Fabiane Secches fala sobre seu novo livro, Elena Ferrante — Uma longa experiência de ausência

Um olhar sobre a obra de Elena Ferrante em seu novo livro

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Já tem na Blooks o livro Elena Ferrante - Uma longa experiência de ausência, de Fabiane Secches. Depois de ler e reler a obra da escritora italiana, Fabiane Secches nos oferece esse olhar sobre seu trabalho, numa belíssima edição do Editora Claraboia, da Tainã Bispo.

Vamos agora ler uma entrevista com a Fabiane para a Blooks Livraria!

O seu encantamento pela obra da autora italiana foi tão importante que, por causa dela, você decidiu fazer um mestrado em teoria literária. Poderia nos contar um pouco mais desse processo e de como surgiu a ideia do livro?

Nos últimos cinco anos, tenho lido e relido os livros de Ferrante algumas vezes. A cada retorno, encontro algo novo. Comecei escrevendo uma resenha de “A amiga genial”, em 2015, e acabei escrevendo artigos de psicanálise, um projeto de mestrado, outras resenhas e alguns trabalhos acadêmicos. “Elena Ferrante, uma longa experiência de ausência” (2020, Editora Claraboia) faz parte desse processo. Parti desse primeiro texto e, agora, chego a essa publicação, em que proponho uma análise panorâmica da obra de Ferrante. A ideia desse livro partiu de um convite feito há um ano e meio, mais ou menos, pela editora Tainã Bispo. Nesse meio tempo, terminei a dissertação, defendi meu mestrado, começamos a conversar sobre um projeto desdobrado dele e chegamos, aos poucos, a um caminho que nos animava.

No seu livro, “Elena Ferrante: uma longa experiência de ausência”, você tece uma relação importante entre a ausência física da autora, cujo nome é um pseudônimo, e sua obra. Poderia nos falar um pouco sobre essa análise?

A ausência é uma questão que atravessa tanto os bastidores (aquilo que pode ser pensando como “extraliterário”), quanto a própria obra de Ferrante. A ausência de uma figura definitiva que acompanhe o pseudônimo tem sido recebida por muitos como um enigma posto. A questão vai ficando mais e mais interessante conforme a gente vai se aprofundando nas reflexões que Ferrante propõe a partir disso, quer seja em seus romances — e também em seu livro infantil — , quer seja em suas entrevistas e em outros textos classificados como de não-ficção (cartas, ensaios, artigos).

No seu livro, você aborda a obra completa da Elena Ferrante, ou seja, analisa os outros livros da autora além da tetralogia napolitana. Entre os primeiros romances, você tem algum romance favorito?

A tetralogia napolitana, em conjunto, é considerada a obra-prima da autora, um divisor de águas em seu percurso literário. Mas também gosto muito dos romances Dias de abandono, publicado na Itália em 2002, e A filha perdida, de 2006. Do primeiro romance, Um amor incômodo (1995), gosto menos. Desde o início, Ferrante já estava tateando alguns temas e procedimentos que se repetem em sua obra, mas que ressurgem de formas novas e complexas em cada livro.

A relação entre Lila e Lenu, as duas personagens mais famosas de Elena Ferrante, é intensa e contraditória. E essa amizade é analisada detidamente no seu livro. Poderia nos contar um pouco mais de como você vê essa relação?

Para mim, a palavra que melhor define a relação entre Elena Greco (a narradora da tetralogia napolitana) e Rafaella Cerullo (a quem Elena chama de Lila) é ambivalência — do latim, “ambas as forças”. Essa amizade se estabelece nas profundezas da infância, a partir de uma dinâmica repleta de afetos e conflitos concomitantes. Os movimentos de atração e de repulsão entre as duas protagonistas são constitutivos de toda a tetralogia napolitana. Vão estruturando cada um dos episódios narrados e também a própria narrativa, o próprio texto de Elena. A narradora é uma escritora bem sucedida, que, na velhice, decide recontar, minuciosamente, a história dessa amizade, de meados de 1950 ao início dos anos 2000. Acompanhamos essas idas e vindas por vezes vertiginosas, enquanto a autora tece também um panorama da história recente da Itália.

No livro, há um capítulo intitulado “Febre Ferrante”, há depoimentos de vários escritores, jornalistas e leitores, que comentam sobre a experiência de ler Elena Ferrante. Poderia nos contar um pouco de como foi a construção desse capítulo?

Para examinar o fenômeno de recepção da autora, achamos que seria importante incluir diversas perspectivas, pois esse fenômeno raro, que originou o termo “Febre Ferrante”, só pode ser investigado de maneira coletiva, a partir de diferentes experiências de leitura. Ainda assim, claro, é um campo amostral restrito e também algo que sempre escapa. Há um elemento misterioso em todo movimento cultural espontâneo que permanece assim, opaco. Tudo o que a gente pode fazer é levantar algumas hipóteses, enquanto vamos conversando sobre literatura. A ideia de que essa seja uma conversa em aberto tem me interessado muito.

Quais são as principais referências literárias de Elena Ferrante? Que livros você indicaria para quem gostou da obra dela e se sente órfão, enquanto aguarda a tradução do novo romance em português?

Ferrante está em constante diálogo com a tradição e com a história literária, atualizando esse repertório a partir de seu próprio tempo. Recomendo “A ilha de Arturo”, de Elsa Morante (Carambaia); “Pequenas virtudes”, de Natalia Ginzburg (Companhia das Letras); “Mulherzinhas, de Louisa May Alcott (diversas traduções em português); “Madame Bovary”, de Gustave Flaubert (diversas traduções em português); e todos os romances de Jane Austen, que é uma das referências literárias mais importantes de Ferrante. Mas também: Simone de Beauvoir, Clarice Lispector — que Ferrante menciona explicitamente em uma entrevista — , Christa Wolf, Domenico Starnone e Sigmund Freud, além dos textos da Antiguidade Clássica.

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