabalhos”

Vou mostrar uma fase nova, é um disco que vai flertar com dark pop, com preston pop, que vai ter uma onda soft, muita linha de guitarra e muito trabalho instrumental. O Áureo trabalha com cinema e vai trazer sonoplastia para a gente. Estamos captando sons daqui da natureza, transformando em ruídos e em diversas coisas. É um trabalho experimental que eu acredito que, em questão de produção e de ânimo, talvez seja o trabalho que mais me anime, e que eu acho que vai trazer mais felicidade no sentido de realização pessoal. Estou realmente muito animado com este álbum!

E você já tem uma previsão de data de lançamento?

Não existe nada certo, a gente não tem uma data específica ainda. Mas estávamos querendo lançar no ano que vem. A gente tem até o final do ano para trabalhar. Vamos subir para a Serra toda semana para trabalhar e viver o processo. Estamos realmente descobrindo o que é isso, juntos. As nossas reuniões, conversas e observações, vivências e tudo o que acontece no mundo está somando para a gente construir o álbum.

Esse novo álbum conta com parcerias em alguma das músicas?

Ainda não temos nenhuma parceria certa, mas estamos selecionando vários nomes que a gente pensa e fala: “nossa, seria muito legal contar com esse nome” ou “ninguém espera que a gente lance uma música com tal pessoa”. Isso ainda está em segredo, mas já estamos anotando tudo e vendo quais músicas ficam melhores em cada música para depois irmos atrás de todos os contatos e fazer os convites.

Capa de “Alicerces”, música que traz reflexões políticas. (Foto: Gabriel Garcia/Divulgação)

Em 2019, foi lhe perguntado em uma entrevista se o momento delicado que o Brasil passava naquela época em relação ao campo social, político e artístico interferiria nas suas criações musicais. Hoje em dia, dois anos depois e no meio de uma pandemia, como você vê essas questões?

Como eu narro em “Alicerces”, reggae que a gente lançou, eu vejo um mundo que caminha para um lugar muito complicado. Eu sou de 1998, de uma geração que não viveu os anos 90 e que nasce meio que em um limbo, no final dessa “liberdade” e no início desse novo mundo tecnológico, que eu também não peguei. Eu acredito que a minha geração tenha muita nostalgia, talvez, de uma coisa que ela nem conheceu. Ao mesmo tempo, um medo e incômodo.

Desde que a gente nasceu pegamos o mundo em transição. Isso é complicadíssimo. A gente olha os absurdos que acontecem da porta para fora, o descaso com o próximo e com a natureza. Estamos na época da depressão e da tristeza. Na época onde a gente anseia por algo novo e talvez nem saiba quando teremos esperança para conseguir enxergar um mundo melhor. Guerras ao redor do mundo e guerras no nosso próprio quintal, com nossos próprios vizinhos.

Acredito que a arte de um país fale muito sobre ele, o que as pessoas estão dizendo e como a gente está usando a nossa voz

Eu acredito que a gente vive uma necessidade de esperança muito grande, para assim podermos crer em mundo melhor. E é aquele papo clichê: “começa por cada um”. Começa pelas nossas escolhas, pelo nosso voto, pelo nosso comportamento, pelas nossas palavras e nossa arte. Acredito que a arte de um país fale muito sobre ele, o que as pessoas estão dizendo e como a gente está usando a nossa voz — a nossa expressão artística — para que cause algum impacto positivo em um mundo que está tão degradado.

E essas questões sociais e políticas acabam influenciando nas suas letras?

Com certeza. Pra mim escrever é sentir. Eu me sinto muito mexido com esse cenário todo que a gente acabou de falar. De uma forma ou de outra, mesmo se eu for falar de amor, talvez em um duplo sentindo eu esteja falando da população com ela mesma, ou do governo com ele mesmo. “Existencial” é um álbum que traz questões como “Quem eu sou? Quem as outras pessoas acham que eu sou? Quem eu quero ser e como eu quero ser?”. Tem uma música que se chama “Reprise dos Séculos”, que ela fala sobre isso: “Eu vivo a reprise dos séculos, eu enxergo a reprise dos séculos”. A gente vive tudo o que já foi, a gente vê o Bolsonaro fazendo uma passeata que o Mussolini fez, tudo reprisa. Então tudo isso, com certeza, influencia na minha música e pensamento político — por mais que talvez não seja tão escancarado, mas em camadas mais profundas de entendimento e reflexão.

Qual a mensagem que você quer transmitir com as suas músicas?

Eu quero deixar a vida um pouco mais leve. Eu vejo que os meus fãs sempre falam disso, de que mesmo que o dia tenha sido difícil, como aquela música ajudou quando ele chegou em casa e deitou na cama ou foi dar uma volta e contemplar a natureza. Eu acho que esse papel transformador é onde eu almejo chegar, no coração e na mente das pessoas. Eu vejo a arte como revolucionária e transformadora. Quando você escuta uma música, você consegue assimilar melhor. Quantas vezes nós já passamos por isso, de entrar em contato com músicas que falaram coisas pra gente. Para mim, o papel da música, e principalmente da música que eu busco fazer, é o papel transformador na vida das pessoas. Papel reflexivo e questionador.

Ao longo da sua carreira, tem alguma canção que mais te marcou?

Eu sou completamente suspeito para dizer isso agora, porque realmente no meio do álbum “Existencial” existem músicas muito especiais. Mas, se eu for olhar lá para trás, várias coisas me marcaram, como o feat com o Fagner, que é uma lenda na música.

A música “Menina”, que eu gravei com a minha namorada me marcou muito também, eu gravei a primeira versão em “Crônicas de Um Amor”, quando eu fiz para ela. E depois, em “Ressignificar”, ela fez o feat comigo. “Mar Revolto”, uma música do meu primeiro álbum, também foi muito importante. “Bruxa”, com Kamaitachi, e “Castelo de Areia”, com Konai, foram parcerias de caras que me deram a mão, e que são de uma nova geração muito boa, que está vindo com tudo.

Mas, hoje, sendo completamente suspeito, “Existencial”, desde a faixa 1 até a 11 — ou até a faixa 14, estamos decidindo ainda — são músicas que me marcam muito. Pois falam de uma mudança e de uma reestruturação de tudo, na forma de dizer, cantar, mostrar. Vai mostrar uma nova face de mim que talvez, até ontem, nem eu mesmo soubesse. É realmente um período bem transformador.

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