Valter: “É necessário desburocratizar a cadeia econômica”

Dentro da série de entrevistas com concorrentes à prefeitura de Porto Alegre, a Beta Redação conversou com Valter Nagelstein, do PSD

Dora Beirão
Redação Beta
8 min readNov 4, 2020

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O vereador Valter Nagelstein (PSD) concorre à prefeitura de Porto Alegre. (Foto: Débora Ercolani/CMPA)

Valter Nagelstein, natural de Bagé (RS), iniciou sua carreira política nos anos 2000, com 30 anos. Desde então já foi secretário de Indústria e Comércio da Capital, em 2010, e presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, em 2018. Atualmente, cumpre seu terceiro mandato consecutivo como vereador.

Valter, 50 anos, concorre à prefeitura de Porto Alegre pelo Partido Social Democrático (PSD), mesmo partido de seu vice, João Carlos da Luz Diogo.

A entrevista com Valter para a cobertura especial das Eleições 2020 foi produzida pela Beta Redação com suporte institucional da Unisinos. A pauta teve a colaboração da comunidade universitária, que, em consulta por meio virtual, apresentou 22 sugestões de perguntas, das quais cinco foram selecionadas e editadas para apresentação a todos os candidatos.

Confira a seguir a entrevista, concedida por telefone no dia 15/10.

No seu plano de governo, o senhor promete ampliar a rede de assistência em saúde mental na Capital. Como seria feita essa ampliação?

Uma das coisas que percebo visitando creches municipais é a falta de atenção para as crianças com deficit de atenção ou outros transtornos. Na Secretaria Municipal da Educação são poucas equipes que cuidam dessa questão. A primeira meta pretendida é ampliar o número de profissionais que cuidam da parte dos transtornos mentais. Dessa forma pretendo ampliar inicialmente esse atendimento, depois vou avaliar como está ocorrendo o atendimento dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) que existem atualmente e a demanda existente na cidade. Ou seja, eu pretendo avaliar, uma vez eleito, como está ocorrendo o funcionamento dos casos frente às demandas que existem hoje nos municípios e se elas estão sendo corretamente atendidas.

Quais serão suas políticas para diminuir as barreiras à igualdade de gênero, conforme sinaliza em seu plano de governo?

Garantindo acesso à informação e igualdade, através de estímulos na forma que for possível e garantindo que as leis que existam hoje sejam de fato cumpridas.

Sua campanha tem mostrado especial atenção ao microempreendedorismo. Que medidas tomará para fomentar esses negócios em seu governo em um cenário de crise pós-pandemia?

De todos os candidatos à prefeitura atualmente, o único que tem uma experiência concreta com o microempreendedorismo sou eu, inclusive eu fui responsável por um programa municipal de microcrédito, o Credimicro, onde arquitetamos um plano de negócios, buscamos recursos com o BNDES e criamos uma linha de crédito para micro e pequenos empreendedores. Eu pretendo reconstruir, a partir da experiência que já temos, esse projeto.

“De todos os candidatos, o único que tem experiência concreta com microempreendedorismo sou eu”

Além disso, a partir da compra da produção da agricultura familiar nós conseguimos colocar na merenda das crianças de Porto Alegre o bolinho de peixe, proveniente da produção dos piscicultores da cidade. Acredito que é necessário desburocratizar a cadeia econômica, facilitando, dando cursos de qualificação, além do crédito, para dar aos microempreendedores noções básicas como de fluxo de caixa, de empreendedorismo e de marketing. Isso é possível de fazer, e já foi feito por mim anteriormente, com parcerias com instituições como o Sebrae, por exemplo.

Sua campanha promete apresentar “o maior programa de segurança pública de Porto Alegre” para enfrentar a “violência urbana e doméstica”. Quais medidas estão dentro das atribuições do Município para fazer esse enfrentamento?

A segurança pública é sempre tratada no Brasil apenas pelo viés do combate à violência e repressão, e isso é um equívoco, a violência e a criminalidade precisam ser primeiramente prevenidas para depois serem combatidas. Pretendo trabalhar a prevenção com programas sociais, atuando desde a área da saúde, com uma política de planejamento familiar, depois, na questão da pré-escola e da escola, oferecendo uma maior qualidade de educação, com tablets para uma educação híbrida e, por fim, na questão da adolescência, qualificando os convênios que já existem hoje, oferecendo oficinas de esportes e artes para adolescentes que estão sem ocupação.

“Violência e criminalidade precisam ser primeiramente prevenidas para depois serem combatidas”

No que diz respeito à violência doméstica, especialmente contra crianças e mulheres, irei reestruturar a Secretaria Municipal da Segurança, criando uma parte específica para atender a esse tipo de demanda, com condutas que chamamos de “pronta resposta”. Ou seja, quando houver ocorrências, teremos equipes disponíveis da Guarda Municipal para irem até o local, dar o atendimento correto e encaminhar o agressor até a área judiciária.

O senhor apresentou, como vereador, o projeto do Escola Sem Partido em Porto Alegre, mas essa proposta não aparece em seu plano de governo. Por quê?

Eu não quero estabelecer um contencioso nesse momento, é uma proposta polêmica e um fenômeno que existe. O fato de Porto Alegre estar no 25º lugar no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica [Ideb] do Brasil é resultado de uma ideologização dentro do ensino público. Porto Alegre está nesta posição mesmo pagando os melhores salários de professores da rede pública do Brasil. Em uma jornada de 40 horas semanais os professores da rede pública da cidade recebem R$ 10 mil reais. Esse salário não condiz com a nossa posição no Ideb.

“Não quero que a questão do Escola Sem Partido tire do horizonte o principal objetivo: fazer uma educação verdadeiramente de qualidade”

É necessário fazer um diagnóstico da situação e estabelecer metas, pactuadas com os professores, além de criar um programa de meritocracia. Nesse contexto, não é interessante entrar na polêmica do Escola Sem Partido, é uma posição minha, eu acho errada a doutrinação ideológica dentro do ambiente escolar, a escola não serve para formar militantes, embora deva estimular o pensamento crítico. Ou seja, não quero que a questão do Escola Sem Partido tire do horizonte o principal objetivo: fazer uma educação verdadeiramente de qualidade.

QUESTÕES DA COMUNIDADE UNIVERSITÁRIA

Caso fosse prefeito durante a eclosão da pandemia do novo coronavírus, o que teria feito igual ou diferente das decisões do atual governante?

No dia 24 de março, eu escrevi no site do Diego Casagrande o artigo “Em tempos de coronavírus, a vaca ou o carrapato”. Eu sustentava que não poderíamos usar um remédio tão forte para matar o carrapato que matasse a vaca também. Sempre defendi o equilíbrio entre a economia e a vida. Na posição de prefeito, eu faria um cálculo do número de habitantes da região metropolitana, uma estimativa do que já havia ocorrido em outras cidades do mundo e prepararia uma estrutura hospitalar que garantisse que houvesse um local para atender as pessoas infectadas. Criaria restrições a atividades, por exemplo baladas e eventos de grandes aglomerações, mas manteria atividades econômicas funcionando.

Em Porto Alegre, ficamos parados de março a junho, com o comércio fechado e com pouquíssimos casos de UTI. Em nenhum momento ao longo desse período nós chegamos a 100% das ocupações dos leitos da UTI, nós tivemos menos ocupações de leitos no ano de 2020 do que no ano passado, quando não havia Covid. Isso mostra que essa questão foi mal gerenciada. Nesse período foram fechadas 60 mil empresas em Porto Alegre e o colapso não foi maior por causa do auxílio do governo federal, que garantiu que famílias mais pobres e necessitadas recebessem o auxílio de R$ 600.

“Criaria restrições, mas manteria atividades econômicas funcionando”

Além disso, houve ajudas humanitárias, com as quais eu me envolvi muito desde março. Se a sociedade não tivesse se mobilizado na forma de ações solidárias e humanitárias, se não houvesse tido esse apoio de recurso do governo federal, pelas ações do prefeito de Porto Alegre nós teríamos colapsado e, provavelmente, teríamos um problema de desordem social.

Qual sua proposta para enfrentar a crise que estamos vivendo no transporte público?

Ninguém tem a solução para isso, é um problema que há 30 anos se arrasta. Nem o PT da Manuela ofereceu uma solução. A que eles propuseram foi uma tragédia para a cidade, fizeram uma intervenção de um ano nas empresas e foram condenados a pagar milhões para as companhias de ônibus. No governo Fortunati foi feita uma licitação, e isso também não está dando certo, pois atualmente temos uma passagem cara, um nível de gratuidade que chega a um terço dos usuários do sistema e não existe um critério de renda para a gratuidade.

“Teremos que encontrar um subsídio para o transporte coletivo. De onde sairá? Ninguém tem a resposta hoje”

Eu não tenho desejo de mexer na questão da passagem para os estudantes, mas acho que algumas outras gratuidades poderiam obedecer um critério de renda, por exemplo, sendo essa uma forma de baixar o valor da passagem. Além disso, teremos que encontrar um subsídio para o transporte coletivo. De onde sairá esse subsídio? Ninguém tem a resposta hoje. Eu gostaria de, nos seis primeiros meses do meu governo, caso seja eleito, buscar incessantemente alternativas e soluções, ouvindo especialistas a respeito do assunto, e depois utilizar mais seis meses para pactuar com a sociedade, com a Câmara de Porto Alegre, com os setores empresariais, com os trabalhadores e sindicatos essa solução. Então, no final do primeiro ano, propor uma solução para a cidade.

Porto Alegre tem um grande número de pessoas em situação de rua. Como pretende tratar dessa questão?

Hoje existem 5 mil pessoas na Capital em situação de rua e essas estimativas estão muito além dos números oficiais. Pretendemos retomar os grupos multidisciplinares de abordagem, reestruturar cursos profissionalizantes, articular juntamente com o SINE Municipal de Porto Alegre o encaminhamento para o mercado de trabalho e, nos casos onde haja necessidade, auxiliar aqueles que precisem de assistência psiquiátrica, juntamente com os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs). E essa terá que ser uma política permanente.

Quais as suas prioridades para a rede municipal de ensino e como planeja, no cenário da pandemia, o retorno às aulas em 2021?

Eu prevejo um retorno às aulas de forma híbrida, embora existam estudos que dizem que a taxa de mortalidade em crianças é apenas uma fração. O grande problema é se as crianças seriam ou não vetores da doença. Esse assunto é extremamente polêmico pois tudo está funcionando, as praias e os supermercados estão cheios, e escolas não podem abrir.

“O que não pode no ano que vem, como ocorreu neste ano, é não haver aulas para crianças das redes públicas”

Por isso, é necessário caminhar para um ensino híbrido: as aulas voltam, as crianças recebem um equipamento eletrônico adequado, os professores são qualificados para fazer o ensino a distância e, se for identificado um surto na escola, ocorre a interrupção da aula presencial naquela unidade, as aulas continuam de forma híbrida e, passadas duas semanas, retornam as aulas presenciais. O que não pode ocorrer no ano que vem, como ocorreu neste ano, é não haver aulas para as crianças das redes públicas.

Como pretende lidar com o problema da falta de vagas nas creches municipais?

Esse é um grande problema. Atualmente temos a falta de 10 mil vagas nas creches municipais. Para isso, recorreremos ao planejamento familiar, pois atualmente existem muitas gravidezes indesejadas e isso pressiona o sistema de creches municipal. Além disso, utilizaremos uma parte do recurso que virá do Ideb e aumentaremos a oferta de creches comunitárias na cidade, creches contratualizadas com a prefeitura, que ofereçam o ensino público, gratuito e não estatal.

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