Palocci falou. E daí?

Rafael Poço
Bode na Sala
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2 min readSep 18, 2017

Palocci não fez delação premiada. O depoimento dele na semana passada foi em um processo em que ele (junto com Lula) também é réu, e isso significa que tinha o direito de ficar em silêncio, assim como não tinha obrigação de dizer a verdade.

Muita gente tentou confundir as coisas, como se ele estivesse falando para receber contrapartidas de uma delação premiada. Mas ele contou tudo aquilo num depoimento que não lhe traz benefício. Pelo contrário, pode até se prejudicar por se auto-incriminar em alguns momentos.

E ele disse muita coisa.

Muita coisa que nem foi novidade. A surpresa foi que tenha sido dito por ele, com a riqueza de detalhes e com a nitidez de quem acompanhou de perto e conviveu com a intimidade da relação entre o Poder Político e o dinheiro.

O depoimento mais uma vez traz um dilema: será preciso apresentar provas jurídicas suficientes para condenar alguém à prisão nos termos da Lei, e isso precisa ser levado a sério pela Justiça.

Mas precisa ser levado a sério também pela sociedade e pelos partidos. Se as declarações de Palocci não são suficientes para a Justiça prender Lula (e, por si sós, não são) elas são mais que suficientes para que qualquer pessoa razoável (inclusive uma parte do PT) reconheça que não será o retorno de Lula uma mudança na relação promíscua entre Poder e Dinheiro.

Não é necessário debater se Lula chefiou ou não a quadrilha para atestar que ele, no mínimo, conviveu com ela muito bem e soube se aproveitar disso. E não é necessário dizer que o que o Brasil de hoje menos precisa é de alguém que se acomode bem com a corrupção.

O Brasil precisa virar a página do poder que é cordial com o uso do Estado para benefícios privados ou partidários, ou que confunde o interesse público com privilégios corporativos.

O próprio PT poderia incorporar isso à narrativa e contribuir muito com o país. Mas para isso precisaria ter a coragem de explorar as novas possibilidades e os novos nomes capazes de representar um projeto social relevante para uma parcela da sociedade que não encontra reconhecimento em outros partidos, mas que não deixa de lado a dignidade na hora do vamos ver.

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