Uma das modalidades mais comuns do remo é o Single Skiff, que abriga apenas um remador com dois remos. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Remo para todos

Por meio de relatos de atletas do remo, conheça a história do clube de regatas ativo mais antigo do Brasil e entenda os movimentos para aumentar a popularidade do esporte na região

Artur Colombo
Redação Beta
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8 min readMay 15, 2018

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Com 130 anos de existência e sendo considerado o clube de remo ativo mais longevo do Brasil, o GPA — Clube de Regatas Guaíba de Porto Alegre, aposta em projetos sociais e em uma política de “Remo para todos” para compor suas equipes e alavancar a popularidade do esporte.

Segundo a Confederação Brasileira de Remo, o esporte ganhou caráter competitivo com os ingleses no século 19, com a criação de clubes às margens do Rio Tâmisa, que corta Londres, além da realização de regatas entre universidades, com barcos distribuídos em classes segundo sua estrutura, peso e comprimento.

Fachada do clube na Rua João Moreira Maciel 470, Porto Alegre/RS. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

O GPA foi fundado em 21 de novembro de 1888 por um grupo de jovens liderados por Alberto Bins, que se uniram para praticar o remo nos moldes do que era então praticado na Alemanha e fundar um clube, constituindo, assim, um importante marco desportivo na Capital. Hoje, o GPA tem como presidente Lourenço Meirelles, que comanda o clube desde 2016. O clube possui 160 sócios, tendo como objetivo a dedicação ao remo olímpico em todas as suas categorias, sendo elas separadas por sexo, idade, número de competidores, peso dos competidores e tamanho dos barcos.

Vídeo produzido para a comemoração dos 125 anos do clube, trazendo um pouco da história de fundação do GPA e sua trajetória ao longo do tempo. (Vídeo: Divulgação/Clube de Regatas Guaíba Porto Alegre)

A busca por um esporte mais popular

O instrutor Fellipe Sartori é um dos responsáveis pela escolinha de remo e pré-equipe do GPA. Segundo ele, essas categorias são os primeiros estágios na formação dos atletas no clube, e para onde são direcionados antes de entrarem para as categorias principais, divididas por idade: júnior, júnior b, sênior e master. Ao falar sobre a visibilidade do remo hoje, Sartori cita a popularidade do esporte no Rio de Janeiro e em São Paulo, e sobre uma dificuldade urbanística que ele considera um grande entrave para a visibilidade do remo.

“No Rio, há remo no Centro da cidade. Ali tu com certeza vais ter um pouco mais de visibilidade e, consequentemente, um pouco mais de praticantes. Em São Paulo, tu tens um espaço para o esporte dentro da USP, também com bastante praticantes e uma certa visibilidade. Agora, em Porto Alegre, temos um problema: o muro do Cais Mauá. Isso esconde o remo. Sendo assim, o remo acaba sendo praticado por quem já era praticante antes ou acabou conhecendo através de outras pessoas”, observa.

Com duas semanas de aulas experimentais no chamado “tanque”, os jovens atletas são orientados a remar na água. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Apesar disso, Sartori afirma que o clube procura reverter esse quadro. “Sabendo dessas deficiências do esporte aqui na região, o GPA possui um projeto um pouco diferente. Nós não procuramos apenas desenvolver atletas, a gente possui uma política de ‘remo para todos’. Então, aqui você vai ver que temos pessoas de meia-idade, meninos e meninas muito novos e principalmente bastante mulheres, algo muito importante porque a inclusão das mulheres nesse esporte parece algo bem à parte no Brasil.”

Projeto Estrela Guia

Segundo o vice-presidente de esporte do GPA, André Donadio, os 160 sócios hoje apoiam não só o clube, mas patrocinam também o Estrela Guia, um dos principais projetos da política de “remo para todos” do clube. Segundo Donadio, esse projeto teve início em 2007, graças a uma parceria de isenção de impostos com a prefeitura. Devido a uma série de problemas, a parceria foi quebrada em 2014, mas, mesmo assim, o clube tocou o projeto por conta própria.

Donadio estima que 500 jovens já passaram pela ação, que tem como objetivo buscar jovens de áreas carentes do entorno do clube e oferecer a eles uma ajuda de custo, como alimentação, uniforme do clube, custeio de viagens para as competições, além do treinamento no turno inverso dos estudos, algo que Donadio frisa como muito importante. “O clube exige que eles estejam estudando para participar, porque, além de formar atletas, buscamos também um trabalho de formação de caráter”, acrescenta.

Trinta jovens participam hoje de treinamentos no clube. Destes 30, 15 fazem parte das equipes regulares. Segundo Donadio, esse número era maior quando o Estrela Guia possuía apoiadores, mas para manter o projeto apenas com o apoio dos sócios foi necessário reduzir os participantes. Mesmo com uma equipe menor, os jovens das categorias júnior (remadores com no máximo 18 anos) e júnior b (remadores com no máximo 22 anos) foram bicampeões estaduais no ano passado.

No dia 12/05, o clube promoveu um galeto comemorativo à conquista do bicampeonato sul-americano de Remo Master. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Experiências no remo e a popularidade do esporte

Os atletas Jaderson Cardoso, 17 anos, e Gabriel Cardoso, 16, são oriundos do projeto Estrela Guia e hoje competidores das equipes oficiais da categoria júnior. Moradores do bairro Farrapos, em Porto Alegre, iniciaram a carreira no remo há 3 anos, e afirmam que antes do projeto nunca haviam ouvido falar do remo, mas que ao participar começaram a gostar do esporte. Mesmo tendo isso como carreira hoje, Gabriel aponta que há dificuldades a serem superadas e que no começo não foi nada fácil. “Às vezes está friozinho, tu estás na tua cama e tem que acordar às cinco horas da manhã. No começo foi difícil, mas depois tu vai gostando e acaba se acostumando”, conta.

Sobre o remo em nível nacional, os atletas afirmam que acompanham as competições, mas esperavam que elas tivessem maior visibilidade. “Lá no Rio o esporte é bem mais conhecido, por causa da lagoa no centro, já aqui parece escondido. Isso acaba gerando algumas confusões, como confundir remo com canoagem. Acontece muito, mas não é a mesma coisa”, afirma Jaderson.

Os jovens comentam também sobre a rivalidade com outro clube da região, o GNU — Grêmio Náutico União. O clube, fundado em 1º de abril de 1906, possui quatro sedes, mais de 60 mil associados e cerca de 450 colaboradores, uma estrutura maior que o clube Guaíba. Isso não abala os jovens, que comparam a rivalidade à de Internacional e Grêmio, mas dizem, brincando, que em competição o Guaíba se equipararia ao Grêmio, que vive uma fase bem melhor.

Da esquerda para a direita, os atletas Brandhon Tatsch, Guilherme Nunes, Jaderson Cardoso, Gabriel Cardoso, Anderson Soares, Silvio dos Santos e Fabrício dos Santos. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Brandhon Tatsch, campeão por quatro anos seguidos do Sul-Americano de Remo Master e remador na categoria sênior pelo clube (categoria para remadores a partir dos 19 anos, onde se encontram os atletas de alto rendimento), afirma que países como a Argentina possuem uma grande tradição de fomento a esse esporte, algo que, segundo ele, não acontece muito no Brasil. Mas admite, timidamente, que uma evolução pode ser percebida.

“Há um avanço. Se contarmos a curto prazo, uns 5 anos por exemplo, o Brasil evoluiu bastante no esporte. Na minha visão como atleta hoje, o que impede o Brasil de crescer ainda mais nesta questão é a nossa administração. Se o governo olhasse mais para a parte desportiva como produção nacional, como outros países desenvolvidos fazem, as coisa seriam diferentes”, opina o atleta.

As conquistas do clube se mesclam com a história do esporte

Um dos remadores mais experientes do GPA, Roberto diz que o remo, se for realizado de forma correta, é um ótimo esporte para melhorar o condicionamento físico. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Se hoje há problemas de visibilidade, de falta de apoio e de dificuldades para manter a gestão dos clubes ainda viva no Brasil e no Rio Grande do Sul, é preciso lembrar que nem sempre foi assim. Segundo Roberto Schulz, 70 anos, um dos remadores mais antigos do GPA, o esporte possui uma história de altos e baixos.

Schulz começou a remar em 1965. Segundo ele, foi uma época áurea para o remo nacional. “Nesta época, final dos anos 60, começo dos anos 70, houve uma espécie de reforma do remo nacional, onde se abriu o remo para todas as idades. Naquela época era tudo muito diferente, só homens participavam, não havia categorias para crianças, apenas adultos participavam, os barcos eram todos de madeira e muito mais pesados. Após essa reforma, algumas coisas mudaram, e isso aumentou a popularidade do remo”, relata.

Roberto explica que os equipamentos são guardados em uma garagem náutica e que nos dias de hoje os barcos são bem mais leves que antigamente, feitos de plástico reforçado. (Foto: Artur Colombo/Beta Redação)

Schulz lembra que depois de competir aos domingos, dia tradicional de competição de remo, ele e amigos iam até as bancas na segunda-feira pela manhã para comprar a folha esportiva do Correio do Povo e ali conferir, entre as notícias de vários esportes, a cobertura das provas de remo do fim de semana. “Era comum abrir o jornal e ver uma página inteira só sobre a competição de remo. Vendia que era uma loucura”, conta, empolgado.

Schulz conta também que, antes de estabelecer uma certa popularidade nos anos 1970, o remo gaúcho teve algumas dificuldades, como, por exemplo, o estabelecimento das sedes. Ele explica que a sede do clube Guaíba mudou três vezes de local antes de se firmar na Rua João Moreira Maciel, local hoje conhecido como Parque Náutico de Porto Alegre e que abriga outros clubes tradicionais da região. Segundo ele, a primeira garagem do clube era localizada na Rua Sete de Setembro, mas com o crescimento da cidade e o aterro do porto, os clube foram levados a mudar de local. A segunda sede foi na Avenida Voluntários da Pátria, momento em que, segundo Schulz, o remo gaúcho esteve em alta.

Schulz explica que na sua época os clubes eram tradicionalmente formados por famílias e ao longo do tempo isso foi se perdendo, tornando todo o processo do esporte mais burocrático e formal. Mesmo assim, ele acredita que, o retorno de políticas como o “remo para todos”, que o Guaíba proporciona, pode levar a um resgate do espírito dos clubes. Ele também destaca que projetos sociais como o Estrela Guia estão renovando os clubes: abrem espaço para jovens que se comprometem com o esporte, aumentam o nível das competições e levam a popularidade do remo para lugares que nunca se imaginou chegar.

Serviço

Endereço: Rua João Moreira Maciel 470, Porto Alegre/RS

Telefone: (51) 3342–2197

Email: gpa@gpa1888.com.br

Horários:

Secretaria: terças e quintas, das 8h às 12h e das 14h às 17h30; sábados, das 8h às 10h30.

Escola de remo: Terças, quartas e quintas, das 6h às 10h e das 14h às 17h; segundas e sextas, das 14h às 17h; sábados das 8h às 10h.

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