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Nossas águas com microplásticos: estamos nos contaminando!

Estudo da UnB identifica a presença de microplástico em água de torneira de restaurantes e lanchonetes de uma região de Brasília

Ana Gomes
Boletim Antidoto

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A presença de microplásticos nas águas de torneiras indicam que estamos consumindo essas partículas. A ingestão e absorção do microplástico, causam nos humanos e outros animais, diversos problemas de saúde. Imagem ilustrativa. Fonte: Canva.

Em fevereiro de 2020, o pesquisador Marcelo Henrique Ramos Tenório, da Universidade de Brasília, divulgou resultados de sua pesquisa sobre microplásticos na água de torneira na região de Plano Piloto, região administrativa de Brasília, Distrito Federal, que é abastecida pelos sistemas integrados do Torto/Santa Maria e Descoberto. O trabalho propôs identificar esse tipo de resíduo sólido em amostras de água destinada ao consumo e levantar a discussão sobre o microplástico e suas implicações para o meio ambiente e para saúde da sociedade.

Entre janeiro e março de 2018, foram coletadas 31 amostras de 1 litro de água da torneira separadas em recipientes de 500 ml previamente higienizados. A coleta foi realizada em finais de semana, entre 11 h e 15 h, nos estabelecimentos que comercializam alimentos e bebidas, como restaurantes e lanchonetes. Para a análise do material coletado, o pesquisador utilizou um microscópio com luz fluorescente, em que foi observada a presença do microplástico em 100% das amostras, com uma média de 160 partículas por 500 ml de água. Esse resultado é consequência do alto consumo do material plástico, de seu uso único, do descarte inadequado, de problemas nas estações de tratamento de água e da falta de estratégias modernas para retirada dos microplásticos da água destinada ao consumo.

Microplásticos e o meio ambiente

Os microplásticos são pequenas partículas plásticas, menores que 5 mm. Foram relatados pela primeira vez em 1970 e estão dentro e fora de nossas casas, em nosso trabalho, nos alimentos, na água, no ar que respiramos e, consequentemente, no interior de organismos vivos terrestres e aquáticos. No ambiente marinho, está em toda a coluna d’água (da superfície ao fundo), e no ar, em ambientes externos e internos. Sendo assim, é considerado um poluente aquático e atmosférico.

Diante das variadas formas de contaminação, há grande interesse e preocupação dos cientistas em pesquisar sobre esse problema, pois o tamanho reduzido facilita a sua ingestão pelos animais, causando diversos danos em sua saúde.

Mas como esses materiais vão parar nesses locais? As principais fontes variam, mas vêm em grande parte de plásticos descartáveis, equipamentos de pesca, brinquedos, utensílios de cozinha, sacolas, embalagens, roupas, cosméticos, pneus, entre muitos outros. O plástico é comumente degradado por fotodegradação e foto-oxidação, que modificam sua propriedade física a partir da luz solar, tornando-o frágil e quebradiço até tamanhos microscópicos.

O microplástico ingerido obstrui o aparelho digestivo, impacta a reprodução e o sistema imunológico dos animais, podendo levá-los à morte. Esses poluentes produzem resultados tóxicos em diversos organismos por toda cadeia alimentar, o que faz esse problema ser uma questão de saúde marinha e humana.

Do ambiente para o ser humano

Até o momento existem diversas evidências sobre o efeito dos microplásticos na saúde humana. Os alimentos assim como a água destinada ao consumo podem estar contaminados, seja por exposição direta no meio ambiente ou por transferência desse material entre animais de espécies comestíveis, provocando a bioacumulação. Nesse processo, há absorção e passagem do microplástico, em concentrações acumuladas, portanto, cada vez maiores entre os organismos. Por exemplo, isso acontece desde pequenas algas que produzem seu próprio alimentos a partir da luz (fotossíntese), mariscos que filtram a água do mar para se alimentarem de pequenas partículas, peixes pequenos e grandes, aves, até ao homem.

No ambiente urbano, há o descarte inadequado do esgoto doméstico e industrial, em aterros sanitários e outros lixos plásticos que chegam até as estações de tratamento de água e esgoto. Essas instalações comumente não possuem estratégias para remover os microplásticos da água. Assim, esse material chega na casa da população causando riscos à saúde. Componentes, como o Bisfenol A (BPA) e o ftalatos (usado para deixar o plástico mais maleável), podem ocasionar a desregulação endócrina e causar problemas na tireoide, efeitos no desenvolvimento nos homens como a diminuição na capacidade reprodutiva e câncer testicular ou de próstata. Nas mulheres, a exposição ao microplástico pode representar um aumento no risco de endometriose, câncer de mama, doenças endocrinológicas, diminuição da capacidade reprodutiva, da função do ovário e do ciclo menstrual.

Em um outro estudo apresentado no trabalho de Marcelo Tenório, os microplásticos foram observados no fígado, rim, intestino e fezes de camundongos. Esse resultado pode ser explicado pelo fato desses órgãos serem responsáveis pelo armazenamento e eliminação de substâncias. O camundongo é comumente utilizado em pesquisas científicas, por ser um mamífero como os seres humanos, e no caso do microplástico, poder acumular e sofrer as mesmas alterações. Outros trabalhos já indicam a presença em frutos do mar, peixes, moluscos, mel, açúcar, cerveja, sal e água da torneira.

Como contornar essa situação?

Como visto, o microplástico causa diversos problemas para o meio ambiente e para a saúde dos seres vivos, sejam eles do ambiente aquático, ou seres humanos. Por ser uma questão complexa, sua possível solução envolve diversos atores de nossa sociedade. Entretanto, existem 3 principais a serem considerados:

1. Política pública para prover recursos e medidas legai para o saneamento ambiental de qualidade;

2. Educação ambiental em ambientes formais e não-formais para a sociedade se tornar consciente dos problemas socioambientais e agir de forma a conservar o meio ambiente, ao descartar o lixo de forma adequada e reduzir o consumo de plástico, principalmente o de uso único, como canudos, garrafas de água, talheres, pratos e copos plásticos, entre outros.

3. Investimento em pesquisas científicas que visem criar materiais alternativos ao plástico e que busquem mais casos como o de Brasília para entender esse problema de forma mais abrangente.

Assim, é preciso que todos se empenhem na garantia do direito à saúde e à qualidade ambiental e de vida.

Já pensou em como é o seu consumo em relação ao plástico? Se interessou pelo assunto e quer saber mais? Segue abaixo o trabalho original com mais detalhes:

TEOTÔNIO, Marcelo Henrique Ramos. Presença de microplástico em água de torneira no Plano Piloto uma região administrativa de Brasília. 2020. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, Universidade de Brasília, Brasília, DF.

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