Os desafios da editoria Geral em tempos de pandemia

No segundo semestre de 2020 os repórteres conseguiram ter um olhar mais apurado para temáticas além da crise sanitária

William Martins
Redação Beta
4 min readDec 9, 2020

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A pandemia permeou a maioria das reportagens, mas deu espaço para que outros temas fossem trabalhados. (Foto: Roksana96/Pixabay)

Que o ano de 2020 foi excepcional e impôs a sua força, é uma afirmação inegável. O mundo precisou se adaptar às mudanças trazidas por ele. A Beta Redação, por exemplo, assim como toda a universidade, está chegando ao final do seu segundo semestre em trabalho completamente remoto. Todas as reportagens publicadas neste site experimental foram produzidas a distância, o que exigiu dos alunos e professores a organização de uma nova rotina e a compreensão das novas lógicas de produção que foram se estabelecendo.

A editoria de Geral, neste semestre, teve 49 reportagens publicadas no total. Os mais diversos assuntos foram abordados, a maioria deles contextualizados pela pandemia do novo coronavírus — e não teria como ser diferente. Portanto, os recortes escolhidos para serem trabalhados pelos repórteres, de alguma maneira, foram atingidos pelas consequências que a pandemia está causando. Contudo, é importante ressaltar os esforços realizados pelos alunos para conseguirem trazer um conteúdo que saísse, mesmo que minimamente, desta pauta central para todo o mundo.

O editor Júlio Hanauer ressalta as dificuldades encontradas pelos repórteres durante o semestre para dar continuidade nas produções e a busca por temas diferentes. “Nesse segundo semestre produzimos matérias relacionadas a pandemia, mas também mostramos que há outras coisas além disso. Foi super desafiador encontrar pautas diferentes e, principalmente, contatar fontes”, comenta.

Além das dificuldades de encontrar temáticas que fugissem da pandemia, a editoria exige um outro cuidado na curadoria das pautas a serem desenvolvidas, que é não invadir o território de conteúdo das outras quatro editorias da Beta Redação. “No início, estava cheio de ideias de pautas. Algumas renderam boas matérias e outras acabaram caindo. Já pelo meio do semestre, as pautas foram ficando mais escassas, já que os temas que eu observava como potenciais para novas reportagens acabavam se encaixando em outras editorias. Por conta disso, acabei achando até um pouco mais difícil propor as pautas para a editoria de Geral”, conta o repórter Lucas Ott.

Para a editora Martina Belotto, o maior desafio foi desconstruir o olhar. “Muitos repórteres se sentem presos a questão da saúde, principalmente agora com o coronavírus. Então o meu principal desafio foi tentar diversificar essas pautas, trazer outros olhares também. Eu acho que foi muito produtivo, pois os repórteres conseguiram encontrar visões diferentes para produzir conteúdos legais”, afirma.

É o que sentiu o estudante Émerson Santos, ao relatar sua primeira incursão na Beta Redação, participando de três editorias ao mesmo tempo. “Eu sabia que nosso trabalho em Beta Geral seria muito importante, abordando questões de saúde nesse momento, mas percebi que a atividade ia muito além disso. Fiz uma pauta que para mim foi muito importante, que foi a dos animais em zoológicos, um tema relevante para a comunidade em geral”, opina.

Mas apesar de todas as dificuldades que possam ter surgido durante o semestre, as matérias entregues mantiveram um nível elevado de qualidade. Inclusive, as imagens utilizadas, em sua maioria, não deixaram a desejar, ainda que não podendo ser realizadas pelos repórteres, em função do regime remoto imposto a todas as atividades da Unisinos. Então, contou-se com a sorte de ter entrevistados dispostos a colaborar ou com os bancos de imagens gratuitos, que antes eram utilizados somente em casos especiais.

Ser inumerável é ser singular

A Beta Geral repetiu a parceria do último semestre com o portal Inumeráveis, um memorial dedicado à história de cada uma das vítimas do coronavírus no Brasil. Falar de morte ainda é um tabu, e tal experiência se torna mais complexa quando é preciso ouvir alguém que perdeu recentemente uma pessoa próxima em circunstâncias tão trágicas. Contudo, esse era o desafio da atividade: fazer com que os repórteres entregassem, cada um, ao menos quatro obituários trazendo as histórias de vítimas que morreram em decorrência do vírus, contadas pela perspectiva de familiares e amigos. No total, foram 27 as histórias contadas.

O momento frágil exigiu a todos muito cuidado, tanto em relação aos alunos, diante da produção da atividade, quanto dos repórteres, durante a apuração das histórias publicadas. Afinal, estamos lidando com uma das dores mais profundas que a nossa alma pode sentir, em meio a uma pandemia na qual as mortes não cessam.

“Eu consegui fazer quatro obituários e foi uma experiência muito diferente. Eu até já tinha feito obituários quando trabalhava em jornal, mas escrevê-los em meio a uma pandemia foi uma experiência única e foi muito bonito ver as pessoas compartilhando e confiando na gente para contar as melhores memórias com aquelas pessoas, e todo o legado que elas deixaram. O processo foi muito enriquecedor”, conta a editora Martina.

Por outro lado, também ocorreram tentativas frustradas, como acontece em todo projeto de grande delicadeza. O repórter Émerson conta que tentou contato com uma família que havia perdido um dos seus para a Covid-19, e que optou por não seguir com o obituário. “Não me senti confortável em insistir para realizar o trabalho naquele momento”, confessa Émerson.

A atividade acadêmica de Beta Geral

Para muitos, a Geral é o momento de (re)conexão com o jornalismo diário, no qual o estudante de jornalismo tem a oportunidade de pôr os “pés no barro” e ter contato com as comunidades e o grande público. Por isso, foi um super desafio construí-la em isolamento. Mas vem dando certo e gerou belos frutos neste semestre.

“A Geral é fundamental para o jornalismo, pois resgata a função social da profissão. Algo que a gente nunca deveria ter perdido de vista, mas conforme avançamos no curso, acabamos deixando isso um pouco de lado. Ela mostra pra gente que existem histórias fantásticas, próximas de nós, e que todo mundo tem uma história a ser contada”, resume o repórter Guilherme Santos.

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