“The English Game” resgata as origens do futebol

Série retrata o surgimento do esporte na Inglaterra e as transformações sociais do século XIX

Laura Hahner Nienow
Redação Beta
4 min readApr 20, 2020

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A série The English Game, produção original da Netflix, de 2020, nos leva à Inglaterra do final do século XIX e, em apenas seis episódios, nos apresenta uma trama costurada pelo futebol e pelas transformações sociais da época. O futebol era um esporte jogado pela elite britânica, ou pelos “cavalheiros”, como os jogadores afortunados gostavam de dizer.

Time dos universitários de Eton College. (Crédito: The English Game/Divulgação)

A série acompanha o time Old Etonians, dos universitários de Eton College. Liderado por Arthur Kinnaird, jovem inglês de família aristocrática, a equipe comandava os campeonatos da época. Em paralelo, a série narra o surgimento de outro time formado por trabalhadores fabris, liderado por Fergus Suter, um escocês da classe operária, e por seu colega de campo e melhor amigo, Jimmy Love.

Os três protagonistas da série são personagens históricos da vida real e foram responsáveis pela profissionalização do futebol britânico. O caso específico de Sueter, quando ele foi transferido do time Darwen para o Blackburn, relata o fato de ele ter sido o primeiro jogador remunerado na história do esporte.

O futebol, em sua origem, era amador e praticado pela elite britânica. As regras eram estipuladas pelos próprios integrantes. Em 1863, foi fundada a Football Associaton (FA), organizada por membros das maiores equipes, e que já controlavam as práticas do esporte. A partir dali, o futebol ganhou novos rumos.

Equipe Darwen, com os operários Fergus Suter e Jimmy Love. (Crédito: The English Game/Reprodução)

Na opinião do jornalista Mário Marcos de Souza, a série da Netflix é bem didática sobre o começo do futebol. “Melhor ainda se juntar a série com o livro Pirâmide Invertida [do autor Jonathan Wilson], sobre a evolução das táticas. Aí, dá para entender bem por que os jogadores escoceses eram superiores aos ingleses no início”, aponta. De acordo com Mário Marcos, foram os escoceses que descobriram e aprimoraram a técnica do passe e, assim, driblavam a marcação dos ingleses, cujos times, lá nos primórdios do jogo, se movimentavam em blocos, com resquícios do rugby. “É uma bela série”, avalia.

O bibliotecário e colecionador de livros sobre futebol, além de, claro, amante da modalidade, Társis Salvatore, afirma que o futebol inglês realmente tem origem no rugby. “Não chegava a ser violento, mas era muito viril, e isso eles mostram bem na série. Uma coisa meio futebol de crianças, e os escoceses chegaram com estratégias e passes”, conta ele, que também é editor do site Papo de Quadrinho, sobre Cultura Pop.

The English Game também conquistou Társis pelo modo como a produção romantizou os personagens. Os três protagonistas da série -Arthur Kinnaird, Fergus Suter e Jimmy Love- são figuras reais, embora não se tenha muitas informações sobre o terceiro deles.

Time Blackburn na final do campeonato. (Crédito: The English Game/Divulgação)

Para Társis, a série traz um panorama muito próximo do que foi o futebol britânico. O campo, que era basicamente um pasto, os uniformes e as botinas utilizadas nas partidas são exemplos descritos na produção.

Outro detalhe que não passa despercebido é a taça das competições, muito parecida com a real. De fato, na época, havia apenas uma taça, que ia sendo revezada entre os clubes vencedores. “Eu morei na Inglaterra e lá é o verdadeiro país do futebol. Isso de o Brasil ser o país do futebol é uma construção”, comenta, principalmente por aqui o futebol ser bonito visualmente.

“Os próprios ingleses chamam o futebol brasileiro de beautiful game”, conta Tarsis, isso porque a Copa de 1970 foi a primeira a ser transmitida a cores e nela pode ser vista, com mais nitidez, a beleza do futebol brasileiro. “Na Inglaterra, aos finais de semana, eu ia ao parque e existiam seis times masculinos e três femininos de várzea. Mas, assim, o futebol de várzea deles é com uniforme, com trave, com técnico, com massagista”, relembra. Com os apontamentos de Társis, podemos entender que o amor pelo futebol não é exclusivo de nenhum país, tampouco a tradição dos jogos. O esporte é global e ultrapassa hegemonias.

National Football Museum, em Manchester, Inglaterra, conta história do esporte. (Crédito: National Football Museum)

Társis avalia outra diferença, se não a principal, entre brasileiros e ingleses quando o assunto é futebol: a memória. “No Brasil, quando você vai em um Museu do Futebol, não há nenhuma menção à violência, como se nunca tivesse morrido alguém por causa do futebol. No museu de futebol de Manchester, eles mostram que os caras usavam porretes com prego, canivete, soco inglês, e tu vê isso lá, retratado no museu”, acrescenta.

Para Mário e Társis, quem é fã de futebol, que curte mesmo a história, a série é uma excelente recomendação.

Confira o trailer da série:

Trailer da série, disponível na Netflix. (Crédito: Netflix/Divulgação)

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