Tormenta 20, um cenário de RPG brasileiro, é o responsável pela maior campanha de financiamento coletivo da história do país (Foto: Ian Gonzalez/Unsplash)

Apesar do avanço tecnológico, RPG de mesa segue relevante

Jogo estimula a criatividade e a desinibição, permitindo que os participantes incorporem personagens imaginários

Mailsom Portalete
Redação Beta
Published in
5 min readDec 2, 2019

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Desde 1974, quando Dungeons & Dragons (D&D) foi lançado, a essência do role-playing game (RPG) continua a mesma: um jogo de interpretação cooperativo em que um grupo de personagens parte em uma aventura, previamente estruturada por um mestre. Com o passar dos anos, o D&D evoluiu, tornando-se o sistema de RPG mais famoso do mundo. Além dele, inúmeros outros também surgiram, inclusive no Brasil.

Em 1999 foi lançada a primeira edição do cenário Tormenta em um encarte especial, de 80 páginas, comemorativo das 50 edições da revista Dragão Brasil — publicação especializada do ramo. Depois de 20 anos, Tormenta se tornou, para além de um jogo de RPG, um universo de fantasia que abrange literatura e histórias em quadrinhos e que, em 2019, no Brasil, foi responsável pela maior campanha de financiamento coletivo da história.

A Jambô Editora, dona dos direitos de publicação dos títulos de Tormenta desde 2005, anunciou, em julho de 2019, que a campanha de financiamento coletivo de Tormenta 20 arrecadou quase R$ 2 milhões através do site Catarse. Essa quantia, paga por 6.353 apoiadores, representa um ganho de 2.397% acima da meta inicial, estipulada em R$ 80 mil.

De acordo com o jogador de RPG, Mateus Folletto, o Tormenta é o maior cenário do Brasil e um dos maiores do mundo. “Acho que o diferencial dele é oferecer uma quantidade gigante de recursos e ferramentas. Vários cenários e sistemas oferecem coisas focadas: vikings, samurais, Europa Medieval… Mas o Tormenta oferece tudo. Não precisa procurar um sistema ou cenário específico quando se tem tudo ali”, comenta.

Os motivos do fascínio

Para o jogador de RPG, Mateus Folleto, o RPG se mantém relevante porque fomenta o exercício da tradição oral. (Foto: Divulgação/Meeple Club Tabuleiria)

Mateus Folletto, programador, tem 24 anos e joga RPG de mesa desde os 17. Quem o introduziu neste universo foram amigos que conheceu na festa de aniversário de uma amiga de escola. Antes disso, ele já tinha contato com os RPGs eletrônicos (jogados em videogames ou computador).

“Nessa festa conheci pessoas que hoje são amigos próximos. O assunto em comum entre todos era (o jogo eletrônico) Skyrim, que fez explodir o interesse na cultura pop por vikings e nórdicos. Inevitavelmente, nosso primeiro RPG de mesa foi justamente nesse estilo”, relata.

Para ele, o RPG de mesa é uma oportunidade para expressar e trabalhar conceitos e temas que gosta, em forma de aventuras. Mateus garante que, mesmo com toda a evolução dos gráficos e da jogabilidade dos RPGs eletrônicos, ele não pensa em abandonar a experiência do mundo real.

“O principal atrativo do RPG é a interação humana. O role-playing tem muito da expressão, tanto por fala, quanto corporal. É uma brincadeira extremamente humana e que cria laços de amizade. Nesse sentido, o RPG tem muito a oferecer e a ensinar para as pessoas sobre interação humana e empatia”, defende.

Onde jogar e como começar

As tabuleirias são uma opção para quem nunca jogou RPG, mas tem interesse em conhecer. O local também pode ser uma oportunidade para conhecer pessoas e fazer amizades.

Além da interação humana, um dos atrativos do jogo são os valores acessíveis e a pouca estrutura necessária. (Foto: Divulgação/Meeple Club Tabuleiria)

A Meeple Club Tabuleiria é um salão de jogos analógicos. O espaço, situado em São Leopoldo, existe há três anos e disponibiliza jogos para venda. Segundo o proprietário, Alaor Júnior, o espaço é principalmente procurado por homens com idade entre 25 anos e 35 anos.

Alaor enfatiza que qualquer pessoa pode jogar RPG. Para ele, a modalidade continua relevante, considerando que a interpretação de personagens incentiva as pessoas a serem mais criativas e desinibidas. “Existem jogos mais simples e outros mais complexos. O investimento varia de acordo com o tipo escolhido. Esse custo, por exemplo, entre jogadores de D&D — que teve o livro da última edição lançado recentemente — gira em torno de R$ 150, mais o kit de dados que sai em média de R$ 20 a R$ 40”, detalha.

Para os interessados em conhecer o RPG na prática, a tabuleiria promove uma mesa de D&D para iniciante nas sextas-feiras, a partir das 15h. Nela, um mestre ensina como jogar e já é possível participar de uma aventura. A Meeple Club funciona de terça a sábado, das 15h às 22h, e, aos domingos e feriados, das 16h às 22h.

As tabuleirias são espaços propícios para a prática do RPG, board games e card games. (Foto: Divulgação/Meeple Club Tabuleiria)

O valor para jogar, por dia, é de R$ 15 por pessoa. Outra possibilidade é se tornar um associado. O valor de R$ 40,00 mensais dá direito a acesso liberado ao espaço, desconto no cardápio, possibilidade de fazer a locação dos jogos e acesso ao grupo de Whatsapp exclusivo da Meeple Club.

Outra opção para os amantes do RPG é a Nerdz: uma loja focada em livros de RPG, card games e quadrinhos. A Nerdz conta com um salão de jogos gratuito. Para usufruir, basta entrar em contato com antecedência para reservar uma mesa. “Uma vez por mês, o pessoal do RPG 4 Newbies organiza várias mesas para iniciantes”, conta Paloma Ceresani, gerente geral da loja.

Segundo a gerente da Nerdz, Paloma Ceresani, a proposta da loja é ser um espaço onde cada cliente/jogador se sinta incluso. (Foto: Divulgação/NERDZ)

A Nerdz é frequentada por jogadores de RPG de todas as idades, gêneros e classes sociais. Cerca de 30% do público atual é jogador de RPG. A loja existe há mais de 30 anos, antigamente, com o nome de Jambô. No início, a loja fazia locação de jogos de console e VHS. “Quando começou a publicação de RPG no Brasil era difícil conseguir os livros, então um dos sócios começou a comprar essas obras para que ele e seus amigos pudessem jogar. Aos poucos, outros clientes começaram a pedir os livros e, assim, aos pouquinhos nos tornamos o que somos hoje”, conta Paloma.

Para a gerente da Nerdz, o RPG, por ser um jogo cooperativo, propicia a inclusão. Paloma defende que os jogos eletrônicos, mesmo com toda a evolução tecnológica, sempre terão a limitação dos desenvolvedores. O RPG, por outro lado, é limitado apenas pela imaginação dos jogadores. “O RPG é um dos jogos mais inclusivos que eu conheço, tanto que ele é usado há anos em terapias”, destaca.

De acordo com a gerente da Nerdz, para começar a jogar é preciso dispor de um livro básico e os dados correspondentes. O valor dependerá do livro. Para iniciantes, ela recomenda o 3D&T básico, que custa R$ 29,90, e um jogo de dado completo que custa em torno de R$ 25,00. Mas para quem está começando, a Jambô disponibiliza o 3D&T básico gratuitamente em seu site para que todo mundo tenha acesso ao jogo.

A loja da Nerdz funciona, de segunda a sábado, das 10h às 19h. Já o salão de jogos da Nerdz abre, de terça à sexta, das 16h às 22h, e sábado, das 10h às 19h.

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