Representação de conhecimento em bots: novas perspectivas

Interações mais envolventes, profundas e naturais entre humanos e máquinas

Fabiola Aparecida Vizentim
Bots Brasil
5 min readJan 20, 2021

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A imagem apresenta um cérebro no centro com objetos e outras figuras espalhados a sua volta, indicando que cada lado do cérebro processa tipos diferentes de informação. Fonte: https://dialogopsi.com.br/blog/o-que-sao-neurociencias-e-neuropsicologia/

Os primeiros sistemas de inteligência artificial (década de 50) foram os sistemas resolvedores de problemas. Eles utilizavam métodos simbólicos baseados em técnicas de representação de conhecimento associadas a mecanismos com capacidade de inferir, como a lógica, e assim obtinham soluções a partir do conhecimento representado.

Segundo o tutorial Sistemas Híbridos Inteligentes dos professores Fernando Santos Osório e Renata Vieira, “os métodos simbólicos em inteligência artificial são baseados na ideia de que a inteligência (ou parte dela) constitui-se de operações sobre um conjunto de símbolos. A linguagem, exemplo de sistema simbólico, é uma faculdade humana associada à inteligência. As palavras representam objetos, relações e eventos no mundo (são símbolos). Quando combinadas umas com as outras podem descrever, explicar (ou influenciar) diversas situações. Podemos entender uma situação através de sua representação simbólica, sem necessariamente vivenciá-la e utilizar este conhecimento posteriormente em situações reais”.

Entretanto, identificou-se um ponto fraco nesses métodos alimentados com representações de fatos e regras. Como é muito difícil estabelecer regras de senso comum, o aprendizado era relativamente limitado a sistemas especialistas.

Outras abordagens em relação à inteligência artificial surgiram, buscando explorar alternativas tanto em relação aos problemas a serem resolvidos, como em relação à introdução de técnicas diferentes. Uma dessas abordagens são os métodos conexionistas, que ganharam destaque na década de 80.

Os métodos conexionistas foram inspirados nos estudos da maneira como se organiza e funciona o cérebro humano, o principal exemplo são as redes neurais artificiais. O aprendizado de máquina (machine learning) conexionista em geral precisa de uma grande quantidade de dados que serão utilizados para alimentar e/ou treinar a inteligência artificial por meio de padrões e cálculos estatísticos, além de poder computacional para processá-los. Segundo o mesmo tutorial, um dos principais problemas desse método é que ele muitas vezes carece de explicabilidade. Nem sempre é possível entender porque as decisões foram tomadas, o que dificulta possíveis correções e a confiabilidade do resultado.

Segundo os autores, “devemos buscar uma solução para o problema da falta de mecanismos para analisar os conhecimentos adquiridos pela rede. Devemos ser capazes de representar os conhecimentos adquiridos pela rede em um formato mais compreensível para os seres humanos”.

Fábio Caversan no artigo “Symbolism Versus Connectionism In AI: Is There A Third Way?” publicado na Forbes em setembro de 2020, nos questiona porque não utilizar os dois métodos e assim otimizar os resultados da inteligência artificial. Segundo o autor, a comunidade científica está cada vez mais procurando maneiras de obter o melhor dos dois mundos: combinar o poder do conexionismo com a explicabilidade do simbolismo.

Além disso, ele afirma que o conexionismo levou a avanços notáveis, mas que os especialistas em inteligência artificial estão aceitando o fato de que o conexionismo tem suas próprias limitações e que mesmo com aumentos exponenciais no poder de computação e quantidades cada vez maiores de dados, a curva de melhoria do poder preditivo está se estabilizando, sugerindo que há um limite para o quão longe o conexionismo pode nos levar.

É possível verificar essa tendência de incorporar essas duas abordagens (sistema híbrido) nas pesquisas relacionadas aos bots também.

Em outubro de 2020, a USP (Universidade de São Paulo) em parceria com a IBM e a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) iniciaram as atividades do C4AI — Centro de Inteligência Artificial do Brasil.

O Centro possui como missão produzir pesquisa avançada em inteligência artificial no Brasil, disseminando e debatendo os principais resultados, treinando estudantes e profissionais, e transferindo a tecnologia para a sociedade.

As atividades de pesquisa no C4AI estão organizadas em torno de cinco grandes desafios, um deles é o KELM — Knowledge-Enhanced Machine Learning (tradução para Aprendizado de Máquina Enriquecido por Conhecimento).

Segundo o site do projeto, o objetivo é desenvolver uma estrutura para agentes conversacionais que possa responder a consultas de alto nível ao longo do tempo em um domínio particular, incluindo questões, argumentos, causas, explicações, inferências e planos sobre tarefas específicas. Um objetivo mais amplo é investigar como esses agentes conversacionais podem se beneficiar simultaneamente de técnicas baseadas em dados e em conhecimento.

Agentes conversacionais são sistemas que simulam uma conversa humana. Eles são projetados para receber uma interação do usuário como uma pergunta, interpretá-la e respondê-la de maneira apropriada (diálogo coerente). A interação pode ser por voz (voicebot) ou por escrita (chatbot).

Para testar a ideia, pretende-se construir um sistema especialista em conversação sobre a Amazônia Azul (BLAB — Blue Amazônia Brain) que consiga responder perguntas complexas e diversas sobre o ecossistema marinho, por exemplo: O que causou o aparecimento de manchas de óleo na costa nordeste do Brasil?

Para isso, será utilizado todo tipo de informação sobre a Amazônia Azul, tanto conhecimento técnico na forma de regras e fatos quanto fontes de dados disponíveis a partir de sensores e textos, incluindo artigos científicos e de jornais.

Nessa imagem, também disponível no site, podemos perceber que para representar o conhecimento será utilizado técnicas da Ciência da Informação/Biblioteconomia como ontologias e grafos de conhecimento.

Diagrama que apresenta uma interseção de dois círculos com o termo KEML no centro. Do lado esquerdo está a frase em português “a combinação de grafos de conhecimento, ontologias, regras, fatos, modelos, …” e do lado direito “multimodal, dados, classificadores, redes neurais, representação de aprendizagem, …”. Fonte: http://c4ai.inova.usp.br/pt/keml-pt/

A pesquisadora e professora Emilia Currás, no seu livro “Ontologias, Taxonomia e Tesauros em Teoria de Sistemas e Sistemática”, afirma que em alguns tratados de filosofia, se lê que a Ontologia é o estudo do que existe e do que admitimos que existe, para conseguir uma descrição coerente da realidade.

O uso de ontologias em projetos de inteligência artificial, possui a capacidade de transmitir para o sistema, as diferentes maneiras de como o ser humano enxerga a sua realidade circundante, e assim representar o nosso complexo universo humano em campos específicos de conhecimento.

Um exemplo hipotético de como poderia ser um “recorte” de uma ontologia sobre a Amazônia Azul (região do Oceano Atlântico, rica em biodiversidade e recursos, tão grande quanto a Floresta Amazônica).

Fonte: Da autora

Deste modo, utilizar todas essas técnicas em um bot, além de combinar o poder do conexionismo com a explicabilidade do simbolismo, também permitirá que o usuário recupere a informação que ele realmente necessita, mesmo que complexa, em sua própria linguagem e consequentemente criar interações mais envolventes, profundas e naturais entre humanos e máquinas.

Imagem com uma foto de uma “água viva imersa no fundo mar” em menor escala e o título deste artigo em destaque: “Representação de conhecimento em bots: novas perspectivas”.

Este artigo faz parte da série 21 em 2021 do Bots Brasil ✨

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Fabiola Aparecida Vizentim
Bots Brasil

Bibliotecária / Profissional de Informação Especialista em Dados, Informação, Conteúdo e Gestão do Conhecimento para Negócios e Tecnologia.