Caminho
É um caminho longo esse de mãos dadas. A gente tenta sincronizar os passos, a gente perde o compasso, a gente ressincroniza e segue. Duas crianças ilesas às rugas na alma. Sorrindo às vezes, abobados de nossa própria condição de líquen, mas sempre atentos. Como se das mãos dadas dependesse a continuidade da existência do mundo — não do nosso mundo, protegido e aninhado em nossos ventres quentes, mas de todo o mundo, de todos os mundos. A gente se dá as mãos como se fosse para salvar o universo.
É um caminho longo esse. A gente come um quilo de sal com a falta de pressa de quem tempera os dias com apenas uma pitada por vez; a gente assiste ao esvaziar das ampulhetas com o susto de quem descobre a lentidão da felicidade; a gente conta as gotas do tempo sonhando a infinitude dos oceanos. E nada, nenhum indício, serve para aplacar a força da incerteza. É incerteza o que nos domina. Quando provamos do prato para dois, quando deitamos na cama de casal, quando confundimos nossas escovas de dentes e já não ligamos para o perigo pré-anunciado das bactérias misturadas, não conseguimos abandonar o assombro que nos nasce essa estrada.
É um caminho longo. Nossa falhas desabam mais à frente e formam pedras intransponíveis, mas nosso desejo dá asas às nossas pernas — nosso desejo é quase fé e possibilita insanidades. A gente vai assim. Desviando das setas que nós mesmos nos atiramos; nos comunicando com a telepatia da intimidade; driblando o mundo. Porque queremos essas mãos mornas e espalmadas como algemas vivas das quais perdemos as chaves; queremos esse medo de não controlar o futuro que já traçamos numa linha vermelha feita da tinta dos nossos sangues; queremos essa incoerência que batizaram de pra sempre. A gente é louco. A gente sabe. A gente segue.
É um caminho. Muito embora a gente acredite ser destino.
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