A BUSCA

NOTA 6,5

Matheus Rego
Boite du Film
4 min readJul 9, 2018

--

Brasil, 2013. Dir.: Luciano Moura. Com Wagner Moura, Lima Duarte, Mariana Lima, Brás Antunes, Rui Rezende e Abrahão Farc.

Saio do cinema com um amigo e pergunto — o que achou? -, ao que ele me responde — é sempre bom quando uma história tem começo, meio e fim -. Verdade.

“A Busca”, grande lançamento nacional deste semestre, é um filme que parte do básico para construir uma narrativa cativante, ainda que falha em alguns pontos. Pela primeira metade do filme temos o drama de um casal em termos de separação, cujo filho fugira de casa sem deixar quaisquer pistas. Aí, se inicía a incensante jornada do pai do menino, Theo (Wagner Moura), em busca do garoto. A linha narrativa do filme é basicamente esta: um pai atravessando o país à procura de seu filho. De um modo geral, estamos diante de uma obra bem redondinha. Aqui, a jornada do herói é aplicada em seu estado mais clássico, de modo que temos um protagonista que abandona a rotina de seu cotidiano em busca de um objetivo muito bem definido — achar o filho — e que, no decorrer desta jornada, acaba se auto-descobrindo e repensando algumas de suas relações — no caso, sua frágil relação com o próprio pai, interpretado por Lima Duarte -.

Com uma comovente interpretação de Wagner Moura, sem nunca recorrer ao melodrama, o filme funciona bem dentro de suas próprias pretensões, sem jamais projetar-se como um drama filosófico ou um questionamento acerca da fragilidade das relações familiares. O que temos em tela é uma trama bem construída que busca mostrar o drama de seu protagonista e seus exaustivos esforços para encontrar o filho.

O diretor Luciano Moura, que estréia à frente de um longa-metragem, demonstra grande competência ao trabalhar as técnicas cinematográficas a favor de sua narrativa. Tomemos como exemplo disso a insistência dos planos em isolar os personagens durante os dois primeiros terços do filme, de modo que raramente temos os pais do menino Pedro (Brás Antunes — filho do Arnaldo Antunes), Theo e Branca, lado a lado, num mesmo quadro — um feito que traduz o distanciamento do casal -. Quando acontece dos dois aparecerem num mesmo plano, eles são mostrados através de uma janela, como que refletindo a própria posição do espectador, que observa, à distancia, um casal em crise, em meio a um cenário doméstico frio e impessoal. E se esta impessoalidade é sugerida para o espectador, seu mérito está no trabalho de arte, que traz uma cenografia de tons metálicos e cores frias.

Se como trama o filme funciona bem durante toda sua duração — por conta de uma estrutura clássica muito bem arranjada -, como drama, a primeira metade do longa falha em conquistar a platéia. Para melhor explicar o que se passa, comparo “A Busca” a produção americana “Na Natureza Selvagem”, de Sean Penn. Em “Natureza” temos o lado oposto de uma mesma história, de modo que acompanhamos a trajetória de um garoto que foge para tentar se descobrir. À medida que o longa se desenvolve, vamos criando laços afetivos com o protagonista, Christopher McCandless (Emile Hirsch), e sua jornada passa a ter um alto custo emocional para o espectador, que se compadece com o desespero interno de um rapaz em crise. Em uma curta cena em que o pai de Chris se senta no asfalto e chora copiosamente a perda do filho, sentimos em suas lágrimas todos os erros que cometera com o garoto, justamente por que tivemos contato com este garoto e sabemos da relação conflituosa dele com os pais. É nesse aspecto que “A Busca” falha em comover seu espectador, esquecendo de construir uma história pregressa de drama para a família. Mais do que isso, ao introduzir o personagem Pedro, de maneira rápida e superficial, o filme não estabelece uma relação entre o garoto e o espectador, de modo que pouco importa que fim ele terá. É só quando começamos a acompanhar os exaustivos esforços de Theo que passamos a querer o bem do garoto.

Durante a etapa inicial de sua busca, Theo empreende uma jornada frenética e constante, sem jamais parar para considerar seus erros ou tentar entender a razão da fuga do filho. Nessa etapa, ainda que o filme prenda a platéia num misto de ansiedade e expectativa, ele deixa de estabelecer laços emocionais. É só mais pra frente, pela segunda metade do filme, que Theo desacelera e passa a ter um contato mais intímo e profundo com as pessoas que vai conhecendo ao longo de sua viagem, o que acaba por trazer uma reflexão sobre sua própria vida. Aí o filme ganha fortes contornos dramáticos. É no reconhecimento do outro, portanto, que Theo entra em contato com seus próprios dramas, trazendo alguma carga emocional para a história. Nesse momento, uma das mais comoventes cenas vem do instante em que Theo ajuda uma jovem a dar a luz à beira de um rio. Nesta cena, ele acaba segurando a criança em seu colo e experimentando, novamente, o contato paternal que o faz lembrar o porque de sua jornada.

Ao final do filme, numa prova concreta da evolução de nosso protagonista, a câmera do diretor de fotografia Adrian Teijido compõe um plano com Theo de um lado, seu pai do outro, e o menino Pedro ao meio, conectando os dois. Aqui, nossos personagens não estão mais isolados e são unidos pela presença do menino. Ou seja, não só em termos narrativos, mas também em sua elaboração estética, o filme tem um claro desenvolvimento, que só vem a reforçar o envolvimento do espectador com a obra.

Apesar de uma falha ou outra, ei de concordar que, ao fim da sessão, é sempre bom ter assistido a uma história com começo, meio e fim.

Publicado em 20 de março de 2013.

--

--