O que fizeram Bush, Obama e Trump após deixarem a Casa Branca

Dois dos três presidentes dos Estados Unidos não podem pleitear o cargo novamente. Regra não impede disputa ao Capitólio

Leonardo Oberherr
Redação Beta
8 min readDec 2, 2021

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Bush, Trump e Obama comandaram o Executivo estaduniense nas últimas duas décadas. (Foto: Laura Cavanaugh/FilmMagic; Aurelien Meunier/Getty; Leigh Vogel/WireImage)

Diferentemente do Brasil, em que o ex-presidente Lula — mesmo após dois mandatos como Chefe do Executivo — poderá disputar a Presidência do país outra vez, se quiser, nos Estados Unidos ex-presidentes são vedados constitucionalmente a concorrerem novamente ao cargo.

De acordo com a Emenda XXII da Constituição dos Estados Unidos, “ninguém poderá ser eleito mais de duas vezes para o cargo de Presidente, e pessoa alguma que tenha sido Presidente, ou desempenhado o cargo de Presidente por mais de dois anos de um período para o qual outra pessoa tenha sido eleita Presidente, poderá ser eleita para o cargo de Presidente mais de uma vez”.

Diante desse cenário, George W. Bush (2001–2008) e Barack Obama (2009–2016) não possuem mais direito legal de serem presidentes, ao contrário de Donald Trump. O último presidente estadunidense não venceu a eleição para o segundo mandato, sendo derrotado por Joe Biden em dezembro de 2020, e já declarou ter interesse em concorrer ao posto em 2024.

Legado e impacto político de ex-presidentes

Segundo a doutora em Ciência Política pela USP e professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Cristina Soreanu Pecequilo, “considerando as últimas três presidências, podemos indicar que as de Obama e Trump ainda são as que tem o maior impacto no sistema político dos EUA, conforme indicam os institutos de pesquisa locais”, comenta.

Para a professora, as razões que podem ser apontadas para isso residem no legado e na personalidade dos governantes. “George W. Bush tende a ser mais lembrado por tempos difíceis, associados ao 11 de Setembro, às guerras do Afeganistão e Iraque e, principalmente, à crise econômica de 2008”, comenta.

“Ainda com relação à Bush, a influência política da família declinou bastante dentro do Partido Republicano, ofuscada justamente pela linha mais radical populista de extrema direita representada por Trump. Assim, não só George W. Bush, mas todos os nomes republicanos com um perfil conservador mais tradicional perderam espaço.

Outro ponto é que Obama e Trump possuem personalidades mais fortes, carismáticas, e estão associadas a correntes influentes dentro de seus partidos, sendo lembrados por seus apoiadores com maior simpatia e fatos positivos.

No fundo, sintetizam as divisões atuais dos Estados Unidos. Por fim, ambos atuam em outras áreas além do sistema político, e isso permite que se mantenham sistematicamente na mídia mesmo fora do cargo e com poder de influenciar disputas eleitorais”, complementa Cristina.

2017–2020 — Donald Trump (Partido Republicano)

Donald Trump já disse ter interesse de concorrer em 2024. (Foto: Library of Congress / Unsplash)

Mesmo perdendo a reeleição para Joe Biden, em 2020, Donald Trump continua com influência política no cenário estadunidense. O empresário de 75 anos pode ser um dos trunfos nas eleições do Congresso — que ocorrem em 2022 — para que os Republicanos retomem a maioria no Capitólio.

Tendo muita influência sobre os eleitores da legenda, Trump, que teve sua campanha impulsionada pelo uso das redes sociais, foi banido por Instagram, Twitter e Facebook por tempo indeterminado em razão das propagações de fake news e discursos de ódio.

Trump ficou amplamente conhecido por ter apresentado o programa televisivo The Apprentice — no Brasil, O Aprendiz. Mas, antes disso, ele já era um reconhecido empresário, bilionário e com negócios em diversos setores. Desde que saiu da presidência, as empresas de Donald Trump passaram a ser investigadas por crimes fiscais em Nova Iorque.

Além da investigação na vida pessoal, Trump ainda sofreu com dois processos de impeachment — um deles mesmo após a posse de seu sucessor. Porém, foi inocentado em ambos processos pelo Senado. Sem nenhum impedimento, além de Trump poder concorrer em 2024 novamente, ele segue com os direitos por ser ex-presidente dos Estados Unidos.

Entre eles está a segurança feita pelo Serviço Secreto do país, serviço postal personalizado e uma aposentadoria que custará anualmente cerca de 220 mil dólares aos cofres públicos.

“Trump mantém o plano de concorrer em 2024, e mantém tanto dentro quanto fora do partido uma presença forte baseada em ofensivas verbais, divisão de palanque com candidatos de agenda similar e grupos sociais radicais. Uma boa medida da influência de cada um poderá ser percebida já em 2022 com as eleições de meio de mandato para o legislativo”, avalia a professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Cristina Pecequilo.

Ela ainda complementa dizendo que, para Trump, é essencial que o governo Biden não dê certo. Entretanto, para o atual presidente, o grande inimigo não é Trump, mas os resultados de seus planos econômicos.

Se derem certo, estas críticas de Trump acabam sendo irrelevantes, porque a população se preocupa mais com seu bem-estar. Se derem errado, aí é possível crescer mais politicamente.

“A sombra de Trump é permanente e precisa sempre alimentar no país uma agenda populista, de apelo à polarização, negacionista na ciência, então ele tem exercido uma prática sistemática de críticas e muitos de seus aliados estão já no Legislativo e dificultam as negociações bipartidárias”, pondera.

Para a internacionalista Camila da Luz, Trump é o ex-presidente que mais destoa dos demais. Segundo ela, a força de Trump se dá justamente por antagonizar os outros ex-presidentes. “Trump é mais falastrão e se alimenta do ódio que ele mesmo propaga. Diferentemente de Obama e até mesmo do companheiro de partido, George W. Bush”, compara.

2009–2016 — Barack Obama (Partido Democrata)

Obama está concorrendo ao Grammy de 2022. (Foto: Library of Congress / Unsplash)

Ex-senador pelo Estado de Illinois entre 2005 e 2008, Obama dirigiu os Estados Unidos por dois mandatos, entre 2009 e 2016. O advogado foi o primeiro afrodescendente a presidir o país. Em seu primeiro período, trabalhou para estimular a economia diante da recessão e da crise de 2008, além de ter determinado o fim do envolvimento do país na Guerra do Iraque, ordenou a operação militar no Paquistão que resultou na morte de Osama bin Laden. Mas, talvez, seu principal projeto tenha sido a aprovação e sanção da Lei de Proteção e Cuidado ao Paciente, conhecida como “Obamacare”. Lei esta que regulamenta os valores dos planos de saúde e aumenta o número de atendimentos ofertados por eles.

Seu segundo mandato teve maior impacto para políticas de redução da venda de armas de fogo e a defesa da igualdade LGBT ([)a sigla LGBTQIA+ passou a ser usada pela comunidade mais tarde, a partir de 2019). Obama terminou seu governo com cerca de 60% de aprovação de acordo com a pesquisa CNN/ORC.

Logo após o final do seu mandato, Barack e a primeira-dama Michelle Obama partiram para uma curta viagem de férias, e retornaram para morar em Washington. Fazia aproximadamente cem anos que um ex-presidente não permanecia na capital estadunidense, e o motivo foi a oportunidade de sua filha, Sasha, concluísse o ensino médio na mesma escola.

Em março de 2017 o casal assinou um contrato editorial com a Random House para que publicassem suas memórias. Foi o maior valor dado para um casal presidencial publicar sua história: 65 milhões de dólares garantidos, superando os 10 milhões de Bush e os 15 milhões de Clinton. A obra, intitulada A Promissed Land, foi publicada em 2020, se tornando um best seller. Por conta do audiobook do livro, Obama foi indicado ao Grammy de 2022, na categoria Melhor Álbum de Palavras Faladas.

Na vida política, Obama seguiu como um dos principais cabos eleitorais do Partido Democrata. Nas eleições de 2018, foi requisitado para diversos eventos que culminaram na eleição de Democratas para a maioria das vagas da Câmara dos Representantes. Nas eleições de 2020, foi um dos principais aliados para a vitória de Joe Biden, que, inclusive, foi o vice-presidente nos dois mandatos de Obama.

“Obama mantém forte influência, tanto que impulsionou a candidatura Biden e permanece como uma referência dentro do Partido Democrata (ainda que este partido também apresente tendências de fragmentação)”, comenta Cristina.

2001–2008 — George W. Bush (Partido Republicano)

George W. Bush tem perdido espaço no partido Republicano. (Foto: Library of Congress / Unsplash)

Tendo que adequar a agenda que até então era intensificada na política interna, por conta dos ataques de 11 de setembro, George W. Bush presidiu os Estados Unidos por dois mandatos. Ficou conhecido principalmente pelo que se convencionou chamar de Doutrina Bush. Ele lançou a Guerra ao Terror e promoveu na agenda militar internacional a Guerra no Afeganistão em 2001, e a Guerra do Iraque em 2003.

Entre outras ações do primeiro mandato, com foco na reforma da previdência, saúde e economia, Bush ainda realizou uma alteração da Constituição para proibir o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Seu segundo período foi marcado pelas críticas à atuação na Guerra do Iraque, além das ações promovidas pelo governo após o Furacão Katrina. Em dezembro de 2007, pouco antes do término do seu segundo mandato, Bush teve de atuar para diminuir os impactos da Grande Recessão, tida por muitos como a pior depois da Segunda Guerra Mundial.

Bush estabeleceu seu escritório presidencial em Dallas, no estado do Texas, onde também reside. Em 2010 publicou seu livro de memórias, intitulado Decision Points, onde tentou justificar algumas de suas decisões. Após o fim do mandato, ele seguiu comedido, até que, em 2010, realizou sua primeira aparição política mais contundente, ao juntar-se com Bill Clinton para criar uma campanha de arrecadação de fundos para as vítimas do terremoto que atingiu o Haiti. O ex-presidente também dedicou-se à pintura, onde retratava coisas do seu cotidiano. Sua primeira exposição foi em 2014.

Bush apoiou o candidato à Presidência do Partido Republicano em 2012, Mitt Romney, mas não endossou o nomeado pelo seu partido para 2016, Donald Trump. Nas primárias republicanas daquele ano, Bush apoiou seu irmão, Jeb Bush, que desistiu logo após as primeiras primárias iniciais. O mesmo aconteceu em 2020, quando Bush também não endossou a candidatura de Donald Trump.

“Bush perdeu muito espaço para Trump, assim como os demais membros mais moderados do Partido Republicano. As novas coalizões internas dos republicanos têm se baseado mais na aproximação com a extrema direita e grupos religiosos, reforçando uma tendência que vinha desde 1994 e se consolidou a partir de 2010”, aponta Cristina.

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Leonardo Oberherr
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Estudante de jornalismo, amante de esportes e música. Inspirado por Leonardo Meneghetti, Galvão Bueno e PVC. #IDIDDAT