Buenos Aires: a cidade que respira futebol

Leonardo Dutra
Blog Latinoamérica
4 min readJul 30, 2020
Crédito: Club Ferro Carril Oeste

Que a Argentina é uma das maiores potências do futebol mundial e que os argentinos são completamente apaixonados pelo esporte não é surpresa. Mas em Buenos Aires, capital e principal cidade argentina, este sentimento supera o de qualquer outra região dentro da América Latina no assunto.

É provável que não há, no mundo, cidade que viva o futebol como os portenhos, como são chamados os naturais da cidade de Buenos Aires. Com cerca de 3 milhões de habitantes, a histórica metrópole possui 30 equipes afiliadas à Asociación del Fútbol Argentino (AFA), entidade máxima do futebol argentino, tornando-a na capital que possui o maior número de clubes em todo o continente americano e a segunda maior no mundo, atrás apenas de Londres, onde foi inventado o esporte.

Início através da forte presença britânica

A Argentina foi muito influenciada pelos ingleses no século 19, o que fez com que o futebol tivesse boa aceitação no país desde os primórdios. No dia 20 de junho de 1867 foi jogada a primeira partida organizada por argentinos no país, entre Buenos Aires Cricket Club e Buenos Ayres Football Club.

Menos de três décadas depois, no ano de 1891, foi criada a associação posteriormente conhecida como AFA, que rege o esporte no país até os dias de hoje. No mesmo ano foi criado o campeonato argentino, principal divisão de clubes no país que, com mais de 100 anos, é o mais antigo campeonato de futebol fora das ilhas britânicas.

Tradição e bairrismo nos clubes da capital

Diferentemente de muitos países, incluindo o Brasil, os clubes argentinos costumam representar um bairro ou uma comunidade, tendo cada um uma identidade própria, que tenta resistir à inserção dos grandes clubes em sua região. O clube portenho mais antigo em atividade é o Club Atlético Estudiantes, criado ainda no século 19, que, apesar de estar localizada na cidade de Caseros, possui sede oficial no bairro de Villa Devoto, na capital.

Exemplo desta tradição é a data de fundação das equipes. Apenas seis das 30 não foram criadas antes da metade do século XX e nenhuma no século XXI, sendo o Club Deportivo Armenio a mais nova, estabelecida no ano de 1962. É importante ressaltar o caso do Club Deportivo Español, fundado em 1956 e que, após diversos problemas financeiros, encerrou suas atividades em 1998. Em 2003, um grupo de sócios e simpatizantes locais iniciaram o processo de recriação da instituição, utilizando as mesmas características do antigo clube, mas com nova fundação oficial.

Hegemonia de dois gigantes

Apesar desta herança clubística entre regiões da cidade, há uma grande separação no futebol doméstico. Atualmente dois gigantes no país representam cerca de 70% da torcida argentina: Boca Juniors e River Plate. O Boca é considerado o clube mais conhecido na América Latina, sendo um dos maiores campeões do continente. Já o River viveu altos e baixos durante sua trajetória, sendo rebaixado em 2011 e chegando a estar à beira da falência, mas deu a volta por cima e conquistou diversos títulos importantes, se tornando a principal equipe do continente dos últimos anos.

As duas equipes são as mais vitoriosas no país e quando se encontram, no Superclásico Argentino, ganham destaque por todo o continente e rendem histórias emblemáticas, como a final da Copa Libertadores de 2018, onde a final precisou ser jogada em Madrid, na Espanha, após um grupo de torcedores do River Plate ter agredido o ônibus do clube, ferindo vários integrantes do Boca Juniors. Outro caso famoso aconteceu em 2015, quando um torcedor do Boca jogou spray de pimenta no vestiário dos jogadores do River no intervalo do clássico. O jogo foi suspenso e o Boca Juniors foi excluído do torneio.

Apesar da hegemonia destes dois clubes, Buenos Aires abriga vários outros clássicos em sua extensão. Alguns são disputados por tradicionais equipes do futebol argentino, como o Clásico de Barrio (Huracán e San Lorenzo), ou o Clásico del Oeste (Ferro Carril e Vélez Sarsfield). Outros clássicos que podem ser destacados são entre All Boys e Nueva Chicago ou o simpático Riestra e Sacachispas. Além destes há pelo menos mais cinco clássicos nas mais variadas esferas do futebol portenho.

Predominância dos portenhos nos títulos

O amor do portenho pelo futebol se expressa também através dos títulos. O sucesso dos clubes da cidade de Buenos Aires é visível não apenas dentro do país, mas também nos torneios internacionais. No campeonato argentino, cerca de 65% dos títulos foram para um clube da capital, contando as eras amadora e profissional. Já a Copa Argentina, que teve apenas 10 edições, soma sete títulos para equipes portenhas. Essa contagem não inclui a edição de 1970, que não teve campeão declarado na final entre San Lorenzo e Vélez Sarsfield, ambos de Buenos Aires.

Já no âmbito internacional, mais da metade dos 25 títulos conquistados por argentinos na Copa Libertadores da América, maior competição dentro do continente, é de clubes da capital. Os portenhos também tem boas estatísticas na Copa Sul-Americana, com quatro dos oito títulos vencidos por argentinos.

O cotidiano de Buenos Aires com o futebol, marcado por tradições, glórias e controvérsias, é um reflexo do que o esporte representa para o povo argentino que, além de simbolizar uma nação inteira, rica culturalmente e calorosa emocionalmente, é muito parecida com a população brasileira.

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