O que o Brasil tem feito para erradicar o trabalho escravo
N o dia 30 de julho, Jair Bolsonaro anunciou que deseja mudar as regras que envolvem trabalho escravo para não prejudicar os empregadores. De acordo com ele, “têm juristas que entendem que trabalho análogo ao de escravo também é de escravo” e, por isso, ele defende que a legislação precisa dar uma “garantia ao empregador”. Para o presidente, existe uma linha tênue entre os trabalhos.
O trabalho escravo é uma grave violação de direitos humanos que restringe a liberdade e atenta contra a dignidade das pessoas. O crime, expresso no Código Penal, pode ser examinado a partir de trabalho forçado, jornada exaustiva, servidão por dívida e condições degradantes. Tudo isso faz parte da forma contemporânea de escravizar alguém. A Constituição Federal de 1988, veda, de forma absoluta, trabalhos forçados.
Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) 3107/2012, proposto pelo deputado federal Roberto de Lucena (PODE-SP), que determina que as empresas condenadas por trabalho escravo tenham o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) cassado e sejam privadas de exercer a atividade por dez anos.
O projeto está aguardando exame da Comissão de Direitos Humanos e Minorias para depois ser votado juntamente com o PL 5016/2005, proposto pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que determina modificações no artigo 149 do Código Penal, para tornar as punições de quem escraviza mais severas.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é a norma que protege os trabalhadores. A lei não traz uma definição sobre a questão, mas, assim como existe o Código Penal que analisa o crime, a CLT garante que os trabalhadores recebam os direitos trabalhistas aos quais foram privados enquanto eram escravizados.
De acordo com o coordenador da Comissão Especial de Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio Grande do Sul, Guilherme Wunsch, em entrevista à Beta Redação, ainda há sanções administrativas asseguradas pela Constituição Federal, como o artigo 243, que desapropriam bens de quem escraviza e os destinam para programas habitacionais e políticas públicas.
Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no artigo 5º.
Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei.
Fiscalização
Anualmente, o Ministério do Trabalho por meio da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) divulga a chamada lista suja, que é o cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores à condições análogas à escravidão. A lista, atualizada em maio deste ano, denuncia 202 empregadores, entre empresas e pessoas físicas. Seis são do Rio Grande do Sul.
De acordo com Guilherme, o problema é que para as grandes empresas, as sanções são pequenas e de baixo custo. “Aqui no Brasil, a gente não tem essa cultura como tem no sistema norte-americano. As chamadas punitive damages, que são aquelas condenações em valores exorbitantes. No Brasil não se pode enriquecer sem causa. Jamais um único trabalhador ganharia uma condenação de dois milhões, por exemplo. Essas condenações costumam ser coletivas, então esse dinheiro vai para ações que combatem o trabalho escravo”, explica.
“É muito difícil ocorrer uma condenação criminal, empresa fechar ou a marca perder mercado. E isso não é um problema do Direito, é um problema da nossa sociedade. A gente quer consumir o tempo todo. A marca tem poder”, afirma.
Para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), trabalho forçado ou obrigatório é “todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de qualquer penalidade e para o qual ele não se ofereceu de espontânea vontade”.
Se o mercado de trabalho em esfera mundial é marcado pela precariedade, há setores sociais mais atingidos, como mulheres e jovens, e os países de industrialização tardia são um solo ainda mais fértil para a precarização das relações de trabalho.
Para denunciar o crime de trabalho escravo, entre em contato com o Ministério Público do Trabalho. A denúncia é anônima e pode ser feita pelo site.