RPG e os nossos feminismos

Cris Viana
Biblioteca das Ancestrais
4 min readMar 8, 2020

Tinha planos de fazer uma arte pra esse dia, mas acordei com a mente divagando muito sobre o RPG e os nossos Feminismos… não sou a mulher das palavras, mas bora lá!

Essa semana um amigo perguntou no Twitter sobre As Brumas de Avalon, e eu chamei amigas que gostam muito dos livros (dava pra fazer uma tese de mestrado sobre os livros com essas duas rs) e eu apenas pontuei que tentei ler na adolescência mas desisti pois no primeiro livro tanto Morgana quanto Guinevere eram muito inseguras e isso me incomodou, pois não eram o tipo de representatividade que eu procurava naquela época. E todas ficamos nos questionando quais eram as protagonistas femininas literárias seguras de si naquela época. Bom, só o “protagonista feminina” já é um complicador, foi difícil encontrar, e no meu caso, eu realmente não lembrei de nenhuma, mas lembrava de tê-las encontrado em desenhos (lembrei logo da She-ha) e em jogos (eu amava Tomb Raider), mas esqueci de outra referência muito importante… o RPG!

Comecei a pensar em todas as mulheres que eu e minhas amigas criamos nessas histórias e como elas influenciaram quem eu sou hoje. Sempre fui uma pessoa MUITO insegura, a ponto de que quando olho pro passado eu vejo parte da minha vida adulta como se eu não fosse a protagonista dela… louco né? Mas na mesa de RPG eu tive a oportunidade de experimentar ser outros tipos de mulher e protagonizar essas histórias. Essas personagens me ensinaram muito, passaram por situações fantásticas que me prepararam pra vida real. Me mostraram que tem hora que a gente precisa largar a insegurança levantar a espada e chamar a vila toda pra lutar, se não, tudo estará perdido.

Daí que ano passado comecei a jogar em Stream, e isso tudo está sendo uma experiência nova e diferente pra mim, especialmente no que diz respeito à representação da mulher em uma mídia aberta ao público. Hoje, minhas heroínas não são perfeitas como na minha adolescência, elas tem ali seus problemas e suas inseguranças, e tenho consciência que minha formação colocou o machismo em mim e que eu sem querer posso acabar refletindo isso nas personagens.

Isso não quer dizer que eu viva com medo ou em alerta de fazer algo errado, mas cria em mim questionamentos muito importantes. Eva, minha personagem na campanha A Serpente de Duas Cabeças já passou por situações bastante complexas. Eva é uma espiã de 1933, uma coisa que ela usa como arma é o fato dos homens sempre subestima-la (além de ser uma exímia atiradora), mas isso não quer dizer que ela se sujeite ao machismo.

Um pouco sobre a Eva.

Na S12 ocorreram duas cenas que foram muito importantes pra mostrar isso. Eva estava dirigindo um carro no interior dos EUA, ela mulher e estrangeira, foi parada por policiais e eles aproveitaram para tentar diminuí la e dificultar a vida dela, ela tentou manipular a situação e recebeu um “Cala a boca mulher” (frisando que, dentro do contexto e dentro do nosso contrato social, esse tipo de cena já estava prevista, e eu achei ótimo ter que lidar com ela), a situação em que se encontrava e a missão que ela tinha não permitia que ela enfrentasse o policial, e dois outros personagens homens americanos, Norton (clássico rico) e Gillet (ex militar), conseguiram lidar com a situação e isso obviamente deixou ela muito revoltada.

Chegando no hotel ela estourou e foi tomar um ar. Gillet (personagem que a Eva está apaixonada, porém em negação naquele momento) foi atrás dela seguindo o conselho do Norton para aproveitar o momento de fragilidade e “dar em cima dela”, Kazz lindamente aplicando ali um tropo clássico pra gente chutar. Assim que o Gillet chega, Eva fala como aquela situação toda era injusta e o Gillet pede desculpas por ela estar passando por aquilo e apoia ela, escuta ela, em certo ponto dessa cena, rola um Momento, os olhares de ambos se cruzam e nesse hora muitas coisas estavam em jogo pra mim e pra Eva.

Será que um beijo poderia virar um silenciador do discurso de Eva? Qual era o papel do personagem masculino ali? Eu tive que parar e pensar, o Gillet não estava dando em cima dela ele estava lá apoiando-a, dando razão aos sentimentos dela, sua raiva não era uma “histeria”, ela tinha toda razão pra se sentir assim, e ele reconheceu isso. E ali ela viu não apenas que o Gillet também gostava dela, mas que tipo de homem ele era, e admitindo que estava apaixonada, ela o beija.

Depois de muitos anos de RPG a oportunidade fazer esses questionamentos, interpretar esse tipo de cena e de criar essa mulher, é incrível pra mim como jogadora e feminista ❤ e nesse dia 8.03, vamos lembrar dessas nossas heroínas que contribuíram contribuem tanto na nossa construção como mulher.

E ai, qual personagem de RPG foi ou é uma inspiração pra você?

Quer conhecer essa campanha maravilhosa da Serpente de duas cabeças? tão aqui os links:

Spotify, Youtube e Twicth

Vem assistir a gente ao vivo, Hoje as 20hs no Nopertwo!

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Cris Viana
Biblioteca das Ancestrais

Designer editorial no seu Estúdio Chaleira, viciada em percussão, gatos, suculentas e RPG.