Entendendo Market Caps e Unlock de Tokens no Universo de Ativos Digitais

Guilherme Pimenta, CFA
Block3 Research
Published in
6 min readJan 5, 2023

O market cap é um conceito simples e muito importante para analisar um ativo e fazer o seu valuation, no entanto é um dos que gera mais confusão devido à algumas peculiaridades do universo cripto, gerando análises equivocadas pelos investidores com frequência. Os dois principais conceitos que precisam ser entendidos são market cap circulante (“MC”) e market cap diluído (“DMC”).

O MC nada mais é do que o preço do token multiplicado pela quantidade de tokens em circulação (“circulating supply”). Já o DMC considera a quantidade total de tokens existentes (“total supply”), o que incluí os tokens em circulação e os que ainda estão travados ou não foram distribuídos — as medidas, portanto, não são comparáveis. O MC representa o valor de mercado do ativo naquele momento, porém desconsidera os tokens que serão destravados no futuro, subvalorizando o mesmo. Vamos usar o exemplo de Axie Infinity (AXS) para entender melhor:

O MC de AXS é de USD 1.055.550,518, equivalente à multiplicação da quantidade de tokens em circulação (83.056.186,67) pelo preço USD 12.71. No entanto, conforme explicamos, apesar dessa medida representar o valor do ativo naquele momento ela não considera os tokens que ainda estão travados — esses podem ser liberados em datas específicas ou ao longo do tempo — na figura acima nota-se que apenas 31% dos tokens estão em circulação.

Assumindo um preço constante após a liberação dos tokens, o DMC passa a ser uma melhor representação do valor real do ativo. Nesse caso, ele pode ser calculado através da multiplicação do preço pela quantidade total de tokens existentes (270.000.000), chegando ao valor de USD 3,431,395.676, muito superior ao MC. Portanto, é necessário muito cuidado ao comparar MCs de projetos em estágios diferentes de liberação de tokens.

O grande problema em relação ao DMC é que com a liberação de novos tokens é razoável imaginar que pelo menos uma parte será vendida à mercado, mas a que preço? É impossível prever como eles serão absorvidos pelo mercado, mas assumindo uma demanda constante, um aumento na força vendedora tende a pressionar o preço dos ativos. O market cap real portanto seria algo entre o MC e o DMC.

Para fins de valuation entendemos que o DMC ajustado pela quantidade de tokens em tesouraria é a melhor medida para refletir o valor real do ativo. Esse ajuste se faz necessário pois esses recursos funcionam como se fossem ações autorizadas mas não emitidas nas tesourarias das empresas, portanto sua contabilização no market cap estaria inflando o valuation. Vamos usar o exemplo de Lido (“LDO”), que possuí uma das maiores tesourarias do mercado, para entender melhor:

O total de recursos em tesouraria da Lido nessa data (ver acima) é de aproximadamente USD 325mm, sendo que USD 263mm estão em tokens LDO (aproximadamente 190mm de LDOs). Esses tokens na prática ainda não são ativos do protocolo, mas representam quantos tokens a DAO poderia emitir para vender a mercado. A contabilização deles permitiria que a DAO inflasse seu market cap somente aumentando a quantidade de tokens passíveis de emissão. Como não sabemos a que preço a Lido conseguiria vender os tokens em tesouraria, entendemos que o melhor tratamento é excluir os 190mm de LDOs da quantidade total de tokens para chegar ao market cap real.

Nesse exemplo os tokens em tesouraria LDO 190mm devem ser subtraídos do total de tokens autorizados LDO 1bi, chegando a um supply de LDO 810mm e um DMC ajustado de USD 1.117bi, inferior ao reportado acima de USD 1.3bi.

Além de saber como tratar o market cap é muito importante entender as emissões e unlock de tokens e como esse fluxo pode impactar no preço dos ativos.

a) Unlock de Tokens e Emissões

O unlock de tokens pode acontecer de duas formas: (1) através de um horizonte linear no tempo (ex: diariamente pelos próximos 2 anos) ou (2) em datas específicas. Para entender o impacto disso no preço dos ativos é necessário primeiro saber quem irá receber esses tokens.

A alocação inicial de tokens de um projeto geralmente se dá entre fundadores/equipe, advisors, investidores (“VCs”) e comunidade. Normalmente os holders de longo prazo como os fundadores são menos propensos a vender à mercado quando recebem os tokens. Já os VCs, que muitas vezes investiram nos tokens por um valor infinitamente inferior ao de mercado, tendem a realizar lucros, assim como a comunidade que pode receber os tokens através de liquidity mining e staking.

Ao analisar um ativo é fundamental portanto entender de que forma se dará o unlock de tokens e quem irá recebê-los. Se o unlock for grande, concentrado em uma data específica e direcionado para não holders é provável que o impacto no preço do ativo seja grande. Caso o unlock aconteça através de um horizonte linear no tempo esse impacto é reduzido consideravelmente. Vamos analisar abaixo o caso de Axie Inifinity:

Da alocação inicial de tokens, cerca de 15% estão destinados para private e public sale (ex: VCs) que pagaram um valor muito baixo pelo AXS e são potenciais vendedores buscando realizar lucro. Além disso, cerca de 49% serão distribuídos para o público entre staking e play-to-earn, também prováveis vendedores. Já os fundadores que tendem a ter um alinhamento de longo prazo com o projeto ficarão com 21%. No gráfico abaixo é possível checarmos em que momento se darão os próximos unlocks:

Dos tokens alocados em public/private sale praticamente a totalidade já foi distribuída — no início de novembro será liberada a última tranche de AXS 2.16mm referente a private sale juntamente com uma tranche de AXS 2.7mm dos Advisors, totalizando AXS 4.86mm ou aproximadamente USD 60mm — esse volume é superior ao que tem sido negociado diariamente pelo ativo e possivelmente poderá impactar seu preço negativamente.

Apesar de os tokens alocados para staking/play to earn ainda estarem em fase inicial de distribuição, os unlocks acontecerão de forma linear até 2025, o que deve gerar uma pressão constante de venda no ativo nos próximos anos.

b) Emissões

Outro aspecto importante que deve ser analisado além dos unlocks de tokens são as emissões de novos tokens, que ocorrem muitas vezes de forma inflacionária. Um exemplo dessa dinâmica ocorre nas blockchains, que emitem tokens diariamente para remunerar seus validadores. No gráfico abaixo podemos observar o retorno nominal dos validadores em diversas blockchains, a inflação e o retorno real (retorno nominal — inflação):

No caso de Solana, por exemplo, o retorno nominal está em torno de 6.6% a.a e o real em 1.6% a.a, portanto anualmente são emitidos 5% de novos tokens SOL para remunerar os validadores. Esses precisam achar novos compradores no mercado no momento em que são colocados à venda pelos validadores (que precisam honrar com seus custos) e adicionam uma pressão de venda adicional no ativo. Em um cenário de bear market em que a demanda e respectivamente o volume negociado caem consideravelmente, o impacto das emissões nos preços dos ativos tende a ser muito maior.

No gráfico abaixo podemos observar o volume de SOL emitido diariamente em relação ao volume total negociado nos últimos 2 anos. Nota-se que em períodos de bear market as emissões representam um percentual maior do volume diário negociado (linha vermelha), o que tende a pressionar mais os preços.

Fonte: Messari

Ativos muito inflacionários como Fantom (“FTM”) e Polkadot (“DOT”), portanto, tendem a sofrer mais em períodos de bear market em relação aos demais.

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Disclaimer: Este conteúdo possui caráter estritamente educacional e não constitui recomendação de compra ou venda de ativos.

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Guilherme Pimenta, CFA
Block3 Research

Portfolio Manager (Block3 Ativos Digitais); Co-founder of Block3 Research