O papel do design como reflexo das mentalidades

Thaís Pires Carneiro
Blend_Juicing Ideas
5 min readFeb 7, 2017
Crédito: Unsplash

Atualmente, observa-se um esgotamento do termo Design e sua ramificação em diversas áreas do conhecimento e em diversificados segmentos. Mas, qual seria a real vocação do termo e porque está ganhando tamanha importância em nossa sociedade? Por que falamos tanto em design?

O Design e a função do designer, em sua origem, associa-se à ideia de forma, estética e funcionalidade, e define-se pelo conjunto de pensamentos derivados de processos criativos que geram materialidade. Entretanto, não podemos excluir desta definição o quanto a área é capaz de absorver expectativas que surgem a todo o momento.

Se pararmos para observar nossa sociedade, vemos que nos moldamos a partir de choques dialéticos visíveis e invisíveis que produzem constantemente narrativas mais ou menos favoráveis de serem assimiladas nas dinâmicas sociais e compor o espírito do nosso tempo.

De acordo com o observatório de tendências Trends Observer, estamos diante de um grande paradigma que se define pelo conceito de Hipermodernidade Líquida — fusão entre as teorias do sociólogo Zygmunt Bauman e do filósofo Gilles Lipovetsky. Ou seja, as atuais mentalidades e os seus comportamentos associados apresentam um caráter volátil, marcada por rápidas e profundas mudanças nas estruturas sociais.

Somos hoje seres líquidos e complexos, impulsionados pela tecnologia e regidos pela lógica de hiperconsumo. Essa mesma volatilidade se aplica na composição de nossas identidades, que busca por diferenciação e assume um caráter mutante, sendo nossas escolhas de consumo também definidores de nosso estilo de vida e caráter. Portanto, categorizar os indivíduos e compreender seus anseios tornou-se uma tarefa árdua.

Crédito: WGSN

Essa nova dinâmica, plural e veloz, abre luz ao protagonismo do Design como refletora do tempo presente. A área é capaz de conceber processos criativos que levam em consideração resolver problemas, observar, prototipar, testar e, principalmente, construir de forma conjunta com seus potenciais usuários e acaba, por consequência, gerando objetos e ritos que atuam como respostas ao espírito do nosso tempo.

O Design propõe inovações que preveem os desejos do futuro e inspira o mercado tradicional, atuando como manifestador das tendências e, portanto, o espelho das mentalidades pulsantes.

O Design, quando cria objetos, pode traduzir de forma bastante eficiente demandas de atores sociais e seus respectivos nichos, tribos e recorte geracionais, como por exemplo a criação do Berço SNOO. Esse berço desloca-se da sua função de mobília para um objeto de Design assinado por Yves Behár, que confere ao objeto não somente beleza estética, quanto tecnologia de monitoração do bebê acoplada e aparelhada aos smartphones dos pais. É a materialidade dos desejos dos nativos digitais e Millenials que agora estão concebendo suas famílias.

Créditos: happiestbaby.com

Design é a visualização criativa e sistemática das diferentes funções de objetos de uso e sua adequação às necessidades dos usuários ou aos efeitos sobre os receptores.

(Schneider, Beat, 2010)

Já quando o Design é empregado como processo, sua metodologia se desdobra através de formas colaborativas do pensamento. O objetivo é encontrar soluções para problemas e testar de forma rápida e contínua os desejos e carências dos atores sociais através de prototipagem e testes de aceitação. Podemos observar a riqueza do processo e aplicabilidade dessa dinâmica para todos os tipos de segmento: Design Thinking e Design Estratégico para processos criativos, publicidade, branding, comunicação, para soluções sociais e culturais, Design Urbano para reconstrução de cidades e urbanização consciente no âmbito da arquitetura, Design de Processos para engenheiros, entre inúmeras outras aplicabilidades.

Design significa ter e desenvolver um plano, um projeto, significa designar. É trabalhar com a intenção, com o cenário futuro, executando a concepção e o planejamento daquilo que virá a existir. Criar, desenvolver, implantar um projeto — o Design — significa pesquisar e trabalhar com referências culturais e estéticas, com o conceito da proposta. É lidar com a forma, com o feitio, com a configuração, a elaboração, o desenvolvimento e o acompanhamento do projeto.

(Moura, Mônica, 2003)

Além disso, observa-se a transversalidade do tema, uma vez que exercem seu ofício profissionais multifacetados, como artistas, publicitários, comunicólogo, engenheiros, físicos, sociólogos, filósofos, antropólogos, especialistas, técnicos, matemáticos, programadores, empreendedores, designer, arquitetos, ativistas e qualquer profissional que interaja com o ofício criativo ou áreas processuais. Também deve ser incluído pessoas leigas, o próprio consumidor ou potenciais usuários como parte dessa engrenagem, uma vez que são parte da cadeia de criação da área.

É importante observar, portanto, a riqueza do Design como espelho de uma sociedade, mas também como meio de transformações de modelos engessados, uma vez que abarca nossos desejos mais profundos e confere aspecto transgressor e questionador de tudo que já existe e já conhecemos pelas convenções sociais.

É uma construção conjunta do que queremos usar no presente que permite um processo permanente de adequação e aperfeiçoamento, conferimos aos resultados sempre um estágio beta.

Para muitos, o Design é a arte mais vivaz e popular do presente. Ainda mais, é um fenômeno de cultura de massas, que marca as percepções e que, por isso, participa de modo decisivo na constituição de gostos generalizados. O Design configura a comunicação e cria identidades. É um agir consciente para produzir uma ordem sensata e com isso, é parte da nossa cultura.

(Schneider, Beat, 2010)

Em tempos complexos que estamos repensando o status quo e ponderando nossa relação com a tecnologia, meio-ambiente, uso do tempo e bem-estar, faz sentido o protagonismo do Design que responde aos anseios dos homens perante uma sociedade. A área é, portanto, uma rica amostra de traços de identidade(s) e estética que refletem uma época, dentro de um recorte específico no tempo.

Artigo escrito para a cadeira de Sociologia e Comunicação de Tendências da Pós Graduação em Comunicação e Tendências da Universidade de Lisboa.

Links adicionais e Referências:

Documentário Design The New Business (2012) por Zilver Innovation. Disponível em: https://vimeo.com/33531612

Projeto What Design Can Do (2011). Disponível em: http://www.whatdesigncando.com/brazil-2016/

Projeto Story Hopper por Dave Hakkens (2015). Disponível em: https://story-hopper.com

Matéria Harvard Business Review Design Thinking comes os a age por Jon Kolko (2015). Disponível em: https://hbr.org/2015/09/design-thinking-comes-of-age

Matéria para o portal eletrônico da USP Intervenções no Design na Educação por João Paulo Freire. Disponível em: http://www.usp.br/aun/exibir?id=5877

Matéria para o portal eletrônico Wired sobre a nova série do Netflix Abstract: the art of design. Disponível em: https://www.wired.com/2017/01/editors-letter-february-2017/

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