O Balanço do Botafogo de 2018: Mufarrej repete CEP

Botafogo Sem Medo
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10 min readApr 26, 2019

O Botafogo Sem Medo esteve presente na reunião do Conselho Deliberativo do Botafogo que aprovou as contas de 2018 do clube. Como é de costume, baseado no balanço, analisamos os números e ações da Diretoria Mufarrej/CEP. São 6 itens: 1) A Pedalada CEP e seus efeitos, 2) Adiantamentos de CEP e Mufarrej, 3) Empréstimos de Mufarrej, 4) Mufarrej: menos gastos de futebol, mais com social e olímpicos, 5) Sobrevivência em 2018 e 6) Clube Social e Esportes Olímpicos: dinheiro pelo ralo, além da nossa conclusão. Boa leitura e não deixe de nos dar a sua opinião.

Vitor Silva/SSPress/Botafogo

Nesta quinta-feira, dia 25/04/2019, o Botafogo votou as demonstrações financeiras do exercício do ano anterior, o Balanço 2018. Como de hábito, nós, do Botafogo sem Medo, procuramos analisar os grandes números para entender a história que eles contam.

Nos balanços de 2015, 2016 e 2017 você se acostumou a ver o ex-presidente Carlos Eduardo Pereira comemorar vultosos superávits, contando a história para os sócios e para a torcida como se o Botafogo sempre tivesse dinheiro sobrando ao fim de cada exercício seu. Ou seja, arrecadando mais do que gastando. No Balanço 2018, uma novidade: pela primeira vez é admitido um déficit no exercício.

O que Mufarrej teria feito diferente de CEP para que isso acontecesse? A resposta é: nada. E esse é o grande problema. Mufarrej deu sequência ao mesmo modelo de CEP, seguiu no mesmo caminho de CEP, e a diferença é que chegou a um ponto em que sequer há margens para manobras contábeis miraculosas.

Portanto, vamos destacar alguns aspectos mais relevantes.

1 — A Pedalada CEP e seus efeitos

As demonstrações financeiras do Botafogo não apresentam o fluxo de caixa (no orçamento isso é apresentado). A demonstração do fluxo de caixa mostra quando efetivamente entrou e quanto efetivamente saiu de dinheiro num exercício. O balanço patrimonial por sua vez utiliza o regime de competência, onde o valor da transação é registrado na data em que ela ocorre.

Como exemplo, digamos que, numa conta grosseira de padaria, você tenha tido R$ 50 mil de despesas em 2018 e R$ 70 mil de receitas. Você terá um lucro de R$ 20 mil. Entretanto, se todas as suas despesas tenham que ser pagas no ano corrente, mas que R$ 40 mil dos R$ 70 mil de sua receita na verdade sejam pagos em parcelas de R$ 20 mil a partir do ano seguinte. Isso significa que, apesar do lucro apurado, você tem um déficit de caixa de R$ 20 mil (30 mil de dinheiro que efetivamente recebeu menos 50 mil de despesa que efetivamente pagou). A sua opção, no caso, é pegar um empréstimo de R$ 20 mil para quitar suas despesas, e este empréstimo terá como garantia as parcelas a serem recebidas e, claro, um custo. Se esse custo for de 10%, por exemplo, você gastará R$ 22 mil futuros para obter os R$ 20 mil agora.

É o mesmo caso do Botafogo, mas com um agravante. Parte do que CEP utilizou para registrar como receita simplesmente não existe. Como é o caso da Pedalada CEP.

1.1 — Como funciona a Pedalada CEP

Em 2013 e 2014, na gestão do presidente Maurício Assumpção, o Botafogo pegou R$ 20 milhões em empréstimos com o grupo Odebrecht, dando como garantia direitos econômicos e bilheteria. O Botafogo não pagou, a dívida correu, foi aumentando e estava sendo sempre registrada como passivo. No Balanço 2016, CEP registrou essa dívida com o valor de R$ 35,501 milhões em 31/12/2016.

Em 2017, deu-se o milagre. O Jurídico do Botafogo apostou num contencioso judicial, contestando a idoneidade da transação. O mesmo Jurídico classificou este contencioso como sendo de alta probabilidade de vitória. Dessa forma, CEP tirou esse valor do passivo e, pasmem, lançou como receita não discriminada na rubrica “clube social” como “receitas diversas”. O parecer da auditoria BDO no Balanço 2018 explica: “foram recuperadas ao todo no ano de 2017, o valor de R$ 43.036 mil que ficou representada na conta de receitas diversas.”

Veja: CEP transformou um valor de R$ 43,036 milhões negativos, que constava do passivo, em R$ 43,036 milhões positivos, que lançou como receita.

Os efeitos disso foram:

“Dívidas Mútuos”: caiu de R$ 148,031 milhões para R$ 104,995 milhões;

“Receita Operacional Bruta”: subiu de R$ 221,266 milhões para R$ 264,302 milhões;

“Resultado”: subiu de R$ 10,337 milhões para R$ 53,373 milhões.

Vitor Silva/SSPress/Botafogo

1.2 — Odebrecht não consta em 2018, mas pode ser bomba em 2019

Ao não reconhecer a dívida com a Odebrecht, Carlos Eduardo Pereira evitou ter de renegociá-la (parcelar, reduzir o valor, propor uma forma de pagamento…). Assim empurrou o problema para frente, para além de seu mandato. O contencioso no qual o Botafogo se aventurou pode custar caro. Em 1ª instância, a juíza não aceitou os argumentos dos advogados do clube, e esse entendimento foi mantido na 2ª instância pela maioria do colegiado do TJ-RJ.

Esse empréstimo da Odebrecht não consta do Balanço 2018, nem como passivo nem como receita. Esta bomba-relógio pode cair sobre o mandato de Nelson Mufarrej, inviabilizando a operação do Botafogo, que seria forçado negociar um acordo em posição extremamente fragilizada. CEP reconheceu este valor como sendo de R$ 43,036 milhões em 31/12/2017. Considerando que, em 31/12/2018, este valor atualizado fosse de R$ 50 milhões, isso equivaleria a cerca de um terço da receita ajustada de CEP e de Mufarrej, como veremos adiante.

Descontando a Pedalada CEP, temos:

2 — Adiantamentos de CEP e Mufarrej

Para tentarmos entender quando os presidentes CEP e Mufarrej conseguiram gerar de receitas, é importante descontar também as antecipações de receitas. Em 2017, a combinação de adiantamentos e luvas rendeu a Carlos Eduardo Pereira o montante de R$ 56,270 milhões, recursos de gestões posteriores que ele pegou e gastou na sua. Mufarrej pegou R$ 16,270 milhões de luvas e adiantamentos, ou seja, R$ 40 milhões a menos do que CEP.

Descontando luvas e antecipações, sobram:

Note que a simples retirada da Pedalada CEP e dos adiantamentos tirou praticamente R$ 100 milhões dos alardeados R$ 264,302 milhões de receitas de CEP.

3 — Empréstimos de Mufarrej

Você deve estar se perguntando como Mufarrej tem tão pouco em adiantamentos e luvas se no ano passado ele fez sucessivas operações de antecipação de receitas. Chegou ao ponto de haver invasão da torcida em uma reunião do Conselho deliberativo e mais de um aumento de limite autorizado pelo Conselho Fiscal.

Sem a Libertadores, Nelson Mufarrej experimentou uma forte redução de receitas. Suas operações de antecipação de receitas foram registradas como empréstimos (mútuos). Por isso que a rubrica “Dívidas Mútuos” passa de R$ 104,995 milhões em 2017 para R$ 147,302 milhões em 2018. Essa diferença de R$ 42,307 milhões são os empréstimos e antecipações feitos por Mufarrej, usando contratos da Globo como garantia (Estadual e valor mínimo de PPV).

Esta soma já está embutida na receita ajustada de Mufarrej, visto que não foi registrado como adiantamento. Assim, retirando-se esses valores de mútuos, a receita real de Nelson Mufarrej cai para R$ 108,269 milhões.

R$ 150,576 milhões — R$ 42,307 milhões = R$ 108,269 milhões

Vitor Silva/SSPress/Botafogo

4 –Mufarrej: menos gastos de futebol, mais com social e olímpicos

Nelson Mufarrej sabidamente teria menos arrecadação do que CEP, pois o Botafogo não estava mais na Libertadores. Também não tinha mais boladas de antecipação a receber. Algumas receitas orçadas obviamente não iriam se realizar. Por exemplo, só conseguiu um terço dos R$ 12 milhões previstos com o Sou Botafogo.

O esperado, portanto, seria o enxugamento de despesas e priorização total do futebol. Em vez disso, o gasto com futebol caiu enquanto o gasto com esportes olímpicos e clube social subiu:

Desta forma, o resultado de Mufarrej em 2018, contando apenas o que ele arrecadou e gastou no ano, ficou assim:

5 — Sobrevivência em 2018

Como previmos ao analisar o orçamento 2018, Nelson Mufarrej tinha em mãos um legado deixado por CEP que iria inviabilizar suas operações ainda no 1º semestre.

Lembre-se que, além desse buraco de R$ 40 milhões, o Botafogo ainda precisava pagar suas dívidas de sempre, como Ato Trabalhista e Profut.

Para respirar e chegar ao fim do ano, Mufarrej precisou de:

Antecipações e empréstimos em cerca de R$ 60 milhões (arredondando): como contrapartida, forte perda de receitas futuras;

Desbloqueio de R$ 21 milhões da Guaraviton para abater do Profut: assim não precisou pagar as parcelas mensais com recursos próprios;

Vendas de Matheus Fernandes (2018) e Igor Rabello (2019): recebimento parcelado, mas que ajudou a quitar os restos a pagar de 2018, incluindo salários.

6 — Clube Social e Esportes Olímpicos: dinheiro pelo ralo

Já escrevemos aqui que nos quatro anos de Mais Botafogo (2015 a 2018) a projeção de déficit combinado em clube social, remo e esportes gerais chegaria à casa dos R$ 32 milhões de reais.

O Balanço 2018 agrupa remo e esportes gerais sob o nome esportes olímpicos. E combina clube social e esportes olímpicos nas despesas.

Com as receitas e as despesas, podemos ver o resultado dessas áreas em 2017 e 2018:

Combinando os anos de 2017 (sem corrigir valores) e 2018, o Botafogo teve prejuízo de R$ 30,447 milhões.

O déficit total reconhecido do exercício de 2018 foi de R$ 17,394 milhões, sendo que clube social e esportes olímpicos combinam para déficit de R$ 19,411 milhões.

É incompreensível a razão pela qual as gestões de CEP e Mufarrej insistem em aumentar as despesas com clube social e esportes olímpicos mesmo quando sabem que o Botafogo sofrerá forte queda de receita total.

7 — Conclusão

O Botafogo Sem Medo procura abordar os números do Botafogo por meio da história que eles contam. Entender os grandes números nos fazem enxergar que caminho estamos seguindo e o que devemos mudar.

Sendo assim, vamos enumerar os principais pontos da história que os números contam:

  • Arrecadação: é senso comum de que as gestões de CEP e Mufarrej têm sérias dificuldades de gerar receitas. O único grande patrocínio conseguido foi o da Caixa que, como em todo clube, depende de pessoas ilustres com relacionamento político. O secador na camisa talvez seja um constrangedor símbolo desta incompetência. Também é constrangedor o fato de que a atual gestão esteja sendo salva por receitas geradas por… Maurício Assumpção, em valores de quase dez anos atrás que a atual gestão nem sonha em obter.
  • Despesas: as despesas devem ser planejadas de acordo com as receitas obtidas. Entretanto, CEP elevou as despesas acima do patamar das receitas, no que tem sido seguido por Mufarrej, cujo mandato foi comprometido pelo próprio CEP. O Botafogo precisa atacar as despesas, cortar custos e compatibilizá-las com as receitas, evitando déficits;
  • Antecipações: CEP antecipou R$ 100 milhões referentes a contratos da Globo até 2024 (englobando todo o mandato do sucessor de Mufarrej). Trabalhou 3 anos com receita de 4 anos. Por isso, Mufarrej pegou um clube sem capacidade de operar nem por um semestre. Com isso, Mufarrej também recorreu a antecipações, cada vez mais caras, chegando a abrir mão do valor mínimo do PPV;
  • Empréstimos: além das antecipações, o Botafogo também recorre a empréstimos, que na prática têm efeito semelhante ao das antecipações porque comprometem receitas futuras, consumidas pelos juros;
  • Gastos, não investimentos: todo esse comprometimento das receitas futuras não se reverte em investimentos que permitam aumentar as receitas. Por exemplo, o clube teve ao longo dos anos Mais Botafogo um dos mais baixos investimentos em categorias de base, investimento que traz diversos frutos positivos, como melhor qualidade e menor custo para o elenco profissional, além de receitas com vendas e agregação de valor à marca. Em vez disso, CEP e Mufarrej fizeram contratações caras e aleatórias, gastaram R$ 13 milhões na Arena da Ilha (orçada em R$ 5 milhões), dentre outras;
  • Clube social, remo e esportes gerais: é inadmissível e incompreensível que um clube que mal consegue pagar a operação do futebol e suas dívidas negociadas ainda se dê ao luxo de desperdiçar milhões e milhões reais todo ano em clube social, remo e esportes gerais. Tais gastos, quando obrigatórios, devem ser reduzidos ao mínimo. Quando não obrigatórios, devem ser eliminados. Projetos incentivados, em vez de serem usados para esportes olímpicos, deveriam ser utilizados para as categorias de base do futebol;
  • Transparência: o Mais Botafogo caracteriza-se por distorcer e omitir fatos a fim de contar histórias que autopromovam a própria gestão. O Portal da Transparência é bastante opaco, e a cada ano as informações financeiras estão mais enxutas. Cabe aos conselheiros deliberativos cumprirem o mandato concedido pelos sócios e cobrar e fiscalizar o Conselho Diretor.

O Botafogo precisa de uma mudança radical nos seus atos.

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