Emigração para outros estados é gargalo da economia gaúcha

Rio Grande do Sul atrai poucos jovens de outras regiões, e pesquisador diz que não haverá aumento da população em idade produtiva

Matheus Vargas
Redação Beta
7 min readNov 20, 2019

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Com Bibiana Faleiro

O Rio Grande do Sul tem a menor taxa de crescimento populacional do Brasil, segundo o Departamento de Economia e Estatística (DEE). Para agravar a situação, o estado tem perdido habitantes para o movimento migratório dentro do país. Em 2018, a população gaúcha teve um recuo de 0,12% (13.686 pessoas) em razão do resultado negativo entre emigrantes e imigrantes. Ou seja, emigrantes de outras regiões não veem o RS como atrativo para morar e trabalhar.

De acordo com pesquisa da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão do Estado, se não fossem as trocas migratórias nacionais ao longo das décadas, o RS teria uma população com 696,8 mil pessoas a mais (o que representava 6,2% de sua população) no ano de 2015. Sem contabilizar os descendentes de gaúchos que nasceram nos outros estados brasileiros após a migração, além das trocas migratórias internacionais, que elevariam o tamanho dessa perda populacional.

Para o pesquisador do DEE Pedro Zuanazzi, esse é o grande problema do Rio Grande do Sul. “O RS tem uma saída populacional de jovens por migração, mas não é nada muito diferente do que ocorre na maioria dos estados brasileiros. A grande pergunta a ser respondida é: por que o RS não atrai os jovens de outras regiões?”, questiona Pedro.

Para se ter uma ideia, Santa Catarina, nosso vizinho, registrou no ano passado um aumento de 0,41% em sua população por atrair novos moradores e perder poucos residentes. Segundo o DEE, SC é o estado que mais atrai gaúchos, seguido por Paraná, Mato Grosso, São Paulo e Mato Grosso do Sul.

Apenas estados do Nordeste perdem mais moradores que o RS.

Zuanazzi lista dois principais motivos para o Rio Grande do Sul atrair poucas pessoas de outros estados: a posição geográfica e a ausência de uma política de portas abertas. “É muito mais fácil as pessoas migrarem para um estado que está perto da sua região do que para um que está muito distante. O povo brasileiro que mais migra está no Nordeste e, geograficamente, o RS está muito longe dessas regiões”, afirma.

Pedro Zuanazzi é pesquisador do Departamento de Economia e Estatística (Foto: Carolina Greiwe/Ascom Seplag)

Segundo o pesquisador, o investimento em iniciativas para atrair pessoas não é uma prática visível há décadas no RS. “Não tínhamos essa preocupação porque a taxa de fecundidade ainda era acima da taxa de reposição, mas dos anos 2000 para cá, está abaixo. A possibilidade da falta da mão de obra futura começa a se tornar uma realidade”, explica.

Esse é um sinal de alerta para os gaúchos. De acordo com Zuanazzi, o crescimento econômico de um estado se dá pela produtividade de trabalho, ou seja, o quanto em média cada trabalhador está produzindo pelo número de trabalhadores. “Até quatro anos atrás, o número de pessoas em idade produtiva aumentava a cada ano, ocasionando o bônus demográfico, que é quando o número de pessoas em idade ativa economicamente é superior ao de inativos, mas isso não vai mais acontecer”, frisa.

O pesquisador acredita que, a curto prazo, o estado não vai mais ter um aumento da população em idade de trabalhar. Esse fato pode fazer crescer o número de empregos, mas, a longo prazo, a única maneira de se ter crescimento econômico após o fim do bônus demográfico é aumentarmos a produtividade de trabalho. “Como se faz isso? Investindo em educação, estradas, em máquinas e equipamentos para que os trabalhadores consigam produzir mais. Temos exemplos de países com população muito mais envelhecida que a nossa que já enfrentaram o fim do bônus demográfico e, mesmo assim, conseguem ter crescimento econômico, como é o caso do Japão, Alemanha e Dinamarca”, ressalta.

Guilherme Stein acredita que o estado atrairá mais imigrantes quando houver um maior dinamismo na economia (Foto: Rodrigo W. Blum/Unisinos)

O professor do Programa de Pós-graduação em Economia da Unisinos Guilherme Stein acredita que o RS atrairá mais imigrantes quando houver um maior dinamismo na economia gaúcha. “Precisamos tornar o ambiente de negócios mais favorável, temos que estar mais abertos, facilitar a vida de empresários e de quem quiser empreender”, discorre.

O professor também identifica outros desafios, como a política de atração de investimento do governo gaúcho e os problemas econômicos há tempos enfrentados. “As dificuldades fiscais que o governo está passando comprometem os investimentos públicos e também afugentam possíveis parcerias público-privadas que poderiam ser feitas.”

Stein encerra dizendo que nosso Estado tem setores de grande potencial, como uma rede de bons hospitais, universidades reconhecidas nacionalmente, além dos setores tradicionais, como agropecuária, metal-mecânica etc. “Tudo isso tem capacidade de atrair mais pessoas, mas vamos estar competindo com o centro do país. Precisamos potencializar nossas vantagens em um comparativo com os outros estados, e duas maneiras que podemos pensar nisso é melhorar o ambiente de negócios aqui no RS e retomar as obras de infraestrutura que vão dinamizar a economia como um todo. Aí a gente pode esperar uma maior atração de pessoas”, finaliza.

Para o economista e professor da Univates Samuel Martim de Conto, o Rio Grande do Sul tem um histórico de desenvolvimento, mas esta imagem está ficando no passado. “Nossa educação já não é das melhores do país, as grandes cidades gaúchas viram os níveis de violência e insegurança aumentarem, sendo que o Estado (Governo gaúcho) que é o responsável por isso, e não consegue nem pagar os salários em dia”, destaca.

Nesse cenário, Conto percebe que não só pessoas físicas, mas as empresas também estão optando pela migração para outros estados. Outro fator que ele destaca e que contribui para esse êxodo é o alto valor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do Rio Grande do Sul, um dos mais altos do país. Além do valor do imposto, ele aponta a burocracia de licenciamento ambiental, o fato da liberação para negócios ser demorada, e a infraestrutura estar deficitária, fazendo com que o custo de empreender no RS seja superior em comparação a outros estados. “Por isso, os jovens estão saindo para procurar melhores condições de vida”, acredita.

O especialista também destaca que que nas décadas de 1960 a 1980 a migração agrícola teve como principais destinos Santa Catarina (SC), Paraná (PR), Mato Grosso (MT), Mato Grosso do Sul (MS) e Goiás (GO). Hoje, no entanto, as pessoas migram para quase todos os estados, não se importando com a distância e, inclusive, para o exterior.

Mercado de trabalho competitivo puxa gaúchos

Acostumada a viver em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, a estudante de economia Caroline Krüger de Azevedo, 23 anos, procurava novas oportunidades de estudo e trabalho. Por isso optou pela cidade de São Paulo, onde foi aprovada pela Universidade Mackenzie. Hoje também é estagiária na empresa Publicis Brasil.

Apesar de sentir saudades da família, considera essencial estar na cidade pelas oportunidades de emprego e aperfeiçoamento oferecidas em sua área, além da grande autonomia. “No Rio Grande do Sul, eu morava em uma cidade pequena e sempre me senti muito presa e dependente de todos. Aqui eu estou sozinha e por minha conta”, destaca Caroline. Além disso, ela acredita que quem escolhe estudar e trabalhar na cidade adquire um currículo mais extenso. “As opções de trabalho aqui são maiores e mais específicas, algumas só existem em capitais ou aqui em SP”, explica.

Mesmo assim, considera o custo de vida elevado na cidade, fato que, na sua opinião, é compensado pela característica multicultural do município e pelo constante movimento. Ela também tem vontade de trabalhar na área de bolsa de valores, oportunidade que só São Paulo oferece no país.“Além disso, muitas multinacionais das empresas grandes e conhecidas a nível nacional e mundial estão aqui”, frisa.

Taís foi uma das gaúchas que se mudou para SC. (Foto: arquivo pessoal)

A estudante de fisioterapia Taís Dotto, 21 anos, cursou seu ensino fundamental e médio em Lajeado, no interior do Rio Grande do Sul, onde a família ainda reside. Mas, ao fazer o vestibular, optou por se inscrever para Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), na pela qual foi aprovada, mesmo com maior concorrência em comparação ao RS.

Há três anos, ela vive em Araranguá, onde a UFSC possui um campus em grande crescimento. Ela uniu a vontade de estudar fora com o amor pelas praias, e esse foi um dos norteadores de sua decisão.

No tempo em que reside em Santa Catarina, observou que o estado é mais tranquilo e receptivo, além de boa qualidade de vida. Taís percebe que suas economias melhoram, já que os alimentos e produtos que consome no dia a dia são consideravelmente mais baratos por conta dos impostos serem mais baixos.

Quanto à oferta de empregos, a estudante considera variável, dependendo das cidades. “Existe uma oferta maior em grandes centros e menor e mais difícil em centros menores. Mas percebo que, em geral, há um crescimento das cidades daqui”, acredita.

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