Ciência&Educação: Paulo Freire, vamos “ler o mundo” para transformá-lo?

José Araujo
Blog do Fator
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4 min readJul 17, 2020
(Foto: Instituto Paulo Freire)

Começando por uma breve biografia, Paulo Reglus Neves Freire (1921–1997), mais conhecido como Paulo Freire, foi um educador e filósofo brasileiro, reconhecido internacionalmente, que se empenhou na promoção da alfabetização e educação para a população pobre, principalmente adultos. Freire nasceu dia 19 de setembro de 1921 em Recife (capital de Pernambuco). Durante a infância, teve de enfrentar dificuldades econômicas geradas pela morte de seu pai e pela Grande Depressão de 1929.

Ele se formou em direito na Universidade de Recife, mas decidiu se dedicar ao magistério. Coordenou o Plano Nacional de Alfabetização do presidente João Goulart até o golpe militar, quando foi preso e obrigado a se exilar. No exílio escreveu seu livro mais famoso, Pedagogia do Oprimido. Além disso, deu aulas no exterior, inclusive em Harvard, e organizou planos de alfabetização em países africanos, á exemplo de Guiné-Bissau e Cabo Verde. Após a anistia, retornou ao Brasil, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores e seguiu a carreira educacional até falecer de enfarto em 1997.

Agora vamos entender o que se passa na cabeça desse senhor com rosto simpático da foto. Bom, Paulo Freire acreditava que a educação deveria ser libertadora e problematizadora. No caso das camadas menos favorecidas, isso significaria levar o indivíduo a entender sua situação de oprimido e a agir em prol de sua própria libertação — uma explicação para sua escolha de título em Pedagogia do Oprimido. Ademais, essa nova visão educacional é responsável por desconstruir uma consciência ingênua (uma superposição da realidade fundada no senso comum) e construir uma consciência crítica (uma integração com a realidade fundada na bagagem cultural do alfabetizando). Essa consciência crítica permitirá ao estudante a ser protagonista da própria história e transformar sua realidade.

Outra inovação da teoria Freiriana é a relação entre educando e educador. O filósofo acreditava que, para alcançar a educação descrita no parágrafo anterior, é necessário o aprendizado conjunto desses dois atores. O pernambucano justificava essa noção na premissa de que o aluno, independente de sua alfabetização, traz para a escola uma cultura consigo. Essa “bagagem” não é nem melhor e nem pior que a do professor. Por essa razão, ambos devem aprender juntos dentro de uma atmosfera democrática e afetiva, na qual todos tem liberdade para compartilhar suas opiniões.

Isso colide bruscamente com o modelo “bancário” de educação. Essa metodologia, criticada por Freire, é caracterizada pela visão do estudante como um recipiente vazio a ser preenchido pelo professor. Segundo Freire, essa é uma educação alienante e “sua tônica fundamentalmente reside em matar nos educandos a curiosidade, o espírito investigador, a criatividade”. Nesse seguimento, enquanto a ideologia tradicional procura alienar os alunos, a ideia Freiriana tentava inquietá-los.

Falando em inquietação, Freire acreditava que a sua estratégia educacional faria com que o aluno rompesse a “cultura do silêncio”. Essa expressão faz menção a forma como o sistema dominante imprimi nas classes pobres uma imagem de oprimidos e silenciados. Nesse viés, a abordagem de Freire pretende habilitar o discente para “ler o mundo”, como ele mesmo dizia, e reescrever a realidade (transformá-la). Dessa forma, a partir da educação crítica Freiriana, o aluno pode identificar essa “cultura do silêncio” e alterá-la — sendo o agente de sua própria história.

Você pode estar se perguntando: o que isso tem a ver com ciência? Minha resposta é muito simples: tudo! Para chegar a esses termos e a essa nova metodologia, Freire teve que passar pelos estágios do método científico, até mesmo pela experimentação. Inclusive, um dos seus experimentos mais famosos foi quando ele e sua equipe alfabetizaram 300 cortadores de cana-de-açúcar em apenas 45 dias. A partir desse e outros ensaios, Freire desenvolveu um processo educacional em 3 etapas. A primeira era a busca conjunta entre professor e aluno de palavras e temas significativos a realidade do indivíduo dentro de sua comunidade. A segunda era uma análise social dos tópicos. Por fim, a terceira era quando o professor desafiava o aluno a superar a visão acrítica, mergulhando em uma postura conscientizada.

A filosofia Freiriana é muito complexa e tentei trazer aqui apenas um resumo de suas ideias. Isso para que você (leitor) possa entender as contribuições teóricas trazidas por esse cientista educacional. Um último conceito discutido por Freire que gostaria de trazer é o de coerência. Nessa percepção, o filósofo acredita que de nada vale defender essas diretrizes pedagógicas, se elas não são postas em prática. Por isso, termino este post com fala de Paulo Freire sobre essa questão:

“As qualidades e virtudes são construídas por nós no esforço que nos impomos para diminuir a distância entre o que dizemos e fazemos…”

— Paulo Freire (educador, filósofo, brasileiro, cientista e inspiração)

Até a semana que vem, leia o próximo post!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FERRARI, Márcio. Paulo Freire, o mentor da Educação para a consciência. Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/460/mentor-educacao-consciencia#>. Acesso em 16 de Jul de 2020

REDAÇÃO. Como deveria ser a escola, segundo Paulo Freire. Disponível em: <https://guiadoestudante.abril.com.br/estudo/como-deveria-ser-a-escola-segundo-paulo-freire>. Acesso em 16 de Jul de 2020

ROCHA, Adriana; PADILHA, Giselle; FERREIRA, Juliana; e MESQUIDA, Peri. Teoria Freiriana de Educação e a Alfabetização de Crianças. Disponível em: <https://educere.bruc.com.br/CD2013/pdf/8983_6079.pdf>. Acesso em 16 de Jul de 2020

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José Araujo
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Estudante do CEFET/RJ e embaixador do Sistema Fator. Apaixonado por ciência, política internacional e educação, será que um dia consiguirei unir tudo?