Foto: Juliana Borgmann / Beta Redação

Quanto vale o seu dinheiro?

Mesmo com a taxa Selic em baixa, juros bancários seguem altos e a inadimplência é uma das responsáveis pelo aumento

Juliana Borgmann
Redação Beta
Published in
5 min readMar 28, 2019

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O Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central do Brasil, decidiu, no dia 20, manter a Taxa Selic — a taxa básica de juros — em 6,5% ao ano. Essa taxa influencia no consumo e também nos empréstimos bancários, já que, quando ela está mais baixa, diminui a captação dos bancos.

“A taxa Selic é fixada a cada reunião do COPOM tendo em vista a obtenção de uma certa meta de inflação — definida pelo Conselho Monetário Nacional — para o ano calendário. Para 2019, a meta de inflação é de 4,2% para a variação do IPCA”, explica José Luis Oreiro, professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB).

Gráfico: Banco Central

A taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia)serve como uma referência para outras taxas de juros, e para compensar outros investimentos corrigidos por ela. Na prática, quando a taxa Selic sobe, os juros que são cobrados em operações financeiras, empréstimos ou em procedimentos envolvendo cartões de crédito, ficam mais altos, desestimulando o consumo.

A Selic tem um histórico de variações. Em janeiro de 2014, a taxa cobrada era de 10,4% ao ano; em maio, 11%. A maior alta ocorreu em 2015, atingindo 14,2% ao ano, mantendo-se nessa média até outubro de 2016, quando começou a cair. No entanto, os consumidores acabam pagando bem mais caro já que, mesmo com a taxa Selic em uma mínima histórica de 6,5%, os juros bancários seguem altos em 2019.

Juros bancários, os grandes vilões

Segundo dados divulgados pelo Banco Central, em média, a taxa de juros que é cobrada no cheque especial atingiu 315,6% ao ano em janeiro de 2019. Os juros rotativos dos cartões de crédito, por exemplo, chegaram a 286,9% ao ano.

O juro rotativo acontece quando a pessoa não paga o valor integral da fatura do cartão de crédito. Por exemplo, existe a opção de pagar o valor mínimo. Se o consumidor não tiver como quitar o valor total e pagar apenas uma parte, o restante é automaticamente financiado. No mês seguinte, o valor restante da fatura é lançado com juros.

Já o cheque especial permite que o consumidor gaste um limite definido pelo banco em caso de emergência ou caso a pessoa não tenha dinheiro em conta corrente. Mas para isso, são cobrados juros. “Os juros cobrados pelos bancos são o preço que os bancos cobram pelos empréstimos que eles concedem para as empresas e para os consumidores. Os juros cobrados aos consumidores são, via de regra, muito mais altos do que os juros cobrados para as empresas”, esclarece Oreiro.

Taxa Selic x Juros Bancários

O professor Oreiro explica que a elevação da taxa Selic leva a um aumento dos juros bancários porque reduz a oferta de crédito por parte dos bancos. “Quando o Banco Central aumentar a taxa Selic então a rentabilidade das aplicações que os bancos fazem em títulos da dívida pública aumenta relativamente a rentabilidade dos empréstimos bancários”, esclarece.

Ele ainda complementa que esse fator leva os bancos a direcionar recursos que poderiam ser aplicados em empréstimos para a compra de títulos públicos, ou para as operações compromissadas — venda de títulos da dívida pública do Banco Central para os bancos comerciais, com um compromisso de recompra desses mesmos títulos após um certo número de dias.

“Dessa forma, o aumento da taxa Selic reduz a oferta de crédito bancário, levando assim a um aumento das taxas de juros sobre as todas as modalidades de crédito oferecidas pelos bancos comerciais”.

Para o futuro, ele explica que são necessárias mudanças na política monetária e nas relações entre os bancos. “Enquanto o setor bancário brasileiro for concentrado do jeito que é, acho muito difícil ocorrer uma redução dos spreads (a diferença entre juros que os bancos cobram quando você faz um empréstimo e os juros que eles pagam quando você investe dinheiro) e dos juros bancários”.

Nesse caso, Oreiro argumenta que, se a participação dos bancos públicos (BB e CEF) na oferta de crédito for reduzida de forma significativa, os valores médios dos juros bancários e spreads irão aumentar, visto que os bancos públicos operam com linhas de crédito mais baratas.

Inadimplência: o motivo da alta dos juros bancários

Segundo o Banco Central, um dos fatores que influenciam nos juros cobrados pelos bancos é a inadimplência. Em junho de 2016, enquanto o spread bancário — a diferença entre os juros cobrados pelos empréstimos dos bancos aos seus clientes e os juros que os bancos pagam pela captação de recursos — era de 31,8% ao ano para a pessoa física, para a pessoa jurídica girava em torno de 12%. Em parte essa diferença se explica pelo fato de que a taxa de inadimplência na pessoa física (4%) é maior do que a da pessoa jurídica (3%).

Segundo uma Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), em fevereiro de 2019 cerca de 9,2% das famílias não terão como pagar as dívidas. O principal motivo de dívida neste mês, em específico, é proveniente dos cartões de crédito (78,5%). Segundo levantamento feito pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), 25% dos usuários de cartão de crédito entraram no juro rotativo ao fim de 2018.

A Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e o SPC Brasil indicam um aumento no primeiro mês de 2019, de 61,4 para 62 milhões de pessoas negativadas. O número é equivalente a cerca de 29,7% da população brasileira.

Para a jornalista Cristiane Abreu, o cheque especial precisa ser entendido como medida de emergência. Depois de conseguir quitar todo os débitos do cheque especial, ela afirma que o melhor é nem ter o cheque especial disponível em conta, porque os juros são muito altos. “Eu tenho, já usei da forma errada, como se fosse uma extensão do meu salário, e não foi uma decisão muito sábia. Acumulei juros altíssimos e fiquei sem emprego para pagar. Quando vi, estava pagando juros sobre juros, um horror”, conta.

Já o advogado Bruno Alves, especialista em direito tributário, acredita que para não ter problemas com os juros bancários, a melhor forma é não utilizar o cartão de crédito ou a opção de crédito pré-aprovado. “Invista seu dinheiro onde ele tenha liquidez comprovada e que possa te devolver esse valor com toda certeza, caso você precise dele de volta”, complementa

Outra boa opção para evitar a inadimplência, segundo o professor Oreiro, é realizar compras à vista, ou investir em uma ‘poupança prévia’, no caso de compras de bens duráveis. “Dessa maneira o consumidor irá economizar nos encargos financeiros. Não é exagero dizer que quem compra uma geladeira no crediário em 24 meses acaba pagando o preço de três geladeiras, mas só leva uma pra casa”, exemplifica.

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