Mensagem de paz segue marcada nos muros grafitados por Darz

Artista morto por engano, em 2015, tem sua obra preservada em Porto Alegre

Alexsander Machado
Redação Beta
5 min readNov 5, 2019

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Retrato de Darz em edifício na Cidade Baixa (Foto: Arquivo Pessoal)

Quem passa em frente ao Largo Zumbi dos Palmares, na Avenida Loureiro da Silva, bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, se depara com uma pintura de 15 metros de um homem com barba, usando boné preto. A imagem ilustra Max Willian da Rosa, um dos grafiteiros mais lembrados de Porto Alegre, morto a tiros, em 2015, por engano. Na ocasião, Max comemorava o aniversário do amigo Leandro, que também veio a falecer em decorrência dos disparos.

Conhecido como Darzone, Max nasceu em 1987, no bairro Santana, na Zona Leste de Porto Alegre. Foi ali que a paixão pelo grafite começou. Na Escola Estadual de Ensino Fundamental Apeles, era elogiado pelas professoras, pois gostava de estudar ainda que, às vezes, escrevia nas classes da sala, o que as deixava irritadas.

Na infância, seu caderno de estudos era repleto de pinturas e grafites. Infelizmente, com o tempo esse caderno se perdeu e, junto com ele, muito da arte de Darzone também se perdeu. Amigo dos tempos de colégio, Samuel Machado, 33 anos, recorda que Darz foi o irmão que não teve. Ele admirava, especialmente, a sua dignidade e humildade.

“O Darzone era um cara de muitos amigos. Sempre estava na volta de pessoas e era amigo de todos. O que me deixava mais louco era a sua sinceridade e humildade, pois se ele não gostava de algo, resolvia suas pendências na hora. Na infância, vivíamos juntos para todos os lados. Se precisava ir ao mercado, nós íamos juntos. Deus havia me enviado um irmão de coração e um companheiro para tudo’’, comenta Samuel.

Antes de finalizar o Ensino Médio, Darz começou a criar novos e criativos desenhos de grafites que o tornaram uma figura conhecida e admirada. Samuel comenta, inclusive, que o Darz era considerado o “professor” da turma de grafiteiros. “Desde o colégio ele fazia desenhos. Cada dia criava algo, como uma máquina de tatuagem com controle remoto. O cara era um professor pardal, pois sempre tinha alguma criação para fazer, além de colocar coisas velhas para funcionar’’, relata Samuel.

Inscrição de anjo era marca registrada do artista

O grafite é considerado por alguns como vandalismo e, para outros, uma maneira de expressar as suas críticas na forma de arte urbana. Era exatamente isso o que Darz procurava através de seus desenhos, pois ele expressava seus sentimentos com uma spray nas mãos e produzindo arte nas paredes.

Em 2012, conseguiu uma autorização para pintar o muro do Instituto Psiquiátrico Forense Doutor Maurício Cardoso, na Avenida Bento Gonçalves, em Porto Alegre. A pintura, com a inscrição do seu nome, empregava tintas spray e látex em seis cores diferentes. A forma particular da grafia era uma marca registrada do artista.

Os desenhos do artista seguem até hoje preservados no muro da instituição (Foto: Arquivo Pessoal)

Em 2014, Darz foi chamado a registrar a sua arte nos muros da Escola Estadual de Ensino Fundamental Professor Edgar Luiz Schneider, no bairro Intercap, também em Porto Alegre. A ideia era mostrar a sua arte para os mais de 600 alunos do colégio, destacando que o grafite não representa uma forma de poluição. Em homenagem ao artista, a pintura foi restaurada este ano pelos amigos de Darz.

O artista utilizou cinco latas de spray de cores diferente e terminou o desenho em um dia (Foto: Arquivo Pessoal)

Ygor Erguy da Rocha, 28 anos, era amigo de Darz e recorda que, com o passar do tempo, o artista foi espalhando a sua marca em diferentes muros e paredes de Porto Alegre. Como marca registrada, Darz costumava pintar uma auréola acima da letra “A” de seu nome como forma de transmitir uma mensagem de paz.

“Ele desenhava o anjo e a palavra paz em todos os muros que grafitávamos, pois queria que as pessoas estivessem sempre com essa mensagem em suas memórias”, pontua Ygor.

Darz escrevia o seu nome, associado ao desenho de uma coroa, como forma de transmitir uma mensagem de paz (Foto: Arquivo Pessoal)

Protestos nos muros da cidade

Após um ano da morte de Darz por dois motoqueiros que buscavam identificar outra pessoa, um grupo de grafiteiros se juntou para pintar o muro do Instituto Psiquiátrico Forense, com autorização consentida através da mediação de uma funcionária da instituição. Na parede, variando estilos e grafias, os grafiteiros escreveram os nomes ‘’DARZ’’ e ‘’DARZ VIVE’’ como forma de manter a obra e o legado do amigo presentes na paisagem urbana da capital.

Muro na Avenida Bento Gonçalves (Foto: Arquivo Pessoal)

Pintura e ação beneficente

Em um final de semana de 2017, cerca de 30 artistas grafiteiros se reuniram para estampar o rosto de Darz em um prédio situado em frente ao Largo da Epatur, na Avenida Loureiro da Silva, na Cidade Baixa. Com a ajuda de um andaime, o rosto do artista tomou forma após dois dias de intenso trabalho e ocupou 15 metros de parede.

“A ideia foi justamente pintar em um lugar que as pessoas olhassem para o rosto e se perguntassem sobre quem é aquele homem’’, comentou Samuel Machado.

No mês seguinte à morte de Darz, os amigos e familiares também criaram o coletivo Anjos do Bem, uma organização beneficente focada na promoção da cultura da paz nas comunidades e periferias de Porto Alegre.

A ideia da organização é lembrar as ações educativas que Darz fazia pela cidade, como oficinas de grafite para adolescentes, sempre transmitindo mensagens positivas. Além disso, o grupo pinta as placas de PARE, enfatizando os dizeres: “nunca PARE de sonhar”.

O projeto Anjos do Bem tem uma página no Facebook. Lá é possível localizar todas as ações e homenagens feitas para Darz, que segue como um personagem presente nas ruas, nos muros e na memória de Porto Alegre.

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