Show de talento e inspiração em Estância Velha

A programação da Semana Municipal da Pessoa com Deficiência inclui apresentação de três músicos, sendo dois deficientes visuais

Stephany Foscarini
Redação Beta
5 min readAug 27, 2019

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“Se alguém
Já lhe deu a mão
E não pediu mais nada em troca
Pense bem
Pois é um dia especial”

Foi com esta estrofe do compositor e músico Duca Leindecker que começou o show do trio com o nome provisório “Os três mosqueteiros” (ainda não decidiram o nome oficial e por enquanto usam este justamente porque são três integrantes), na tarde de sábado (24), na Praça 1º de Maio, em Estância Velha. Já na passagem de som que durou cerca de 10 minutos, quem estava mais longe se aproximou para prestigiar o evento, totalizando em média 100 pessoas.

A largada pro show foi dada quando o vocalista Luís Antônio pronunciou: “Boa sorte meninos. Foi”. A apresentação durou cerca de duas horas e animou o público estanciense, inclusive os familiares dos artistas.

Durante todo o show, os dois vocalistas brincaram com os espectadores, pedindo que eles cantassem em conjunto. Na música “Casa da floresta”, de Nanan, solicitaram palmas para acompanhar o ritmo da canção. As duas horas de apresentação contou com composições de diversos artistas, como Armandinho.

O trio manteve a animação durante o show todo. (Foto: Stephany Foscarini)

Perfil de cada um

O grupo é formado pelo vocalista e tecladista Gabriel Benhur Schuck, 24 anos, pelo baterista Luiz Felipe Ferreira, 24 anos (ambos deficientes visuais), e por Luís Antônio Machado, 34 anos, também vocalista e responsável pelo violão. A apresentação fez parte da Semana Municipal da Pessoa com Deficiência de Estância Velha.

Luiz Felipe e Gabriel mostrando o que sabem na bateria e teclado. (Foto: Stephany Foscarini)

Luiz Felipe é carioca e o interesse de vir para o Rio Grande do Sul surgiu por causa da sua namorada que mora na região. Não conhecia nada no Sul, mas tinha um desejo: espalhar a música. Por este motivo enviou mensagem em um grupo de músicos no Facebook procurando alguém para dividir o palco. Gabriel respondeu o recado.

Porém, só foram se conhecer pessoalmente durante uma apresentação no Instituto Acessibilizar, em Porto Alegre, que tem o objetivo de resgatar artistas anônimos com algum tipo de deficiência. A primeira bateria ganhou aos 14 anos e desde lá foi amor à primeira vista. O estilo que mais gosta é o sertanejo e chegou a tocar as noites cariocas. Ele mora com a namorada em Sapiranga.

Gabriel, de Novo Hamburgo, fã de música alemã, entrou cedo para o mundo da música. Apenas com cinco anos de idade, ganhou o seu primeiro teclado. Muitos são os instrumentos que sabe tocar: gaita de boca, sanfona, pandeiro, harmônio e piano. Desde criança realiza apresentações e já passou por diversas cidades: Ivoti; Campo Bom; Teutônia; Torres; Gramado; Novo Hamburgo e Estância Velha. O incentivo maior foi da família, principalmente do pai. “Para mim ele é o cara. Tinha coleção de disco de vinil e fita cassete. Sempre me apoiou, assim como meu vô que cantava”, destacou.

O currículo do rapaz é recheado. Estudou na escola de música, Sol e Cia, em Novo Hamburgo. Fez curso de Composição e Arranjo e Técnico em Música nas Faculdades EST, em São Leopoldo. Atualmente ele está no 6º semestre de Produção Fonográfica, na Unisinos. Hoje trabalha como auxiliar de informática na EST.

Foi na EST que conheceu Luís Antônio. “Foi um achado tão grande encontrar estes dois. Me dei conta que nós três poderíamos tocar juntos e foi aí que convidamos o Luís Antônio para tocar em alguns eventos com nós”, explicou.

Segundo Gabriel, as características do trio são perfeccionismo, parceria, amizade e respeito. Luís Antônio complementou dizendo que o grupo se dá super bem e não acontecem intrigas. “Ah, mas eu vim para começar as tretas”, brincou Luiz Felipe.

Luís Antônio mora em São Leopoldo. É professor de técnica vocal de violão no Centro Musical OR na mesma cidade. Não só isso é cantor lírico, este é o estilo preferido. Além desta atividade, dá aulas particulares e leva a vida assim: ensinando e fazendo apresentações em bares, festas e eventos em geral. “É uma honra tocar com estes caras. Quando eu olhei para eles e me dei conta de tudo que fazem. Parei pra pensar que devo reclamar menos da vida”, ressaltou, deslumbrado com o trabalho dos colegas.

Ainda aproveitou para lamentar a falta de respeito com os músicos. “Me perguntam no que eu trabalho eu respondo que sou músico. Tem gente que me pergunta: ‘Tá, mas tu faz outra coisa além de tocar música?’. Isso é triste. Ser músico é profissão”, queixou-se.

Luís Antônio interagia com o público o tempo todo. (Foto: Stephany Foscarini)

Um pequeno momento antes do show

A presidente da Associação de Pais e Apoiadores das Pessoas com Deficiência de Estância Velha (APAPDEV), Kélen Calgaroto, marcou presença antes do espetáculo começar. Ela disse que todos são capazes de ir atrás das capacidades que possuem. “Nosso município pode oportunizar momentos como este. Que seja o primeiro de muitos”, comentou, emocionada.

Kélen chamou todas as mães e logo após o restante dos integrantes que compõem a APAPDEV. Por fim, passou a presidência para Andreia Cristiane Clarimundo Damaceno e a vice-presidência para Diva Rosa Piaia Augustinho.

Equipe da APAPDEV. (Foto: Stephany Foscarini)

Por trás das cortinas

A Semana Municipal da Pessoa com Deficiência de Estância Velha é organizada pelo Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência do município. De acordo com a presidente do Conselho, Daiane Leite Pastoriza, a semana voltou a funcionar devido a um pedido da prefeita da cidade, Ivete Grade. “Foi uma preocupação dela com os direitos das pessoas com deficiência”, esclareceu. Ela também afirmou que este tipo de instituição não é obrigatório em todas os municípios.

Para Daiane, o principal objetivo do Conselho é propor políticas voltadas para pessoas com deficiência e garantir seus direitos. Funciona com reuniões mensais e é aberta para a comunidade em geral. “Serve como um órgão com a atribuição de oferecer melhorias na vida destas pessoas e mostrar o que fazem”, declarou.

Conforme dados de 2018 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população estimada de Estância Velha é de 49.345 pessoas. As informações do IBGE de 2010 mostraram que o número de deficientes visuais são 71 pessoas. Aqueles que apresentam grande dificuldade somam 796. Já os estancienses com alguma dificuldade totalizam 5.092.

Opinião da repórter

Qual a sua desculpa para não aprender algo que tanto quer? Já parou para pensar? Concordo com o Luís Antônio que ao conhecer Gabriel e Luiz Felipe, nos damos conta que devemos reclamar menos da vida. É lindo de ver o trabalho que realizam e a dedicação para fazer dar certo. São exemplos que devem ser seguidos. O tempo que fiquei com eles dei boas risadas e percebi que nasceram com um talento sensacional.

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