Pole dance trabalha o corpo e a autoestima

Atividade se popularizou nos últimos anos, mas praticantes ainda relatam preconceito

Laura Pavessi
Redação Beta
5 min readMay 28, 2019

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Tássia em sua sexta aula já consegue realizar movimentos tradicionais do pole dance. (Foto: Laura Pavessi/Beta Redação)

Com o avanço de pautas sociais feministas, a repressão em torno da sexualidade das mulheres tender a diminuir. Esse cenário explica a popularização do pole dance nos últimos anos e a conquista de novos adeptos da atividade, considerada esporte por alguns, arte por outros, mas ainda tida como um tabu para muitos. Nesse novo momento, no entanto, está em curso um processo de ressignificação que o distancia do mundo da prostituição.

O pole dance reúne influências de países como França, Canadá e Estados Unidos. Mas a sua origem está ligada ao Mallakhamb, uma prática indiana do século XII, que consiste em realizar movimentos de força e equilíbrio em um poste de madeira (com o auxílio ou não de cordas), sendo uma ramificação do yoga.

Apesar de ter sido reconhecido internacionalmente como esporte, em 2017, pela Global Association of International Sports Federation (Gaisf), até hoje o pole dance não obteve todos os requisitos para se tornar uma modalidade olímpica. Entretanto, no Brasil, ao final daquele mesmo ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou à atividade o título de esporte, classificando-a apenas como dança.

Mesmo assim, verifica-se a profusão de escolas e centros de prática de pole dance. Bianca Brochier, fundadora e professora da Velvet, escola de Porto Alegre, conta que quando começou a praticar existia só um local dedicado à atividade na capital. A história dela com o pole dance começou em 2011, na High Heels, a primeira escola no Rio Grande do Sul e em atividade até hoje. “Lá treinei dois anos e, então, minha professora convidou eu e minha amiga para ministrar aulas e ajudá-la na escola”, relembra.

Em 2013, Bianca já havia assumido várias turmas e feito outras formações e, até hoje, nunca parou de dar aulas. A Velvet, no entanto, só foi criada em 2017, quando ela quis ter o próprio espaço para trabalhar aspectos do pole dance ligados à dança e à sensualidade, considerando que outras escolas focam nos quesitos aeróbicos do esporte. O ambiente acolhedor da escola, que fica em uma sala no bairro Bom Fim, ilustra a visão da dançarina. Todo decorado com ilustrações vintage, tons vermelhos e frases empoderadoras, traz referências ao universo burlesco em cada canto para o qual se olhe.

A Velvet conta, hoje, com cerca de 50 alunas e cinco professoras e possui um calendário de aulas de segunda a sábado, atendendo, no máximo, cinco meninas por turma. Os homens são minoria e o perfil de quem procura a escola é bastante diversificado, compreendendo diferentes biotipos e faixas etárias.

“Geralmente as pessoas chegam aqui em busca de uma atividade mais prazerosa do que uma academia, mas com o objetivo de emagrecer ou tonificar o corpo. Com o passar do tempo, conforme vão se desafiando, se descobrindo, o foco muda. Então passam a curtir essa conexão com o corpo, esse bem-estar que não é dependente dos resultados físicos para existir.”

Ganhos além do físico

Para o corpo, a prática regular do pole dance proporciona uma melhora de força, flexibilidade e o efeito de um shape mais esculpido. O treino é bastante completo, trabalhando todas as áreas do físico. Para a mente, os ganhos podem ser ainda maiores, já que a autoestima é trabalhada, possibilitando que muitas alunas se descubram e superem a timidez e os complexos em relação à própria imagem.

Bianca entende que o preconceito com o pole dance ainda está longe de ser superado. Além do histórico da atividade estar relacionado ao universo das strippers, produtos como as novelas reforçam esse estereótipo. “Temos várias alunas que não postam nada relacionado nas redes sociais, seja por conta de trabalho ou por relacionamento, com medo desse julgamento”, conta. No entanto, ela defende que a demonização desse aspecto da atividade é errado. “Aqui defendemos que não é errado trabalhar como stripper, apesar disso ainda ser um grande tabu. Não fomentamos essa discriminação. Conhecemos meninas que atuam dessa forma e elas são bem-vindas”.

Além das aulas, a escola organiza o Resistance, festival que celebra os estilos sensuais do pole dance, reunindo participantes de diversos estados. Também participa do festival gaúcho, que acontece todos os anos. As alunas ganham uma oportunidade para se apresentar, muitas pela primeira vez, no bar Von Teese, quando as colegas comparecem para ficar na torcida e apreciar a performance.

Bianca recentemente ganhou o Classique, competição no Rio de Janeiro que acontece dentro da programação da Sexy Fair. Essa foi a segunda competição que ela participou.

Novos adeptos

Ainda começando a prática, Tássia Costa é uma das alunas da Velvet. Participando das aulas há um mês e meio, ela já consegue realizar movimentos na barra. O interesse começou com a necessidade de praticar uma atividade física, mas que não fosse academia. A proximidade do pole dance com o universo da dança e da ginástica também supre um desejo antigo que tinha de se envolver com esse tipo de esporte.

Até agora, ela encontrou no pole dance uma atividade completa e divertida, com reflexo no campo da autoconfiança. “Antes da minha amiga comentar comigo sobre pole dance eu imaginava que era algo de nicho, nem sabia que tinha aula disso. Pra mim, tem sido algo muito empoderador, me ensinado muito sobre meu corpo e me deixado mais à vontade com ele”, enfatiza.

A nova atividade, conta, foi recebida com muita empolgação pelos amigos, e com certa preocupação pelos pais. “A sociedade ainda é muito preconceituosa. Quando contei para o meu pai, ele perguntou ‘por que não foi fazer uma dança de salão?’, pois ficou preocupado com os julgamentos alheios”, lembra.

Se o pai de Tássia viu a nova atividade da filha com desconforto, Pedro Henrique Plácido Silva relata que sofreu ainda mais resistência por conta da família. Praticante do esporte há um ano, ele diz que, apesar da mãe e do irmão lhe darem força, o pai não recebeu bem a novidade.

Como Tássia, Pedro descobriu o pole dance através de uma amiga e se apaixonou logo na aula experimental. Apesar de ter participado do festival gaúcho e se apresentado duas vezes no Von Teese, o envolvimento com a atividade ainda é amador, já que um nível profissional requer muita dedicação e investimento financeiro. “Para mim, a possibilidade de experimentar uma atividade fora da heteronormatividade foi o maior atrativo”, revela. “Os movimentos, as figuras e as coreografias são bem femininas e eu gosto muito dessa experiência”, completa. O pole dance também transformou sua vida no âmbito profissional. “Desde que comecei a dançar meu processo criativo aflorou e meu trabalho como artista digital melhorou muito”.

Pedro é um dos alunos homens da Velvet e representa uma geração de praticantes cada vez mais diversificada, mas com a mesma paixão que marcou o pole dance ao curso de toda a sua história.

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