Programa de transferência de renda garante alimento e movimenta a economia em São Leopoldo

Investimento anual de R$ 4,8 milhões beneficia duas mil famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza com renda mínima de 200 reais por mês

Patrícia Wisnieski
Redação Beta
5 min readSep 8, 2022

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Programa de transferência de renda municipal auxilia famílias não contempladas por outros benefícios a nível Estadual e Federal. (Imagem: Renate Vanaga/Unsplash)

A alta inflação tem dificultado o acesso ao alimento por famílias em situação de vulnerabilidade social. Só neste ano, até julho de 2022, o preço da comida subiu 9,83%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O percentual é mais do que o dobro da inflação do período, que chega a 4,77%, conforme o Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA).

A inflação tem contribuído para o crescimento da fome e da miséria no Brasil, que já atinge mais de 33,1 milhões de pessoas no país. As informações do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19, publicado em junho, demonstram ainda que 58,7% da população convive com a insegurança alimentar em algum grau.

Pessoas em situação de pobreza, com renda mensal de até R$ 205,00 ou extrema pobreza, que recebem até R$ 105,00 por mês, são as que têm mais dificuldade para acessar os alimentos. Em São Leopoldo, segundo informações do Ministério da Cidadania e da Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (SENARC), 12.310 famílias se encontram em situação de extrema pobreza e outras 1.834 em situação de pobreza. Os dados, disponibilizados pela Secretaria de Assistência Social (SAS) da cidade, fazem parte das mais de 23 mil famílias inscritas no Cadastro Único.

Para tentar minimizar os impactos da crise econômica, o município tem investido em um programa local de transferência de renda. Criado para substituir a Rede de Ação Solidária, iniciativa desenvolvida durante a pandemia de Covid-19, o São Léo Mais Renda busca distribuir renda e incluir as pessoas em situação vulnerável na economia da cidade.

Implantado no mês de junho, o programa prevê a distribuição de R$ 200,00 mensais às famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza que, mesmo estando aptas a receber o Auxílio Brasil, não são contempladas pelo benefício federal. Além da compra de alimentos, a política pública permite que os beneficiários adquiram produtos de higiene e limpeza, gás de cozinha e também façam compras na rede de farmácias.

Para o secretário municipal de Assistência Social, Fábio Bernardo, criar uma política de transferência de renda municipal ajuda a desenvolver e impulsionar a economia. “Antes, com a Rede de Ação Solidária, nós distribuíamos uma cesta de alimentos que custava em média R$ 67,00. Mas, para isso, nós fazíamos uma licitação e sempre uma empresa de fora do município ganhava. Ou seja, tanto os impostos quanto os recursos iam para fora da cidade”, pontua Fábio. O secretário destaca que, com o São Léo Mais Renda, as pessoas recebem o cartão e fazem suas compras dentro do território leopoldense, nos comércios locais, de acordo com as suas necessidades.

“Nós entendemos que a renda precisa ser distribuída e não acumulada, principalmente para aquelas famílias que não tinham renda nenhuma. O município avançou, devido a uma série de medidas que tomamos, então é preciso dar condições para que a população mais pobre também participe do orçamento”, comenta Fábio.

O economista, com foco em Gestão Pública, Luis Roberto da Silva explica que os programas de transferência de renda têm dois impactos básicos: criar cidadania e impulsionar o sistema financeiro. “As pessoas recebem uma renda como um direito, não como um favor, passando a participar da vida social e ter acesso a bens e serviços que outras pessoas, de outras faixas de renda, também têm”, ressalta Luis. O economista reforça que o maior ganho desse tipo de política pública é dar cidadania para as pessoas que estão em situação vulnerável e que, na maioria das vezes, estão excluídas de forma geral da sociedade, pois além de não acessarem o mínimo, como a alimentação, não tem acesso ao trabalho, à educação, à saúde e ao transporte público.

“É preciso avançar no debate sobre a criação de uma renda básica para a cidadania, para que todas as pessoas tenham acesso a uma renda mínima que garanta um piso de remuneração. Assim, elas terão a cidadania garantida, mas também, dignidade econômica, podendo ter acesso a uma qualificação profissional, ao mercado de trabalho. Isso assegura que todas as pessoas tenham uma inserção, ainda que pequena, dentro da sociedade”, expressa Luis.

Investimento anual é de R$ 4,8 milhões

O São Léo Mais Renda prevê um investimento mensal de R$ 400 mil para garantir que duas mil famílias em situação de pobreza e extrema pobreza não contempladas por outros benefícios tenham uma renda mínima pelo prazo de 12 meses. Destas, 700 famílias já receberam o cartão e as outras 1300 serão contempladas com o benefício até o final de 2022.

Uma dessas famílias é a de Viviane da Silva Penas, de 39 anos. Ela foi beneficiada pelo programa na primeira entrega dos cartões, que ocorreu no dia 13 de junho, atendendo, além dela, outras 349 famílias. “Fiquei muito grata, muito satisfeita, por ter sido contemplada. No dia que recebi o cartão, fui muito bem acolhida”, expressa Viviane.

Viviane foi uma das primeiras contempladas pelo programa de transferência de renda da cidade. (Foto: Divulgação/Facebook Prefeitura de São Leopoldo)

A chefe de família considera que “programas como este são importantes para ajudar quem precisa e devolver a esperança de um amanhã um pouco melhor”. Ela conta que com o benefício pode voltar a incluir alguns produtos na alimentação dos seus filhos que há um tempo não faziam mais parte do cardápio. “Tem me ajudado muito. Voltei a comer uma ‘carninha’ uma vez por mês, meus filhos puderam voltar a tomar o Nescau que eles tanto queriam e que devido a situação, infelizmente, tive que cortar”, conta Viviane.

De acordo com o IPCA, até julho deste ano, o preço do achocolatado em pó teve um aumento de 14,48%. Já a carne apresentou um aumento de 42,6% durante a pandemia, segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Por isso, Viviane diz que o programa leopoldense deve ser exemplo para outras cidades: “eu fiquei muito contente em ser contemplada com o cartão, eu sei que é pouco, mas para mim vai ajudar muito”, salienta.

Com o alto preço da comida, a solução é investir em iniciativas comunitárias

O secretário de Assistência Social, Fábio Bernardo, reconhece que, sozinho, o São Léo Mais Renda não é suficiente para combater a insegurança alimentar. “A gente sabe que 200 reais mensais não são suficientes. Por isso, somamos essa iniciativa a uma outra: O São Léo Mais Comida no Prato, que reúne 30 cozinhas comunitárias espalhadas pela cidade”, ressalta.

Conforme Fábio, as famílias beneficiadas com a transferência de renda têm prioridade no atendimento nas cozinhas comunitárias pelo menos duas vezes por semana: “com essas duas iniciativas juntas aí sim temos um impacto positivo no combate a fome e a miséria em São Leopoldo”, salienta.

Fábio reforça que tanto o São Léo Mais Renda, quanto o São Léo Mais Comida no Prato estão previstos na legislação municipal, sendo uma política pública da cidade que ultrapassa a atual gestão. “Nós criamos esses programas como políticas permanentes da cidade, pois entendemos que são direitos básicos da população”, conclui.

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